São Paulo, domingo, 30 de agosto de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ENTREVISTA NIZAN GUANAES

"É preciso ter um desocupado na empresa"

O publicitário Nizan Guanaes segue para Nova York na busca por novas inspirações e procurando ficar atento às tendências do futuro

O publicitário Nizan Guanaes está de "meia" mudança para Nova York. Dono do maior grupo publicitário do país, o abc, Guanaes, 51, passará a dividir o mês entre a metrópole americana e São Paulo. Quer "levar a cabeça para passear" e buscar tendências. Para ele, a internet tem mais estardalhaço do que efetividade no país e, "às vezes, revolucionário é investir em jornal". O único tema que o opinativo publicitário se recusa a comentar é a política.

Leonardo Wen/Folha Imagem
O publicitário Nizan Guanaes, do abc, em sua casa no Jardim Europa, em São Paulo; mercados emergentes serão alvo do grupo

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

A ambição de Nizan Guanaes é fazer do abc o nono grupo publicitário do mundo (atualmente é o 20º): "Se o Brasil é a nona economia, eu quero ser a nona empresa do mundo", diz. Leia a seguir os principais trechos da entrevista que ele concedeu à Folha.

 

FOLHA - Por que a ida a Nova York?
NIZAN GUANAES
- Estou mudando para Nova York para ficar mais perto do Brasil. Tem um Brasil internacional que é um competidor global e cada vez mais vai ser chamado para os fóruns mundiais. Se há mercados emergentes, há obrigações emergentes. Tenho hoje uma agenda internacional e nesses eventos pego informações que se traduzem em produtos e serviços para meus clientes.

FOLHA - Sua mudança envolve a expansão internacional do abc?
GUANAES
- Também, mas estou indo por conta da internacionalização do pensamento: ter uma visão das coisas que estão acontecendo. Um consultor com quem trabalho, o John Kao, desenhou meu papel como sendo de "blank sheet". É preciso ter um desocupado nas empresas. Se todos estão ocupados com o presente, quem está de olho no momento seguinte, no futuro? É claro que, quando um grande cliente precisa, eu intervenho. Não estou em outro planeta. Vou ficar 15 dias lá e 15 dias aqui. Vou levar minha cabeça para passear porque senão só vou dar soluções que já se conhece.

FOLHA - Como o sr. vê as mudanças pelas quais a propaganda está passado lá fora, com relação ao Brasil?
GUANAES
- É preciso dar o desconto da demografia. Eu, que sofri no início da internet [Guanaes saiu da propaganda para criar o portal iG, vendido depois para a BrasilTelecom], sei muito bem o que é entrar num negócio antes do tempo. Sei analisar a base de dados direitinho e dar o devido desconto.

FOLHA - O sr. fala de sustentabilidade como tendência. A propaganda é vista como um adversário desse movimento pelo estímulo ao consumo. Como conciliar essas visões?
GUANAES
- O papel da propaganda é dizer compre, mas ficou provado nesta crise que levar para o consumo irresponsável é péssimo para todo mundo. A propaganda é um símbolo do consumo, não precisa ser do consumismo. Exemplo: as empresas de automóvel que primeiro viram para onde estava indo a sociedade são aquelas que estão sadias neste momento. As que ficaram produzindo carros beberrões estão em maus lençóis. É preciso pensar para onde vai o mundo.

FOLHA - Como isso vai impactar a propaganda, cuja mensagem sempre foi "compre"?
GUANAES
- A mensagem agora é compre, mas de maneira responsável. E para toda a cadeia: produza de maneira responsável, se relacione com seus consumidores, com seus acionistas, com seus fornecedores, com todos, de maneira responsável. Não existe sustentabilidade marqueteira. Ou você põe dentro do seu modelo de negócios, ou você está fora.

FOLHA - Com tanta informação na internet, a mensagem da propaganda não foi diluída?
GUANAES
- Ela foi diluída, mas não fracionada. É mais desafiador. A internet é o presente, mas, como a água encanada e a luz, ainda não chegou em muitos lugares. É preciso olhar com atenção. Uma empresa normal deve investir de 7% a 10% do total, na internet. Há empresas voltadas para jovens que devem investir mais. Mas há casos em que revolucionário é investir em jornal. Televisão é um fenômeno. Jornal é uma verdade que você pega com a mão.

FOLHA - O que mudou com a crise?
GUANAES
- Acabamos importando uma crise que era mais forte lá fora do que aqui dentro. Quem tinha contas de mercado interno não sentiu tanto.

FOLHA - E a questão regional?
GUANAES
- Todo mundo acha que mercado emergente é China, Índia, Leste Europeu, mas, para mim, mercado emergente é Pernambuco, Bahia, a rota do pré-sal... Os anunciantes começam a vir desses lugares. Você não o conhece, mas ele está lá, bombando. A propaganda hoje é muito paulista. O olhar terá de ser diferente.

FOLHA - E os planos de IPO (abertura de capital na Bolsa)?
GUANAES
- Queremos o IPO para fazer uma empresa, e não uma empresa para fazer um IPO. Nosso grupo tem 15 empresas e está crescendo, mas tem de ir com bases sólidas.

FOLHA - Não é contraditório ir aos EUA no momento em que todos falam da crise da Madison Avenue, onde estão as grandes agências?
GUANAES
- Os Estados Unidos são uma grande economia. Apostar contra os EUA é apostar contra o sol. É bobagem.

FOLHA - Seu grupo é o 20º maior do mundo e quer estar entre os dez primeiros. É factível?
GUANAES
- Se o Brasil é a nona economia, eu quero ser a nona empresa do mundo. Vamos consolidar o mercado interno, nos expandindo nos mercados emergentes do Brasil e tendo uma participação ativa nos mercados emergentes de todo o mundo.
São os mercados com economia em alta, mas não são publicitariamente desenvolvidos, como Angola, Panamá, Cuba, Oriente Médio...

FOLHA - De onde virão os recursos?
GUANAES
- De fundos de "private equity" [fundos que investem em empresas fechadas] e não pela Bolsa, porque ainda não temos tamanho para isso. Não tenho pressa. Tenho foco.

FOLHA - O governo tem fomentado grupos brasileiros internacionais. O sr. vai buscar esse apoio?
GUANAES
- Tenho procurado falar com os governos, em todas as instâncias, para mostrar o que estamos fazendo. Se houver outro grupo brasileiro com o qual possamos fundir, melhor ainda. O mundo é consolidação.

FOLHA - O Brasil precisa de um grande grupo de propaganda?
GUANAES
- O Brasil precisa de grandes grupos, em todas as áreas. Sairemos da era da commodity para a da marca.


Texto Anterior: Cartório resiste a reduzir preços dos registros
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.