São Paulo, terça-feira, 30 de outubro de 2007

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Após atritos, Petrobras voltará a investir na Bolívia

Retomada de projetos na área de gás deve ser anunciada por Lula durante viagem a La Paz

Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência, confirma negociações e diz que "volta da Petrobras à Bolívia é mais que natural"

Eduardo Knapp - 14.dez.06/Folha Imagem
Operário em campo de gás operado pela Petrobras na Bolívia


ELIANE CANTANHÊDE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

O assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, confirmou ontem que o Brasil está negociando com o governo boliviano a retomada de investimentos da Petrobras para exploração de gás naquele país, apesar dos seguidos ataques do presidente Evo Morales contra a estatal brasileira.
A intenção é que o pacote seja fechado nas próximas semanas, para ser publicamente anunciado durante viagem do presidente Lula a La Paz, ainda em novembro.
Lula já esteve pelo menos duas vezes na Bolívia sob Morales, mas sempre em reuniões multilaterais. Uma delas foi para a posse de Morales, e a outra, para a Cúpula da Comunidade Sul-Americana de Nações, em Cochabamba. A visita do próximo mês será a primeira bilateral, de chefe de Estado, marcando uma espécie de reaproximação dos dois países.
A data certa da viagem de Lula ainda não está marcada, pois depende de acertos que vêm sendo feitos pelos dois governos, entre os ministros das Minas e Energia e entre a Petrobras e as empresas do setor que atuam na Bolívia, como a Total (França), responsável pelo campo de Itaú, alvo brasileiro.
Na semana passada, o ministro de Hidrocarbonetos da Bolívia, Carlos Villegas, veio ao Brasil para reunião com o ministro das Minas e Energia, Nelson Hubner, e com o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli. Depois do feriado de 2 de novembro, próxima sexta-feira, está prevista a ida de Hubner e Gabrielli a La Paz, para continuar as discussões e tentar fechar já o acordo que vai pautar a ida de Lula.

Sem surpresa
"Não há surpresa nisso. A volta da Petrobras à Bolívia é mais do que natural, depende apenas de condições reais de estabilidade para os investimentos no país. Não há e nunca houve razão idiossincrática para não investir mais lá", disse Garcia à Folha, confirmando informação publicada ontem no jornal "Valor Econômico".
A Petrobras mantém na Bolívia a exploração de gás nos campos de San Antonio e San Alberto, mas tinha refluído de fazer novos investimentos no país depois que Morales decretou a nacionalização das reservas de gás no país.
Ele denunciou contratos anteriores e retomou as refinarias brasileiras. No auge da crise, chegou a ocupar instalações da Petrobras com tropas do Exército. Além disso, preocupam o Brasil a instabilidade política e as ameaças de divisão do território boliviano em dois.
Durante todo o confronto, o Palácio do Planalto e o Itamaraty evitaram um tom agressivo e persistiram nas negociações com o governo Morales, sob o argumento de que a Bolívia é o país mais pobre da América do Sul, foi secularmente espoliado e tem direito de proteger o seu gás.
A retomada dos investimentos da Petrobras no país tem um caráter econômico e também político, porque o governo brasileiro analisa que, depois dos primeiros momentos de afirmação, Morales já está consciente de que o país precisa decisivamente de investimentos estrangeiros e da Petrobras, particularmente.

Crise política
Uma nova onda de investimentos da Petrobras na Bolívia seria um alívio para Morales, que enfrenta crise política cada vez pior em torno da paralisada Assembléia Constituinte e tem na nacionalização dos hidrocarbonetos seu principal feito dos 21 meses de um mandato tumultuado.
As novas regras para o setor de gás e petróleo fizeram a arrecadação do Estado se multiplicar. De US$ 600 milhões, em 2005, pulou para US$ 1,3 bilhão, no ano passado. Para este ano, a estimativa do Ministério da Fazenda é que o Estado receba US$ 1,7 bilhão.
O sucesso da nacionalização no aumento da carga tributária, por outro lado, inibiu ainda mais os investimentos do setor privado, que, aliás, estavam paralisados desde 2003 devido à instabilidade política do país.
Neste ano, já começou a faltar gás, e a primeira vítima foi a termelétrica de Cuiabá, que não recebe o combustível há mais de um mês, apesar das reiteradas promessas de Morales de que não haveria corte do fornecimento ao Brasil.
Com o crescimento do consumo interno e um ambicioso novo contrato com a Argentina para fornecer 27,7 milhões de metros cúbicos diários até 2010 (mais do que o dobro do envio atual), Morales corre contra o relógio para atrair investimentos e aumentar a produção.
Aparentemente, o líder boliviano já não espera muito da PDVSA, empresa estatal venezuelana, apesar das promessas de investimentos do aliado Hugo Chávez. Tampouco vê muito futuro nas negociações com o neoaliado Irã e com a gigante russa Gazprom.
Sem novos parceiros, a solução encontrada foi pressionar mais as empresas já instaladas, a começar pela Petrobras.


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