São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2004

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Queda nos depósitos motivou alta das taxas

CLÁUDIA TREVISAN
DE PEQUIM

A queda no ritmo de crescimento dos depósitos bancários desde o início do ano esteve entre as razões que levaram o Banco Central da China a subir os juros desde ontem, no primeiro aumento da taxa desde 1995.
Com a inflação próxima de 5% e a remuneração de depósitos de um ano em 1,98%, a taxa de juros estava negativa e aqueles que optavam por deixar recursos no sistema financeiro estavam perdendo dinheiro.
O aumento em 0,27 ponto percentual vai elevar os juros sobre os depósitos de um ano para 2,25%, o que ainda manterá a taxa em um nível inferior ao da inflação. Mas analistas acreditam que o movimento da autoridade monetária foi um alerta para os que estão retirando recursos dos bancos e aplicando principalmente no setor imobiliário.
"A taxa de juros na China vinha caindo há nove anos e a inflação está mais alta do que os juros dos financiamentos imobiliários", diz Andy Xie, economista-chefe do Morgan Stanley na China. "O aumento da taxa vai lembrar as pessoas que suas dívidas imobiliárias também podem subir, o que vai ajudar a reduzir a especulação imobiliária", acrescenta.
A taxa de crescimento dos depósitos bancários caiu por sete meses consecutivos, de 20,5% em janeiro para 15,3% em agosto deste ano. Isso significa que cerca de US$ 17 bilhões deixaram de ser poupados pelos chineses e se transformaram em investimentos, o que ajudou a manter as altas taxas de expansão do PIB.
O destino preferido desses recursos é o setor imobiliário, que muitos analistas acreditam estar envolto em uma "bolha especulativa" cujo estouro poderá ter conseqüências imprevisíveis sobre a economia chinesa.
A grande aposta agora é saber se o Banco Central adotará novas altas na taxa de juros no curto prazo. Jonathan Anderson, economista-chefe do UBS na China, não acredita que a decisão anunciada anteontem é o início de uma série de ajustes nos juros, mas não descarta novo aumento de até 0,50 ponto percentual se a inflação continuar em alta. De julho a setembro, o Índice de Preços ao Consumidor foi de cerca de 5%, acima das expectativas oficiais.

Outros aumentos virão
Xie acredita que a alta é a primeira de "muitas que virão". Para ele, a China vai seguir os passos do Federal Reserve (o BC norte-americano) no que diz respeito à elevação dos juros nos próximos meses. "Esse caminho oferece a melhor chance para a China conseguir um "soft-landing'", afirma Xie, em referência à redução sem traumas da atividade econômica desejada pelo governo.
O economista Michael Pettis, professor de Finanças Internacionais da Universidade de Pequim, afirma que é difícil prever o impacto que a alta dos juros terá sobre a economia, pela falta de referências históricas.
"Não temos antecedentes para fazer essa análise. É a primeira vez que eles aumentam a taxa de juros em nove anos e nove anos atrás a China era um país totalmente diferente", ressalta Pettis.
Na sua opinião, a alta dos juros levanta dúvidas sobre a confiabilidade dos números que o governo vem apresentando para demonstrar o sucesso de sua estratégia na busca de um "soft-landing". Afinal, se a política estava funcionando, como repetia o discurso oficial, por que subir a taxa de juros?, indaga o economista.
Reduzir a evasão de recursos do sistema financeiro pode ser uma das razões, afirma. Porém Michael acrescenta que a elevação dos juros poderá ter o efeito de atrair mais capital estrangeiro especulativo para a China, já que investir no sistema financeiro do país ficará mais lucrativo.
Esse movimento aumentaria a quantidade de dinheiro em circulação na economia e colocaria pressão sobre a atividade econômica, exatamente o oposto do desejado pelo governo, diz.


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