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Slim diz que perdeu a conta do patrimônio e quer deixar legado
Empresário, que disputa com Bill Gates posto de homem
mais rico do mundo, afirma não saber quantas empresas tem
Recentemente, o mexicano,
proprietário das gigantes
América Móvil e Telmex,
começou a aumentar seus
gastos com filantropia
ADAM THOMSON
DO "FINANCIAL TIMES", NA CIDADE DO MÉXICO
O céu escureceu e uma chuva
de granizo arremessa pedras do
tamanho de uvas enquanto
Carlos Slim, 67, sentado a uma
grande mesa de jantar em uma
de suas casas em um bairro rico
da Cidade do México, briga com
seu celular. "Não sei como mexer com isso", diz ele.
Slim, que de acordo com algumas estimativas se tornou
neste ano o homem mais rico
do mundo -a "Forbes" ainda o
mantém no segundo posto,
mas deve colocá-lo no topo de
sua próxima lista das pessoas
mais endinheiradas-, atrapalhou-se porque tirou uma foto
com o aparelho e está tentando
enviá-la a outro celular.
Enquanto ele briga com o teclado, rapidamente se torna
aparente que Slim, dono de um
panteão de empresas que inclui
companhias de telecomunicações espalhadas pelas Américas, não é nenhum Bill Gates.
O engenheiro de software de
Seattle, a quem Slim está desalojando de sua posição no topo
das listas de bilionários, fez sua
fortuna ocupando posição de
vanguarda em termos de conhecimento setorial. Slim, não:
em uma entrevista coletiva de
quatro horas realizada em março, ele ouviu atentamente a
uma pergunta técnica de uma
jornalista local, fez uma pausa e
respondeu: ""Señorita", não faço idéia do que esteja dizendo".
Mas Slim, que se formou em
engenharia e ensinou matemática na universidade depois da
graduação, provou ser um homem de negócios formidável.
Comanda um império que se
estende de bancos, seguros e
supermercados a restaurantes,
cigarros e cimento, além da
Telmex e da América Móvil, as
gigantes das telecomunicações.
No Brasil, é dono da Claro e da
Embratel.
A Telmex domina a telefonia
fixa no México, respondendo
por mais de 90% do mercado. É
uma empresa que apresenta
notável lucratividade: a cada
ano, gera lucros brutos suficientes para cobrir o custo original de sua aquisição.
A despeito do controle sobre
a telefonia fixa, o governo mexicano permitiu que ele entrasse no mercado de telefonia móvel, e ele cindiu a Telmex para
criar a América Móvil. O número de assinantes da operadora
vem crescendo 65% ao ano desde 2000, de acordo com Slim, e
hoje ela atende a mais de 125
milhões de clientes.
O início
Boa parte desse crescimento
surgiu da habilidade aparentemente infalível do empresário
para localizar empresas subvalorizadas e mal geridas, adquiri-las e reverter sua situação.
Mas seus detratores dizem que
ele jamais se teria tornado o homem mais rico do mundo não
fossem duas coisas.
A primeira foi a aquisição da
Telmex, em 1990, como parte
do programa mexicano de privatização. Os críticos dizem
que a transação serviu para retardar por anos a chegada da
concorrência ao mercado de telecomunicações. A segunda são
os preços que ele consegue cobrar de seus usuários. Segundo
a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o México está
entre os países-membros com
tarifas mais elevadas.
Slim descarta as duas críticas. Em incontáveis ocasiões,
ele mencionou a assinatura
mensal de US$ 14 da Telmex
como prova de que sua operação de telefonia fixa também é
competitiva. Ele alega, igualmente, que o uso de celulares
no México é mais barato do que
em muitos outros países.
Para sublinhar o ponto, ele
pede que um assistente traga
lista recente com os preços de
telecomunicações em todo o
mundo. Ele apanha uma caneta
e lê os números. "Está vendo?
US$ 0,11 por minuto", diz.
"Mais barato que a média latino-americana, européia e de
todos os países desenvolvidos."
