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LUÍS NASSIF
A epopéia do Ipen
Uma das mais fantásticas
experiências científicas
continuadas do país foi o esforço
para o desenvolvimento nuclear
brasileiro a partir dos anos 50.
Ainda está por ser escrita essa
epopéia, que contou com nomes
como Rex Nazareth, os físicos
Marcel Damy e Sérgio Porto, o
almirante Othon e outros heróis
quase anônimos da pesquisa
brasileira.
O programa brasileiro do setor teve início nos anos 50 com
as tentativas de construir reatores de água pesada, na base de
urânio natural menos enriquecido e potente. O mentor desse
programa foi o físico Marcel
Damy. O programa foi abandonado quando o país optou pelo
acordo nuclear com a Alemanha e pela transferência da tecnologia de enriquecimento do
urânio.
No início dos anos 80, o governo brasileiro decidiu abandonar o acordo com a Alemanha e
investir em um acordo nuclear
paralelo. E aí recorre ao grupo
de pesquisadores que, desde o
início dos anos 70, defendia
uma alternativa ao acordo. Participavam do grupo técnicos do
Centro Tecnológico de Aeronáutica (CTA), da Marinha, físicos da Unicamp.
O movimento era politicamente comandado por Rex Nazareth e cientificamente por Sérgio Porto. Acabou crescendo e
passando para a responsabilidade do CNEN (Conselho Nacional de Energia Nuclear), presidido por Rex, figura central
dessa história.
Quando se decide retomar as
pesquisas atômicas, o único órgão aparelhado para tal era o
Ipen (Instituto de Pesquisas
Energéticas e Nucleares), um
oásis de qualidade de gestão e
pesquisa em um setor que, em
geral, dispõe de muitos cérebros
e quase nenhuma gestão.
O Ipen havia sido criado em
1956, no governo JK, por meio de
um convênio da USP com o
Conselho Nacional de Pesquisa
e, nessa condição, administrou
o primeiro reator nuclear, que
entrou em operação em 1957 e
que, durante 40 anos, produziu
os mais diversos tipos de radioisótopos. Em 1970, virou autarquia estadual com a denominação de Instituto de Energia Atômico.
Em 1982, a estrutura do Ipen
foi alterada. Virou autarquia
associada à USP e vinculada à
Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado, mas operada pelo
Ministério de Ciência e Tecnologia, em vista de decreto que colocou toda a pesquisa nuclear
sob orientação direta do governo federal. Foi essa estrutura
que permitiu a continuidade de
gestão que faltou a outros institutos, garantindo-lhe o atual
padrão de excelência.
Com a formalização do ingresso da Marinha, o programa
ganhou fôlego. A Marinha aderiu ao programa por seu interesse na propulsão nuclear e aí toma vulto a figura do almirante
Othon Luiz Pinheiro da Silva
-miseravelmente fuzilado por
uma reportagem leviana de
uma revista, pouco tempo atrás.
Em 1982 se realizou no Ipen a
primeira experiência de separação isotópica de urânio com
uma centrífuga inteiramente
desenvolvida no país. Em 1987,
José Sarney, então presidente da
República, fez o anúncio formal
de que o Brasil finalmente dominava por completo o ciclo de
enriquecimento isotópico do
urânio. Toda a força científica
foi do Ipen e a engenharia de
projetos da Marinha.
No governo Collor, uma decisão impensada liquidou com as
pesquisas atômicas, quando o
país se preparava para as primeiras explosões pacíficas. Nem
se cuidou de avaliar que havia
outras aplicações para as pesquisas.
O Ipen perdeu o rumo e o retomou apenas no governo Fernando Henrique Cardoso,
quando redefiniu seu planejamento e passa a contar com recursos orçamentários estáveis. Neste ano, a produção do Ipen beneficiará 2 milhões de pessoas
em diagnósticos e tratamento de câncer.
Mas esse replanejamento eu conto em outra coluna, que o espaço desta acabou.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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