São Paulo, sexta-feira, 30 de junho de 2006

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ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAL

O Senado e a Super-Receita

No projeto de Super-Receita, não se pensou no cidadão, mas só na ampliação dos poderes para a fiscalização

ESTÁ EM plena análise pelo Senado o projeto de lei de criação da Super-Receita. Pelo bem do contribuinte, que é quem suporta o custo do Estado e de seus servidores, é inadiável melhorar o tratamento que lhe é deferido pelo fisco. Esse é o momento de a sociedade se manifestar e lutar por emendas que protejam o cidadão, pois, do contrário, apenas os interesses corporativos e de eficiência arrecadatória serão contemplados. Se a fusão do fisco e da Previdência visa garantir maior arrecadação, deverá também custar menos no bolso de cada brasileiro. Sem isso, corremos o risco de ter mais um mastodonte estatal. É imprescindível a previsão de um rol mínimo de salvaguardas ao contribuinte, que convive com microdireitos e serviços públicos em geral precários, quando não inexistentes ou por demais onerosos. Por essa razão e a requerimento do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), participamos de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado em que apresentamos, pela OAB-SP, emendas em prol do contribuinte. Ao lado de uma carga tributária indiscutivelmente elevada, a tirania burocrática é crescente, a informalidade é generalizada e a sonegação corrói a competitividade dos contribuintes honestos. Não se incentiva a formalização das relações com o fisco. O cidadão teme o Estado, e o contribuinte mais zeloso aguarda o dia em que, devendo ou não, será importunado pela máquina tributária. É usual a cobrança de tributos já pagos ou pelos quais não se sabia devedor. Quanto mais pobre e indefeso, maiores serão as dificuldades. As greves do funcionalismo se tornaram freqüentes nos últimos tempos e parece que, por serem tão corriqueiras e repetitivas, a população em geral, acostumada ao descaso do serviço público, nelas nem sequer percebe um fato grave digno de nota. Ninguém deverá ficar indiferente ao que ocorre. Os investidores buscam zonas francas ou incentivos fiscais. As exportações têm tratamento fiscal menos danoso e, assim, quem atende ao mercado doméstico sente-se traído pela alta incidência tributária e burocracia sufocante. Com a Super-Receita, pretende-se disseminar medidas arbitrariamente punitivas e vexatórias, como o detestável "protesto" de títulos de dívida tributária ou previdenciária, criando mais uma "taxa" típica do Brasil-cartorial e país-atraso. Na Super-Receita, não se pensou no cidadão, mas apenas na ampliação dos controles administrativos e dos poderes para a fiscalização. Em suma, tudo o que concorre para arrecadar mais e nada no que se refere à melhoria das relações fisco-contribuinte. Para que um mínimo seja garantido ao cidadão, as propostas de emenda tratam de questões que afetam o dia-a-dia, sem dúvida beneficiarão milhares de contribuintes e são um incentivo à formalidade. Há previsão de anterioridade para novas obrigações burocráticas, vedação de controles administrativos repetitivos e consolidação de documentos fiscais e previdenciários; dispensa de autenticação de cópias reprográficas; previsão de horário mínimo de atendimento pelos órgãos fazendários; obrigação e prazo para o fisco decidir requerimentos e defesas do contribuinte; proibição de protesto de títulos da dívida fiscal; revogação de multas administrativas arbitrárias; previsão de direito de defesa antes de serem adotadas medidas punitivas ao contribuinte. Em síntese, coisas simples e práticas, que protegem principalmente os mais fracos e que já deveriam, de muito, existir no Brasil (*). Agora que o Senado se debruça sobre o projeto de Super-Receita, espera-se que haja um mínimo de preocupação com o cidadão. As emendas propostas pela OAB-SP são fundamentais para inaugurar uma nova era nas relações fisco-contribuinte. Embora singelas, são um gigantesco e marcante passo voltado ao respeito do cidadão, que deveria ser, de modo ordinário e rotineiro, objeto das legislações tributárias votadas no Congresso Nacional.


A íntegra das propostas de emenda estão no site www.cenofisco.com.br/otributario/doc/propostas-emendas.doc
ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAL, professor de direito constitucional da Universidade Mackenzie, é mestre em direito (LL.M.) pela Harvard Law School, especialista em tributação comparada e internacional pela Universidade Harvard e presidente da Comissão de Comércio Exterior e Relações Internacionais da OAB-SP.
Hoje, excepcionalmente, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.


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