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Orçamento social passa a ser deficitário
Pela 1ª vez na década, despesas em áreas como previdência e saúde superaram receitas das contribuições criadas para financiá-las
Entre janeiro e julho, deficit chegou a R$ 19 bilhões, o equivalente ao desembolso de um ano e meio do programa Bolsa Família
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Deixados para trás os recordes de arrecadação do ano passado, os resultados do Tesouro
Nacional explicitam que o orçamento social do governo passou a ser deficitário pela primeira vez desde a década de 90.
Levantamento feito pela Folha aponta que, de janeiro a julho, as despesas com previdência, saúde, assistência e seguro-desemprego superaram em R$
19 bilhões -o equivalente a um
ano e meio de Bolsa Família-
as receitas das contribuições
criadas para financiar esses
programas.
Definido pela Constituição
de 1988, o orçamento da seguridade social reúne as políticas
públicas mais diretamente ligadas à subsistência das famílias,
além dos tributos cuja arrecadação não poderia ser dirigida a
outras áreas, caso das contribuições cobradas sobre a folha
de salários, o lucro e o faturamento das empresas.
Graças a uma brecha constitucional de caráter provisório
criada em 1994, chamada DRU
(Desvinculação de Receitas da
União), o governo foi autorizado a utilizar livremente 20%
desses recursos. Na apuração
do resultado anual da seguridade, porém, o Tribunal de Contas da União considera as receitas integrais, critério seguido
pela reportagem.
A seguridade mantinha saldo
positivo até o ano passado,
mesmo com a inclusão, entre
suas despesas, das aposentadorias do funcionalismo federal,
questionada por parte dos analistas do setor (leia texto na pág.
B3).
Esse superavit se tornou um
dos principais argumentos dos
opositores das propostas de reforma da Previdência Social
destinadas a reduzir os direitos
dos beneficiários.
Partidos autodeclarados de
esquerda, setores do governo
Luiz Inácio Lula da Silva, sindicatos e economistas de linha
heterodoxa argumentam que
não faz sentido calcular separadamente o saldo previdenciário
negativo. É preciso, afirmam,
levar em conta todas as despesas e receitas listadas pela
Constituição.
A tese foi apresentada em um
fórum oficial promovido em
2007 para debater a reforma.
"O desequilíbrio orçamentário
está no orçamento fiscal, e não
no orçamento da seguridade
social ou no orçamento da Previdência Social. A seguridade
não recebe recursos do orçamento fiscal, ao contrário, parte substancialmente elevada de
seus recursos financia o orçamento fiscal", afirmou, na ocasião, a pesquisadora Denise
Gentil, hoje diretora-adjunta
do Ipea (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada). Procurada pela Folha, a economista
preferiu não comentar os novos números.
Mas o recém-surgido deficit
do orçamento social não serve
de argumento apenas para os
reformistas de pensamento liberal que pedem redução de
gastos; os números podem ser
usados também pelos que defendem o ajuste pelo lado da
arrecadação, caso dos governistas em campanha pela ressurreição da CPMF.
Os dados apontam que o fim
da cobrança da contribuição
sobre movimentação financeira ajudou, embora não de imediato, na reversão do saldo positivo da seguridade. Em 2008,
primeiro ano sem o tributo, o
superavit foi preservado graças
aos surpreendentes resultados
dos demais tributos, que superaram as estimativas mais otimistas do governo e dos analistas. Nos anos anteriores, teria
havido deficit se excluída a
CPMF.
Despesas
Neste ano, porém, não só a
crise econômica derrubou as
receitas, como as despesas sociais cresceram a taxas dignas
de vésperas de eleição.
O reajuste de quase 6% acima
da inflação para o salário mínimo elevou aposentadorias,
pensões, seguro-desemprego e
benefícios assistenciais a idosos e deficientes; o Bolsa Família teve um aumento médio real
de 4%; os servidores da área social, a exemplo dos demais funcionários do Executivo, ganharam novos planos de carreira.
Os gastos sociais, equivalentes a 12,16% do Produto Interno Bruto no ano passado, subiram para 13,49% do PIB estimado para os primeiros sete
meses do ano. Os R$ 230,8 bilhões destinados à área social
representaram praticamente
três quartos de todas as despesas do governo no período, excluídos os encargos da dívida
pública.
A maior fatia do gasto social,
de longe, é a das aposentadorias. As pagas pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social)
somaram, de janeiro a julho, R$
120,6 bilhões, e as do funcionalismo federal, R$ 35,1 bilhões. A
área que mais cresce nos últimos anos, porém, é a da assistência social, devido a benefícios instituídos pelo Estatuto
do Idoso e à criação do Bolsa
Família, ambos em 2003.
No cenário atual, a eventual
criação da CSS (Contribuição
Social para a Saúde), nova versão da CPMF com alíquota reduzida e receita prevista de R$
10 bilhões anuais, seria insuficiente para restabelecer o superavit da seguridade.
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