A apresentação dessa tabela é
uma cena que ele aperfeiçoou
ao longo dos anos. O problema
é que está lendo uma coluna de
números baseada em serviços
por assinatura, que apenas uma
pequena parte dos clientes de
sua operadora usa. Os demais
utilizam celulares pré-pagos
-modelo que ele alega ter inventado-, em que o custo pode
chegar a US$ 0,35 por minuto.
Embora os mexicanos continuem debatendo monopólios e
preços e a Comissão Federal da
Competição, uma agência do
governo, mantenha na mira as
empresas de Slim, não há dúvida de que o seu envolvimento
no setor foi fundamental para
que ele se tornasse um homem
extremamente rico.
Controlando mais de 200
empresas (ele diz ter perdido a
conta exata), seu império responde por mais de um terço do
movimento da Bolsa mexicana.
De acordo com a "Forbes", para
quem ele tem uma fortuna de
US$ 53,1 bilhões, em 2006, o
patrimônio líquido de Slim
cresceu em US$ 19 bilhões, ou
US$ 52 milhões ao dia.
Homem simples
No entanto, apesar de todo
esse dinheiro, Slim é relativamente frugal. A casa em que está é grande, mas não poderia jamais ser descrita como mansão. Ele a usa como escritório
alternativo; a outra casa que
mantém na cidade é a mesma
em que vive há 36 anos.
Entre duas estantes de livros
(uma com volumes antigos; outra com livros contemporâneos), fica uma mesa pesada e
antiga, em estilo de refeitório,
sobre a qual repousam mais livros, uma floresta de fotos de
família e um grupo de elefantes
de madeira entalhada, com cerca de 20 centímetros de altura.
O gosto de Slim é essencialmente conservador. Ele é conhecido por não gastar com os
iates e as casas de luxo que os
demais bilionários mexicanos
gostam de exibir. Na verdade,
faz questão de não ter imóveis
pessoais fora do México.
"Para quê?", ele pergunta.
"Se eu tivesse uma casa em Nova York ou outro lugar como esse, teria de ter toda uma equipe
para cuidar dela e só a usaria alguns dias por ano. Muito mais
fácil ficar em um hotel."
Essa abordagem discreta
quanto à vida chega bem perto
da parcimônia. Ainda que fume
charutos Cohiba, ele os acende
com um isqueiro de plástico
com propaganda da Telmex. O
relógio que usa é um Victorinox. Insiste em que ser a pessoa
mais rica do mundo não interessa muito. "Não se trata de
um jogo de futebol."
Viúvo, Slim não parece ansioso quanto aos percalços de
uma sucessão. Já entregou o
comando das principais empresas aos filhos e diz que está
confiante em que seu império
manterá o rumo mesmo depois
que se afaste completamente.
Não que ele admita planos de
fazê-lo. "É como ser pintor",
diz. "Os artistas não deixam de
fazer o que fazem somente porque pintaram uma bela paisagem. Continuam até morrer."
Mas parece preocupado com
a perspectiva da velhice. O sexagenário fala constantemente
sobre a juventude daqueles que
o cercam e, em diversas ocasiões durante a entrevista, fez
pausas para enxugar lágrimas
em seu olho direito.
Filantropia
A preocupação parece estar
conduzindo Slim a uma nova
fase em sua vida, dominada pela nostalgia e pelo crescente temor de não deixar um legado
suficientemente importante.
Recentemente, decidiu elevar suas contribuições aos fundos de caridade de suas empresas de US$ 4 bilhões a US$ 10 bilhões, nos próximos quatro
anos. "O que o México precisa é
de capital humano e físico", diz,
para designar educação e saúde. "Pretendemos começar
com as mulheres, logo que engravidam. Desejamos uma população com melhor saúde e
melhor preparação."
Por anos, os mexicanos vêm
se queixando de que Slim não
faz muito para ajudar. Por que
ele não começou suas empreitadas filantrópicas mais cedo?
"Estava ocupado demais trabalhando", afirma. "Agora chegou
a hora de fazer diferença..."
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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