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São Paulo, domingo, 30 de março de 2003

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FÁBRICA DE LUCROS

Despesas financeiras subiram de 3,5% para 35% do faturamento das companhias durante o governo FHC

Bancos engolem a receita de empresas do setor produtivo

GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

Se o governo Lula pretende mudar os rumos da economia e dar prioridade à produção, não poderá demorar para mudar o modelo. Nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a política econômica só aumentou a transferência de recursos das empresas não-financeiras para os bancos.
A conclusão consta de estudo realizado pela empresa de consultoria Austin Asis, com base nos balanços de 300 empresas não-financeiras e 100 bancos, em 1994, 1998 e 2002. Em 1994, as despesas financeiras das empresas do setor produtivo representavam 3,5% das receitas; em 1998, o número subiu para 14,2%; e, em 2002, atingiu 35,1%.
Para dar uma idéia dos valores envolvidos, no ano passado, as não-financeiras transferiram para os bancos R$ 68,4 bilhões de uma receita total de R$ 194,9 bilhões.
A empresa que mais transferiu recursos para os bancos foi a Vale do Rio Doce. A mineradora gastou, em 2002, R$ 5,8 bilhões com juros e amortização de dívidas, um montante que corresponde a 61,2% dos R$ 8,2 bilhões de seu faturamento.
Logo depois vêm Light (R$ 5,2 bilhões), Eletropaulo (R$ 2,7 bilhões), Telesp (R$ 2,7 bilhões), Embraer (R$ 2,6 bilhões) e Sabesp (R$ 2,4 bilhões).

Farra da rentabilidade
Esses valores explicam também o crescimento expressivo da rentabilidade e do lucro dos bancos durante os últimos oito anos. Em 1994, a rentabilidade (lucro líquido sobre o patrimônio) das empresas não-financeiras foi de 5%, caiu para 3% em 1998, e, em 2002, foi de apenas 1%.
Já a rentabilidade dos bancos foi de 10,6% em 1994, subiu para 15,7% em 1998 e, em 2002, atingiu o recorde de 24,5%.
Segundo Erivelto Rodrigues, presidente da Austin Asis, o grande motivo para esse descompasso entre os ganhos dos bancos e os das empresas não-financeiras é o custo dos empréstimos. Em outras palavras, os juros cobrados pelos bancos.
"O crédito no Brasil é caro, escasso e de curtíssimo prazo. É isso que inviabiliza o crescimento do país", diz Rodrigues.
Em 1994, os bancos obtiveram um lucro de R$ 2,5 bilhões. No ano passado, esse resultado pulou para R$ 22,8 bilhões, um salto de 812% em relação a 1994. Nesse período, a inflação foi de 101%.
Já as empresas não-financeiras saíram de um lucro de R$ 8,5 bilhões em 1994 para um prejuízo de R$ 39,7 bilhões em 2002. "O modelo econômico adotado pelo governo passado foi equivocado para conseguir o desenvolvimento econômico sustentável", diz Rodrigues.
De acordo com Rodrigues, não há motivos para o país manter os juros no patamar atual de 26,5% ao ano. A inflação está dando sinais de queda, o dólar parece ter se estabilizado em torno de R$ 3,40 e R$ 3,45 e os efeitos da guerra parecem que não serão tão prejudiciais ao país.


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