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LUÍS NASSIF
J'Accuse
O capitão do Exército Alfred
Dreyfus foi acusado de ter
acobertado ações de inimigos do
Estado em 13 de outubro de 1894.
O juiz Ali Mazloum foi acusado
de integrar uma quadrilha de
manipulação de inquéritos policiais em 13 de outubro de 2004. A
primeira defesa do capitão foi o
artigo "J'Accuse", de Émile Zola,
publicado no jornal "L'Aurore".
A primeira defesa do juiz foi do
desembargador aposentado
Américo Lacombe, em 13 de abril,
na Folha. Zola tinha 57 anos na
época; Lacombe, 67 anos, mas a
idade saiu, por engano, como 57.
A principal testemunha de defesa
de Dreyfus foi o grande rabino da
França Zadoc Kahn. A principal
testemunha de Mazloum é a procuradora federal Karen Kahn. E
há enorme possibilidade de que,
assim como Dreyfus, Mazloum
seja inocente.
O juiz foi apanhado pelo vendaval da Operação Anaconda, um
marco na história das investigações do país, devido a um grampo, no qual teria feito ameaças a
três policiais rodoviários para que
lhe entregassem a íntegra de uma
escuta telefônica, realizada em
Brasília, sobre o empresário Ari
Natalino, um dos mentores da
chamada "máfia dos combustíveis". O caso estava sob sua jurisdição. Mazloum havia solicitado
escutas telefônicas em cinco Estados, decretou a prisão de Natalino em fevereiro de 2003 e, em
agosto do mesmo ano, condenou-o a quatro anos de prisão.
Pressões vieram de todos os lados, inclusive do deputado federal
Luiz Antônio Medeiros (PL-SP),
que foi ao STJ pedir o afastamento de Mazloum. Depois, descobriu-se que uma das empresas de
Natalino figurara como financiadora da campanha de Medeiros.
No dia 4 de setembro, o Ministério Público enviou uma fita sobre
Natalino, fruto de grampo autorizado por um juiz de Brasília. A
interceptação dos telefones incriminava o delegado Alexandre
Creniti, cuja prisão temporária
havia sido determinada por Mazloum. Só que a escuta tinha durado dez meses, e Mazloum só recebeu trechos selecionados de
uma semana. Solicitou todo o
material para análise, assim como a procuradora Kahn, que oficiou ao procurador federal Guilherme Schelb e ao juiz de Brasília. Nada conseguiram.
Como os policiais rodoviários
insistissem em não enviar a íntegra da escuta, Mazloum telefonou a um deles exigindo o material. Essa ligação, interceptada,
foi tratada como abuso de autoridade pelo inquérito da Operação
Anaconda e tentativa de acobertamento de suspeitos.
Depois que Mazloum foi afastado, o juiz que lhe sucedeu constatou a existência dos grampos ilegais e oficiou ao juiz de Brasília. O
procurador Cristiano Valois de
Souza, que sucedeu a Kahn, conseguiu mais elementos. Quando
as investigações caminhavam, o
inquérito foi trancado no Tribunal Regional Federal de São Paulo por uma liminar impetrada
por dois procuradores federais regionais, Mário Luiz Bonsaglia e
Marcelo Moscogliato.
Está na hora de abrir as cortinas e mostrar o que está acontecendo. Pode ser apenas excesso de
zelo, desejo de não macular a
Operação Anaconda com um erro clamoroso. Pode ser algo mais
grave. E, provavelmente, existe
um inocente sendo massacrado,
sem direito a defesa.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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