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OPINIÃO ECONÔMICA
A hora da verdade
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
A hora da verdade chegou
para o governo Lula. A turbulência financeira que estamos
vivendo acabou com o céu de brigadeiro dos últimos meses. Chegamos ao momento em que entender a dinâmica política e econômica nesse novo cenário é condição necessária para uma análise correta sobre o que nos aguarda no futuro. A fase mais fácil me
parece ter passado, e as dificuldades à frente são enormes.
As melhoras na taxa de câmbio,
no risco Brasil, nos índices de inflação e nos juros internos que
ocorreram nos últimos 12 meses
foram motivadas por três fatores
principais. O primeiro, e o mais
importante, resultou da inversão
de expectativas que ocorreu entre
o período eleitoral e o primeiro
ano do governo Lula. A conversão
do PT à ortodoxia macroeconômica, comandada pelo ministro
Palocci, devolveu a confiança aos
mercados financeiros. Como estes
terminaram 2002 esperando um
governo Lula de acordo com sua
história, essa guinada de 180
graus provocou uma melhora significativa nas variáveis macroeconômicas, ao longo de 2003.
A estabilização da taxa de câmbio e a política monetária do
Banco Central fizeram com que
os explosivos índices de inflação,
verificados no início do mandato
de Lula, se acomodassem em níveis aceitáveis, já ao final de 2003.
Por outro lado, a confiança na
gestão da política econômica normalizou nosso risco de crédito nos
mercados financeiros, e o fluxo de
recursos externos voltou a seu leito normal.
O segundo fator que contribuiu
para essa sensação de sucesso do
governo foi a situação de extrema
liquidez que prevalecia nos mercados internacionais em 2003 e
no início de 2004. Por essa razão,
o processo de correção dos preços
dos ativos brasileiros, iniciado
com o aumento de confiança no
governo, ganhou uma intensidade ainda maior. Quando comparado com o que ocorreu com outros países emergentes, a redução
do risco Brasil, a valorização das
cotações das ações brasileiras e a
valorização de nossa moeda chamaram a atenção de todos por
sua intensidade.
Finalmente, o crescimento extraordinário de nossas exportações, em razão do chamado efeito
China e da volta do crescimento
econômico nos Estados Unidos,
deu uma consistência ainda
maior ao processo de ajuste. O
saldo comercial de mais de US$
25 bilhões fez com que nossa deficitária conta corrente externa ficasse positiva, depois de quase
uma década apresentando déficits expressivos.
O resultado final da conjugação
dessas três forças foi a sensação de
que tínhamos um governo com
controle total da política econômica -o que, associado a uma
taxa extraordinária de apoio popular, garantia finalmente um
período de estabilidade e crescimento para o Brasil. Nesse cenário de céu de brigadeiro, poucas
vozes ousavam apontar algumas
nuvens negras que poderiam mudar o ambiente do otimismo.
A contradição básica que alguns levantavam era o conflito
entre as promessas eleitorais de
Lula e as possibilidades de crescimento associadas à manutenção
da política econômica de seu antecessor. Afinal, o chamado malanismo tinha mostrado, nos seis
anos anteriores, ter dificuldade
para gerar taxas de crescimento
econômico suficientes para reduzir o desemprego e inverter o processo de queda na renda do trabalho de milhões de brasileiros.
No período Lula, aos juros reais
elevados e a uma carga tributária
excessiva, em crescimento contínuo para tentar estabilizar a dívida pública, foi adicionado um
ambiente regulatório confuso e
instável. Essa combinação de conservadorismo macroeconômico
com um discurso populista não
parecia, aos poucos críticos do governo, uma receita estável. Mas os
sucessos conjunturais iniciais e o
discurso sobre uma tal herança
maldita mascararam essa contradição.
Entramos agora em um período
em que os ganhos do passado estão perdendo grande parte do brilho inicial. Adicionalmente, a
opinião pública toma consciência
de que o governo não tem capacidade administrativa para realizar seus projetos e que a liderança
de Lula é confusa e pouco eficiente.
À medida que o ano passa e os
dados revelam a verdadeira dimensão da recuperação econômica em curso, essa contradição, entre promessas e realidade, torna-se cada dia mais clara. Em algum
momento, enfrentaremos uma
crise de proporções graves e de difícil solução. A confusão externa
adiciona um ingrediente a mais
nesse quadro de dificuldades.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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