São Paulo, domingo, 29 de novembro de 2009

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YOSHIAKI NAKANO

Regressão industrial e câmbio


Setores de baixa intensidade tecnológica têm participação exportadora maior, mas os de alta perdem terreno


ESTUDOS empíricos têm caracterizado a evolução estrutural da indústria de transformação brasileira como um processo de reespecialização regressiva ou desindustrialização precoce. Essa evolução não segue o padrão típico de transformação estrutural pelo qual passaram os países desenvolvidos ou os novos industrializados, como a Coreia, de progressiva diversificação e desenvolvimento da capacidade de inovações tecnológicas.
De fato, nesses países a indústria de transformação comandou o processo de desenvolvimento, que sempre é um processo de alcançar os mais avançados, aproximando-se da fronteira tecnológica, definida pelo estado científico-global das artes.
Esse processo é de aprendizagem prática e de absorção de conhecimento, iniciando-se com a construção de setores mais simples tecnologicamente, com demanda local e consistente. Em regra, são setores que ocupam muita mão de obra ou outros recursos naturais abundantes e mais baratos.
A industrialização avança progressivamente dessa especialização para setores tecnologicamente mais complexos e de maior valor agregado, contribuindo para a formação do PIB, em geral respondendo por um terço ou mais do seu montante.
Quando o país alcança uma renda per capita em torno de US$ 15 mil, os setores de serviços sofisticados começam a avançar mais rapidamente, iniciando o fenômeno da desindustrialização. O Brasil foge a esse padrão típico.
A partir de meados da década de 80, a indústria de transformação, que chegou a representar mais de 35% do PIB, perde força e declina, mais dramaticamente, a partir de 1994, com a apreciação cambial.
Apresenta ligeira recuperação a partir de 1998 com a depreciação cambial para, novamente, a partir de 2004, perder participação, então com a apreciação cambial. Em 2008, sua participação havia caído pela metade em relação ao início da década de 80.
Internamente à indústria de transformação, as mudanças estruturais também caminham em direção oposta à diversificação e à fronteira tecnológica. Setores que utilizam intensivamente recursos naturais ampliaram em torno de dez pontos percentuais sua participação no início da década de 90, chegando hoje a representar cerca de 40% da indústria.
Enquanto isso, setores mais complexos, diversificados e intensivos em tecnologia perdem participação de cerca de seis pontos percentuais no mesmo período. Quando se analisam os dados da balança comercial da indústria de transformação, a regressão e a especialização são dramáticas.
Setores de baixa intensidade tecnológica, como os de alimentos, bebidas e tabaco, vêm ampliando sua participação nas exportações totais da indústria, respondendo hoje por quase 80% do saldo comercial de quase US$ 40 bilhões em 2008.
Enquanto isso, os setores de médio-alta e alta intensidade tecnológicas perdem terreno na competição externa, passando de relativo equilíbrio quando o câmbio era competitivo em 2005 para deficit comercial assustador de mais de US$ 51 bilhões em 2008.
Esses dados merecem reflexão e revelam uma especialização regressiva da indústria nacional que tem nome: taxa cambial real apreciada.

YOSHIAKI NAKANO, 65, diretor da Escola de Economia de São Paulo, da FGV (Fundação Getulio Vargas), foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).



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