São Paulo, quinta-feira, 29 de dezembro de 2005

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RECEITA ORTODOXA

Banco reduz para 2,6% projeção de crescimento para este ano, que em dezembro de 2004 também era de 4%

BC projeta aumento do PIB de 4% em 2006

SHEILA D"AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em um ano marcado por muita polêmica dentro do governo sobre a melhor forma de manter os índices de preço sob controle, o Brasil terá mais inflação e menos crescimento do que previsto pela própria equipe econômica.
As projeções do Banco Central, divulgadas ontem no relatório trimestral de inflação, mostram que, em 2005, o IPCA, índice referência para o sistema de metas do governo, ficará em 5,7%, acima dos 5,3% projetados pelo BC em dezembro do ano passado.
Enquanto isso, o crescimento da economia previsto pelo Banco Central para este ano é de apenas 2,6%, bem abaixo dos 4% estimados no relatório divulgado pela instituição no final do ano passado, quando o PIB brasileiro cresceu 4,9%.
Para 2006, ano da eleição presidencial, o cenário traçado pelos diretores do Banco Central para a inflação é mais otimista do que o elaborado pelos analistas do mercado financeiro. O mercado projeta um IPCA de 4,9%, acima do centro da meta fixada em 4,5%. Já o BC prevê uma taxa abaixo disso, de 3,8% no ano.

Crescimento
No caso do crescimento econômico, o BC prevê um crescimento em 2006 de 4%, um número mais otimista do que os 3,5% esperados pelos analistas do mercado. Mas abaixo da expectativa lançada nesta semana pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda), de que o país terá no próximo ano crescimento perto de 4,9%.
Os dados do relatório, apresentados pelo diretor de Política Econômica do BC, Afonso Bevilaqua, ajudam ainda a reforçar as críticas feitas por integrantes do próprio governo à política econômica. Isso porque os resultados mostram que a política de juros altos praticada ao longo deste ano serviu muito mais para frear o crescimento econômico do que para reduzir a inflação.
No final do ano passado, os modelos técnicos do BC apontavam que seria possível, com juros menores e taxa de câmbio bem mais elevada do que agora, chegar a um IPCA de 5,3% no final de 2005, com a economia crescendo 4%.
O que aconteceu na prática, no entanto, foi bem diferente. Ao longo de 2005, os juros que estavam em 17,75% em dezembro de 2004 foram elevados sob o argumento de que era preciso conter as pressões inflacionárias. A taxa de juros começou 2005 em 18,25% ao ano e chegou a 19,75% em setembro, caindo depois gradualmente até os atuais 18%.
A taxa de câmbio, que puxa a inflação para cima quando o dólar se valoriza e encarece os importados, manteve-se bem abaixo dos R$ 2,75 usados como parâmetro na projeção feita no final de 2004. Com isso, ao longo de 2005, ela contribuiu para segurar o IPCA.
Mesmo assim, a inflação ficou acima do previsto, e o impacto maior dos juros foi no setor produtivo, com uma forte desaceleração da atividade. No terceiro trimestre houve retração de 1,2% da economia, segundo dados preliminares do IBGE. O saldo final em 2005 será um crescimento de apenas 2,6%, nas projeções do BC.
"Isso mostra o erro da política monetária. O que distorceu a inflação em relação à meta não foram fatores afetados pela taxa de juros. O BC não soube avaliar isso e só ficou preocupado com o valor nominal da inflação", critica o economista-chefe da corretora Liquidez, Marcelo Voss. "Com isso, ele sacrificou 1,4 ponto percentual de crescimento da economia e não teve nenhum ganho de inflação em relação às estimativas do final de 2004", critica.
Bevilaqua defende a política implementada pelo BC argumentando que o resultado do PIB neste ano foi muito afetado pela retração verificada no terceiro trimestre. O recuo, segundo ele, se deu porque a indústria estava com excesso de estoques e reduziu o ritmo de produção nesse período. Além disso, houve também uma quebra de safra no setor agrícola, e a crise política refletiu negativamente nas expectativas dos empresários.
"Isso interrompeu a série de oito trimestres consecutivos de crescimento que começou em 2003", reconheceu o diretor do BC. "Mas vemos para a frente aumento do emprego, da massa salarial, dos indicadores de confiança e os efeitos da flexibilização da política monetária. Tudo isso deve fazer com que a retomada do quarto trimestre deste ano continue em 2006."
Com relação à inflação, ele diz que o valor final foi maior do que o esperado devido aos índices recentes dos meses de outubro e novembro, que foram pressionados, entre outras coisas, pelo reajuste dos combustíveis.
Para o ano que vem, Beviláqua diz que, a exemplo do que aconteceu em 2004, quando a taxa de expansão do PIB foi maior do que a projetada, o crescimento estimado em 4% pode ser maior, mas sugeriu que o próprio ministro Palocci explicasse porque falou de uma taxa mais elevada. "Nada impede que isso aconteça [um crescimento maior]. O BC quer que o crescimento se aproxime das estimativas do Palocci. Agora, tem que perguntar ao ministro Palocci porque ele está com projeção maior", afirmou.


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