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ENTREVISTA NIZAN GUANAES
"É preciso ter um desocupado na empresa"
O publicitário Nizan Guanaes segue para Nova York na busca por novas inspirações e procurando ficar atento às tendências do futuro
O publicitário Nizan Guanaes está de "meia" mudança para Nova York. Dono do maior grupo
publicitário do país, o abc, Guanaes, 51, passará
a dividir o mês entre a metrópole americana e
São Paulo. Quer "levar a cabeça para passear" e buscar tendências. Para ele, a internet tem mais estardalhaço do que
efetividade no país e, "às vezes, revolucionário é investir em
jornal". O único tema que o opinativo publicitário se recusa a
comentar é a política.
Leonardo Wen/Folha Imagem
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O publicitário Nizan Guanaes, do abc, em sua casa no Jardim Europa, em São Paulo; mercados emergentes serão alvo do grupo
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL
A ambição de Nizan Guanaes
é fazer do abc o nono grupo publicitário do mundo (atualmente é o 20º): "Se o Brasil é a
nona economia, eu quero ser a
nona empresa do mundo", diz.
Leia a seguir os principais
trechos da entrevista que ele
concedeu à Folha.
FOLHA - Por que a ida a Nova York?
NIZAN GUANAES - Estou mudando para Nova York para ficar
mais perto do Brasil. Tem um
Brasil internacional que é um
competidor global e cada vez
mais vai ser chamado para os
fóruns mundiais. Se há mercados emergentes, há obrigações
emergentes. Tenho hoje uma
agenda internacional e nesses
eventos pego informações que
se traduzem em produtos e serviços para meus clientes.
FOLHA - Sua mudança envolve a
expansão internacional do abc?
GUANAES - Também, mas estou
indo por conta da internacionalização do pensamento: ter
uma visão das coisas que estão
acontecendo. Um consultor
com quem trabalho, o John
Kao, desenhou meu papel como sendo de "blank sheet". É
preciso ter um desocupado nas
empresas. Se todos estão ocupados com o presente, quem
está de olho no momento seguinte, no futuro? É claro que,
quando um grande cliente precisa, eu intervenho. Não estou
em outro planeta. Vou ficar 15
dias lá e 15 dias aqui. Vou levar
minha cabeça para passear porque senão só vou dar soluções
que já se conhece.
FOLHA - Como o sr. vê as mudanças
pelas quais a propaganda está passado lá fora, com relação ao Brasil?
GUANAES - É preciso dar o desconto da demografia. Eu, que
sofri no início da internet [Guanaes saiu da propaganda para
criar o portal iG, vendido depois para a BrasilTelecom], sei
muito bem o que é entrar num
negócio antes do tempo. Sei
analisar a base de dados direitinho e dar o devido desconto.
FOLHA - O sr. fala de sustentabilidade como tendência. A propaganda é vista como um adversário desse
movimento pelo estímulo ao consumo. Como conciliar essas visões?
GUANAES - O papel da propaganda é dizer compre, mas ficou provado nesta crise que levar para o consumo irresponsável é péssimo para todo mundo.
A propaganda é um símbolo do
consumo, não precisa ser do
consumismo. Exemplo: as empresas de automóvel que primeiro viram para onde estava
indo a sociedade são aquelas
que estão sadias neste momento. As que ficaram produzindo
carros beberrões estão em
maus lençóis. É preciso pensar
para onde vai o mundo.
FOLHA - Como isso vai impactar a
propaganda, cuja mensagem sempre foi "compre"?
GUANAES - A mensagem agora é
compre, mas de maneira responsável. E para toda a cadeia:
produza de maneira responsável, se relacione com seus consumidores, com seus acionistas, com seus fornecedores,
com todos, de maneira responsável. Não existe sustentabilidade marqueteira. Ou você põe
dentro do seu modelo de negócios, ou você está fora.
FOLHA - Com tanta informação na
internet, a mensagem da propaganda não foi diluída?
GUANAES - Ela foi diluída, mas
não fracionada. É mais desafiador. A internet é o presente,
mas, como a água encanada e a
luz, ainda não chegou em muitos lugares. É preciso olhar com
atenção. Uma empresa normal
deve investir de 7% a 10% do total, na internet. Há empresas
voltadas para jovens que devem
investir mais. Mas há casos em
que revolucionário é investir
em jornal. Televisão é um fenômeno. Jornal é uma verdade
que você pega com a mão.
FOLHA - O que mudou com a crise?
GUANAES - Acabamos importando uma crise que era mais
forte lá fora do que aqui dentro.
Quem tinha contas de mercado
interno não sentiu tanto.
FOLHA - E a questão regional?
GUANAES - Todo mundo acha
que mercado emergente é China, Índia, Leste Europeu, mas,
para mim, mercado emergente
é Pernambuco, Bahia, a rota do
pré-sal... Os anunciantes começam a vir desses lugares. Você
não o conhece, mas ele está lá,
bombando. A propaganda hoje
é muito paulista. O olhar terá
de ser diferente.
FOLHA - E os planos de IPO (abertura de capital na Bolsa)?
GUANAES - Queremos o IPO para fazer uma empresa, e não
uma empresa para fazer um
IPO. Nosso grupo tem 15 empresas e está crescendo, mas
tem de ir com bases sólidas.
FOLHA - Não é contraditório ir aos
EUA no momento em que todos falam da crise da Madison Avenue,
onde estão as grandes agências?
GUANAES - Os Estados Unidos
são uma grande economia.
Apostar contra os EUA é apostar contra o sol. É bobagem.
FOLHA - Seu grupo é o 20º maior
do mundo e quer estar entre os dez
primeiros. É factível?
GUANAES - Se o Brasil é a nona
economia, eu quero ser a nona
empresa do mundo. Vamos
consolidar o mercado interno,
nos expandindo nos mercados
emergentes do Brasil e tendo
uma participação ativa nos
mercados emergentes de todo
o mundo.
São os mercados com economia em alta, mas não são publicitariamente desenvolvidos,
como Angola, Panamá, Cuba,
Oriente Médio...
FOLHA - De onde virão os recursos?
GUANAES - De fundos de "private equity" [fundos que investem em empresas fechadas] e
não pela Bolsa, porque ainda
não temos tamanho para isso.
Não tenho pressa. Tenho foco.
FOLHA - O governo tem fomentado grupos brasileiros internacionais.
O sr. vai buscar esse apoio?
GUANAES - Tenho procurado
falar com os governos, em todas
as instâncias, para mostrar o
que estamos fazendo. Se houver outro grupo brasileiro com
o qual possamos fundir, melhor
ainda. O mundo é consolidação.
FOLHA - O Brasil precisa de um
grande grupo de propaganda?
GUANAES - O Brasil precisa de
grandes grupos, em todas as
áreas. Sairemos da era da commodity para a da marca.
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