São Paulo, Quarta-feira, 30 de Junho de 1999
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NOVA ÂNCORA
Economistas apontam vantagens e desvantagens do "inflation targeting" adotado pelo BC
Déficit fiscal pode comprometer inflação

VANESSA ADACHI
da Reportagem Local

O elevado déficit público será o vilão do novo sistema de metas inflacionárias, que deve ser anunciado hoje pelo governo.
Essa é a avaliação dos economistas Gustavo Franco e José Júlio Sena, ex-presidente e ex-diretor do Banco Central, respectivamente. Ambos debateram o tema ontem em São Paulo.
O "inflation targeting" é o sistema de política monetária em que o governo usa os juros para manter a inflação dentro de uma meta preestabelecida. O ministro Pedro Malan (Fazenda) deve anunciar hoje essa meta, prevista para ser de 6% ao ano.
"É impossível manter a inflação baixa com um déficit fiscal elevado. Se continuar assim, não será possível cumprir as metas", disse Sena. Isso porque, disse ele, quando o governo precisar aumentar os juros para cumprir a meta, o déficit público explodirá.
Apesar disso, Sena é a favor do modelo e acredita que as chances de sucesso são boas. "Pode funcionar, na medida em que o a equipe econômica se comprometa com isso e force o resto do governo a controlar o déficit."
Para Gustavo Franco, o sucesso do sistema que se inicia hoje está comprometido pelo desequilíbrio fiscal do governo. "Nenhum regime de política monetária ou cambial funciona bem em um cenário de déficit fiscal elevado. Por outro lado, todos funcionam razoavelmente bem com o lado fiscal em ordem", disse Gustavo Franco em debate promovido pela Abrapp, entidade que reúne os fundos de pensão.
Para ele, as metas de inflação são "uma discussão secundária". "Acho positivo que o Banco Central tenha um regime de política monetária definido, mas qualquer um estaria bom se as contas públicas estivessem em ordem."
Franco foi mais longe e avaliou que o novo sistema pode acabar tendo o efeito oposto ao que se propõe. Para ele, há risco de o BC deixar de colocar em prática políticas antiinflacionárias porque a taxa está abaixo da meta. "E nós não estamos no ponto de relaxar no combater à inflação ainda."
Gustavo Franco se mostrou bastante crítico em relação ao sistema de metas de inflação. O mecanismo está sendo implantado para substituir a âncora cambial, abandonada com a liberalização do câmbio, que era amplamente sustentada por ele no governo.
Já José Júlio Sena posicionou-se totalmente a favor do novo modelo. "A mudança cambial não seria completa sem outra âncora para segurar a estabilidade. E o sistema de metas de inflação é a melhor alternativa para seguir na esteira do abandono do câmbio fixo", afirmou. O ex-diretor do BC foi um grande crítico do regime cambial conduzido por Gustavo Franco. "O regime atual é muito superior ao anterior", disse ele ontem.
Sena avaliou que a meta de 6% é "factível". "Ela já está dentro da expectativa de inflação do mercado e por isso permitirá que a redução dos juros continue."
"O "inflation targeting" não é só uma meta de inflação, abre a possibilidade de o governo manipular os juros para tirar a economia da recessão", disse. Sena espera uma taxa de juros nominal de 18% ao ano no fim de 99.


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