São Paulo, quarta-feira, 30 de julho de 2008

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Para analistas, país agiu certo ao priorizar OMC

MARCELA CAMPOS
DA REDAÇÃO

Apesar do novo fracasso em liberalizar o comércio mundial, a maioria dos especialistas em política externa avalia como "correta" a prioridade dada pelo Brasil ao foro comercial multilateral, relegando a um segundo plano as grandes negociações bilaterais. Alguns analistas argumentam que tal estratégia, na verdade, foi adotada por falta de opção. O acordo de livre comércio Brasil-União Européia, por exemplo, esbarrou no mesmo impasse que hoje emperra a Rodada Doha: a negativa dos europeus em aumentar o acesso ao mercado agrícola enquanto não houvesse acordo na OMC.
Na avaliação do ex-embaixador do Brasil nos EUA Rubens Ricupero, a estratégia do Itamaraty de concentrar os esforços na Rodada Doha não prejudicou o desempenho comercial do Brasil. "Em termos práticos, não saímos perdendo coisa alguma porque, nas áreas em que temos mais vantagens comparativas, os acordos bilaterais [com EUA e UE] não nos concederiam nada" -suco de laranja, álcool, açúcar, tabaco, carnes. Segundo ele, na área em que o país tem competitividade -commodities agrícolas-, a grande demanda não vem dos EUA, mas dos asiáticos, economias que crescem mais rapidamente. E, no campo dos manufaturados em que há capacidade exportadora aos EUA, caso da Embraer, já não há tarifa, afirma. "Não acho que haja um prejuízo real [por privilegiar o multilateralismo]. Temos negociado, com o Grupo Andino, por exemplo, mas no âmbito do Mercosul. Sendo uma união aduaneira com barreira tarifária comum a terceiros, o bloco não permite que cada membro possa negociar livremente tratados bilaterais", afirma o ex-ministro da Fazenda.
Na avaliação do economista Alessandro Teixeira, presidente da Apex (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos), os aumentos crescentes nas exportações demonstram que a estratégia de optar pelo multilateralismo foi bem-sucedida. "Após essa mudança, o Brasil deixou de ser "mais um" para assumir a liderança do bloco latino-americano, atingindo outro patamar." Hoje, avalia, toda negociação multilateral tem que passar pelo país.
Ricupero afirma que, nas negociações regionais com parceiros mais poderosos, a assimetria de poder é sentida de forma muito mais poderosa. Ele cita o exemplo dos EUA, que nunca conseguiram acordos de propriedade industrial ou de investimentos no âmbito multilateral, mas os conquistaram no âmbito do Nafta e dos tratados bilaterais. O embaixador, que diz ter sido sempre contrário a tratados bilaterais, explica que, quando há concessões numa negociação multilateral, o sacrifício tem como contrapartida o acesso ao mercado de 152 países. Já em uma negociação bilateral, o sacrifício é o mesmo e o acesso é menor, porque se negocia com com poucos parceiros.
André Nassar, presidente do Icone (Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais), relativiza a importância de contrapor as estratégias bi e multilateral. "Com ou sem acordos bilaterais, o Brasil jamais deixaria de fazer negociações multilaterais porque só na OMC se lida com temas sistêmicos [como subsídios e disciplinas referentes a salvaguardas e antidumping]."


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