São Paulo, sábado, 29 de junho de 2002

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LUÍS NASSIF

A era das trevas

O que está ocorrendo nos EUA na era George W. Bush, e pós-atentados de 11 de setembro, é mais que uma excentricidade texana e despreparo da equipe que o assessora. Despreparo se corrige; fanatismo, não. As manifestações rotineiramente obtusas da equipe Bush não podem mais ser debitadas só ao amadorismo. Há um fundo doutrinário nelas, ameaçador por partir da equipe que dirige a maior potência da história.
Seria elucidativo garimpar em publicações internacionais ou por meio dos correspondentes brasileiros o componente religioso por trás da doutrina Bush, quem é a igreja que o influencia, quais seus princípios e interesses financeiros.
Recentemente a "Business Week" avançou algumas análises nessa direção, traçando um perfil de Bush, como um personagem basicamente moralista, um despreparado com aspiração a ser o profeta moral da nova era. Talvez seja mais que isso. Levantar as características de sua igreja poderá ajudar a decifrar o enigma.
Não se pode ainda afirmar que o país esteja ingressando em um novo macartismo. O rabo, a orelha e o latido são de macartismo. Só a intensidade não é, mas se pode estar em início de processo. A única esperança é que, nestes 50 anos, as instituições e os direitos individuais norte-americanos tenham se consolidado a ponto de impedir o avanço da ultradireita, embalada pelos atentados terroristas.
Na coluna de ontem divulguei as análises de um tal Constantin Menges, que, em "conference call" patrocinado pela Prudential Securities, afirmava ter informações de fontes fidedignas de que Lula estaria preparando um exército de guerrilheiros, somando MST à Farc da Colômbia, de 80 mil a 100 mil homens para invadir o Brasil assim que tomasse posse.
Que existam malucos em toda parte admite-se. Que um maluco desse naipe seja convidado para uma "conference call" da maior seguradora do mundo e que ninguém ouse aparteá-lo são outros quinhentos. A versão do "eixo do mal" começa a ser repetida, e a ultradireita norte-americana, a ganhar um espaço inédito nos centros de decisão nacionais.
Não apenas isso. Desde os atentados de 11 de setembro foram suprimidos, e ainda não restabelecidos, diversos direitos individuais. No meio acadêmico, a doutrina Bush está tentando impor proibição à divulgação de pesquisas científicas. Recentemente houve manifestações de cientistas contrários à censura. No plano internacional, as manifestações belicosas de Bush, a falta de limites de Paul O'Neill, o neoprotecionismo norte-americano demonstram uma lógica férrea. A área mais moderna e racional de sua administração não parece ter força para se contrapor fundamentalmente aos radicais.
A "nova renascença", prevista anos atrás, em breve poderá ceder lugar a uma nova era das trevas.

Superávit fiscal
Em recente coluna sobre a estratégia para a dívida pública, a ser adotada pelo novo governo, mencionei propostas de banqueiros, de o país acenar com um superávit primário de 7% para começar a discutir a redução de juros.
Julguei que tinha ficado claro que considerava a proposta inexequível, mas não ficou. Fica o esclarecimento, então, de que minha posição -manifestada, aliás, na mesa de debates da qual participei com o autor da sugestão, o presidente do BankBoston, Henrique Meirelles- é que essa sugestão não tem a menor viabilidade.

Lei do Futebol
A aprovação da Lei do Futebol, semanas atrás, além de significar o maior passo em direção à profissionalização do esporte, significa um dos grandes feitos jornalísticos dos últimos anos. Demonstra que, quando a mídia se debruça sobre temas relevantes, tem a condição de transformar a realidade.
O merecimento total é do jornalista Juca Kfouri.
E-mail - lnassif@uol.com.br



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