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Sem poder ter atividade remunerada, bolsista de pós ganha R$ 724; dedicação exclusiva dificulta a volta ao mercado
Carreira acadêmica revela OUTRO MUNDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Antes de optar por dar atenção
exclusiva a um mestrado ou doutorado, é preciso definir o plano
de carreira. Se a intenção é seguir
na vida acadêmica, vá em frente.
Mas, caso seja buscar um cargo
executivo, pense mais um pouco.
Muitos estudantes fazem os
cursos de pós logo depois da graduação e adiam a entrada no mercado, o que, segundo os consultores ouvidos pela Folha, dificulta
uma colocação posteriormente.
Para se manter, alguns conseguem bolsas de estudos, como as
fornecidas pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). O problema é que o bolsista fica impedido
de exercer qualquer atividade remunerada para ter esse benefício.
Se por um lado a atenção pode
ser exclusivamente voltada para a
pesquisa, por outro esses estudantes acabam ganhando pouco e
precisam adotar um "ritmo mais
lento" para o avanço na carreira.
"Essa questão é angustiante e
está entre os assuntos que vão ser
discutidos com a comunidade
científica, para tentarmos flexibilizar um pouco nas áreas em que
for possível", afirma Jamil Cury,
57, novo presidente da Capes.
Amargo regresso
Os alunos em dificuldades financeiras podem pleitear uma vaga no campus universitário ou
morar como hóspedes de amigos
nos alojamentos, como faz Valente Matlaba, 28. Formado pela
USP, o estudante faz mestrado em
economia na mesma instituição.
Às vésperas de se tornar mestre,
ele, que é bolsista da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), recebe R$ 724,52 mensais.
"É complicado. O valor é muito
baixo, mas ainda assim sou privilegiado. Tenho amigos que não
conseguiram a bolsa nem trabalho e estão em piores condições."
Afastar-se do mercado para
priorizar os estudos, como fez
Matlaba, pode se tornar um caminho sem volta, de acordo com a
diretora da KPMG Patrícia Molino, 36. "Se o profissional não tem
nenhuma experiência e dedicou-se só aos estudos, vai ser complicado empregá-lo no setor privado, a não ser que sua intenção seja
mesmo uma carreira acadêmica."
O engenheiro de produção Edson Ricardo Barbero, 27, reconhece as dificuldades. Bolsista do
CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Barbero faz mestrado
em administração de empresas na
USP. Ele participou de um programa de trainee logo que se formou, mas deixou a companhia
para dedicar-se à pesquisa.
"Embora queira me recolocar,
busco também ter vivência universitária. Vou mandar currículo
quando terminar o curso, mas sei
que o mercado está complicado."
Carreira acadêmica
Segundo determinação do Conselho Nacional de Educação, até o
ano que vem todas as universidades serão obrigadas a ter um terço
do corpo docente composto de
professores doutores e mestres.
Isso fez com que as instituições
públicas e privadas abrissem a
"temporada de caça" aos títulos e
com que a carreira acadêmica fosse mais valorizada que antes.
"Dependendo do professor, os
salários chegam a R$ 20 mil nas
escolas privadas. Mas a média para o profissional, inclusive com
doutorado, é de R$ 3.000 a R$
6.000", afirma Geraldo Moisés
Martins, 60, diretor-superintendente da Funadesp (Fundação
Nacional de Desenvolvimento do
Ensino Superior Particular).
Já nas universidades públicas,
os valores são mais modestos. A
tabela do MEC (Ministério da
Educação) mostra que o salário
de um professor de uma federal,
com 40 horas de dedicação exclusiva, varia de R$ 1.289 a R$ 4.859.
"O valor está bem defasado, e é
claro que o mercado paga muito
mais. Mas não abro mão das aulas
universitárias", diz José Domingues de Godoy Filho, 47, vice-presidente da Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior). Godoy
Filho, que dá aula de geologia na
Universidade Federal de Mato
Grosso, é mestre pela USP e faz
doutorado na Sorbonne, França.
Há quem tenha vivido os dois
mundos e hoje prefira a vida acadêmica, como Heloisa Figueiroa,
48, formada em estatística pela
USP. Ela fez pós-graduação "lato
sensu" e foi executiva de grandes
empresas como Grupo Pão de
Açúcar e American Express.
Há alguns anos resolveu mergulhar na teoria e ingressou em um
mestrado na Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado). Hoje dá aulas em um dos cursos de MBA da ESPM. "Muitas vezes no trabalho você não precisa
pensar, usa receitas prontas. Às
vezes me via moldada como um
bonsai."
(ANDREA MIRAMONTES)
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