São Paulo, segunda-feira, 30 de setembro de 2002

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EM TRANSE

Quebra do país abalaria economia global, diz ex-megaespeculador

Brasil ruma para a falência depois da eleição, diz Soros

France Presse
Manifestantes em Washington (EUA) protestam contra o Banco Mundial, o FMI e a política dos Estados Unidos em relação ao Iraque


MARCIO AITH
DE WASHINGTON

O financista George Soros disse ontem que a economia brasileira caminha para uma falência que irá abalar seriamente indústrias americanas e mercados financeiros mundiais. Numa entrevista à TV americana ABC, Soros disse que, com o risco Brasil perto de 2.500 pontos e a provável eleição do candidato do PT à presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, o governo deverá ser obrigado a dar um calote em sua dívida pública.
"Temos um problema no Brasil. O Brasil está perto de ter eleições. Será eleito um presidente que não é apreciado pelos mercados financeiros. As taxas de juros (risco-país) vão chegar a 25%. A essa altura, o Brasil estará falido."
Soros afirmou que o colapso da dívida brasileira até poderia ser evitado, mas os líderes mundiais - FMI, EUA e países europeus- estão passivos. "(O calote) Poderia ser evitado, porque tudo do que precisamos é de um emprestador de última instância. E as autoridades (internacionais) estão dormindo na central de controle". Enquanto Soros fazia essas declarações ao programa de entrevistas "This Week", seu ex-funcionário, o presidente do BC brasileiro, Armínio Fraga, esforçava-se para convencer investidores, reunidos em Washington, que a dívida brasileira é administrável e que a percepção dos mercados com relação a um eventual governo do PT é exagerada.
Armínio e o ministro da Fazenda, Pedro Malan, participaram da reunião anual do FMI e do Bird (Banco Mundial), que acabou ontem em clima de ansiedade com relação ao futuro da economia brasileira e às eleições.
Fraga, Malan e a cúpula do FMI tentaram, durante uma semana, convencer investidores e analistas pessimistas de que as turbulências são transitórias e resultam de desconhecimento sobre a situação real do país e dos compromissos dos candidatos à presidência.
A reação dos mercados hoje deverá mostrar se os esforços pró-Brasil surtiram algum efeito. Na sexta-feira passada, o risco-país do Brasil fechou em 2.440 pontos (ou 24,4% acima dos juros cobrados dos papéis do Tesouro americano), nível mais alto desde 1998.
No entanto, seja qual for a reação dos mercados até as eleições, as dúvidas sobre o Brasil acabaram acelerando o debate sobre a criação de um mecanismo contratual para solução de novas crises financeiras. O G-7 e um grupo de países emergentes concordaram, em princípio, em adotar uma espécie de "cláusula do calote" em seus títulos públicos - cláusulas que permitem a governos endividados convocar credores para renegociarem ordenadamente os valores dos títulos.
Sob pressão dos EUA, países como o Brasil, México e Coréia do Sul aceitaram participar dessa discussão, mas deixaram claro que preferiam elaborar um mecanismo para impedir, e não organizar, a quebra de países.
"Somos favoráveis a essa cláusula, mas, francamente, essa discussão está enviesada", disse o presidente do BC mexicano, Guillermo Ortiz. "É como se, durante a construção de um hospital, estivéssemos dando uma ênfase especial ao necrotério. Não se resolvem problemas no necrotério."
A crítica de Ortiz tem como pano de fundo uma insatisfação crescente dos países emergentes com a obsessão dos EUA com relação a esse assunto e à decisão do G-7 de restringir ainda mais a ajuda financeira a nações em crise.
Na entrevista à ABC, Soros resvalou nesse assunto. "O secretário do Tesouro (dos EUA), Paul O'Neill, está muito engajado em elevar a ajuda (humanitária) e aplaudo seus esforços nessa direção. Mas ele não está focando sua atenção na instabilidade do sistema financeiro. E aí é que estão os problemas. Uma quebra do Brasil teria repercussões severas. Afetaria, por exemplo, nosso (dos EUA) sistema financeiro. Temos muitos bancos envolvidos. Afetaria algumas de nossas empresas. Então, seria um choque muito negativo para o mercado."
Os EUA têm se defendido dessas críticas alegando ter apoiado o pacote de US$ 30,4 bilhões ao Brasil, o maior da história do FMI. No entanto, como indicaram vários investidores em seminários patrocinados nos últimos por bancos privados, o pacote do Fundo seria uma miragem porque seus desembolsos estão concentrados para o fim do programa.


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