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LUÍS NASSIF
A vez de Roberto Simonsen
Um dos grandes problemas do
subdesenvolvimento brasileiro é o
padrão mental das nossas elites.
Em geral, senta-se em cima dos
problemas até que explode uma
crise. A inércia do sistema político
impede soluções rápidas, e os conceitos vão envelhecendo e mantidos à custa de fé cega e interesses
afiados. Há, então, um lento e penoso processo de revisão de conceitos, que acaba, por fim, impondo-se sobre os conceitos anteriores. A revisão, em geral, dá-se
anos depois que os demais países
adotaram novos paradigmas,
mantendo o atraso nacional em
relação à média.
Só que a irracionalidade permanece a mesma. Substitui-se
uma matéria de fé por outra. Enquanto os novos conceitos produzem resultados, ótimo. Depois, esgotam-se, obrigando a uma nova
revisão, mas permanecem estratificados. O reformista de ontem vira o xiita de hoje.
É o que ocorre com essa luta histórica -posto que pelo menos
desde a polêmica Roberto Simonsen x Eugênio Gudin no pós-guerra- entre modelo de economia
fechado e aberto. Nas mãos de
economistas ou jornalistas ideológicos, a discussão vira matéria
de fé. Não se define visão de futuro, objetivo a ser alcançado nem
nada. O que vale é o conceito em
si, não os resultados. Para os burocratas, os processos são mais
importantes que as metas. Para
esses arautos modernosos das verdades fluidas, os conceitos são
mais importantes que os objetivos. A questão não é abertura x
fechamento da economia, mas o
objetivo a que se propõe: como ter
uma economia mais competitiva,
empregos e empresas nacionais
mais eficientes e globalizadas.
Pêndulos
Em um certo momento, dos
anos 50 em diante, havia a necessidade de criar um parque industrial no país e uma burguesia industrial nacional. Naquele momento, era relevante uma política industrial que definisse espaços para o capital multinacional
e para o capital brasileiro -o
que foi feito com as câmaras criadas pelo governo JK. Se Gudin tivesse prevalecido, o país jamais
teria se industrializado.
Esse movimento se desvirtua
com o jogo político e é retomado,
em bases mais racionais, no período militar. Nos anos 70 há um
amplo processo de incentivos a
grupos nacionais, por meio de alguns expedientes válidos, mas
também de uma parafernália de
incentivos fiscais, da forma mais
descontrolada possível.
No governo Geisel, definiu-se
um modelo protecionista mais
amplo ainda, em que o Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) entrava pesadamente financiando
empresários -sem aquela orgia
de subsídios dos antigos fundos
fiscais, mas também sem nenhuma preocupação em dimensionar os mercados.
O modelo esgotou-se em meados dos anos 80, deixando uma
base instalada superdimensionada e pouco competitiva. Se Gudin
tivesse entrado antes na parada,
a economia dos anos 80 não teria
sido aquela lama que foi.
Nos anos 90, imperou Gudin.
Havia a necessidade de abrir a
economia, não por abrir nem por
desnacionalizar, mas para aumentar a competitividade sistêmica do país e das empresas nacionais.
E não se pense em fortalecimento de empresa nacional como
um conceito jacobino. Empresas
nacionais eficientes são elementos fundamentais de desenvolvimento auto-sustentado e de qualidade em um país. Em vez de se
fiar em generalistas monetaristas, faria bem FHC em levar em
um fim-de-semana livros de Michael Porter na mala, para se colocar em linha com o pensamento
desenvolvimentista mais refinado e contemporâneo.
Vai perceber que o ciclo Gudin
cumpriu seu papel. Mudou a cabeça dos grandes grupos nacionais e arrebentou com pequenas
e médias empresas. Hoje em dia,
tem-se o caso Brahma-Antarctica, abrindo perspectivas enormes
para a redefinição do papel da
grande empresa nacional.
Tem-se aí a aviação comercial
a exigir políticas de fusão, assim
como setores-chave, como os de
papel e celulose, siderúrgico e petroquímico. A venda da CSN poderá se constituir em um marco
da inversão desse processo violento de desnacionalização, assim como a reorganização das
pequenas e médias empresas em
consórcios de produção. Mas desde que o governo comprove dispor, finalmente, de um projeto
nacional.
Se a abertura do mercado funcionou para conferir competitividade à economia nacional, chegou a hora de inverter o pêndulo
e utilizar políticas comerciais
dentro de uma visão estratégica e
de resultados. Isso antes que o
exemplo venezuelano venha se
impor no país.
As reações contra o protecionismo argentino mostram uma mudança de rota, ainda que incipiente. A próxima rodada é de
Roberto Simonsen.
Paulo Guedes
Uma leitura rápida e superficial do artigo de Paulo Guedes na
revista "Exame" fez-me considerar como posição do economista
a defesa dos incentivos da Ford
na Bahia. Na verdade, tratava-se
apenas de uma ironia do economista, que mantém a coerência.
E-mail: nassif@uol.com.br
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