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Fora do que se entende, o conhecimento não funciona
Deve-se estar preparado para perceber uma eventualidade, o que é diferente de uma previsão
Segundo Nassim Nicholas Taleb, para controlar riscos
é preciso lidar com o imprevisível e o aleatório. Seu
livro mais recente, "A Lógica do Cisne Negro - O
Impacto do Altamente Improvável" (ed. Best Seller,
R$ 39,90, 464 págs.), traz a teoria de que devemos reduzir a complexidade do sistema para controlar melhor os riscos. Taleb será um dos palestrantes da
ExpoManagement, que acontece entre 10 e 12 de novembro, no Transamérica Expo Center, em São Paulo.
Ele concedeu entrevista à Folha por telefone. Leia
trechos da conversa.
(ANDRÉ LOBATO)
FOLHA - O que o senhor vai falar
em sua palestra?
NASSIM TALEB - Eu digo às pessoas que não tenho nada a dizer
que não esteja em meu livro:
tentemos viver em uma sociedade muito menos frágil ao
erro humano. Depois da crise,
os economistas acham que a
entendem. Todos eles são
impostores. Eu vou dizer o que
já dizia antes.
FOLHA - Não mudou de opinião?
TALEB - Ao contrário. Entre em
meu site e veja o link "citações
que os imbecis escolheram ignorar" [no site, ele diz que já
havia afirmado em seu livro
que a concentração bancária
nos Estados Unidos potencializa riscos e que a empresa de hipotecas Fannie Mae está "sentada em um barril de dinamite"]. Isso é o que escrevi dois
anos atrás, antes da crise.
Vou apresentar minha visão
de como evitar outras crises,
como ter uma sociedade mais
resistente a esse tipo de problema. Isto é o que eu vou falar: os
operadores de mercado da Russia, do Brasil e do Líbano entendem problemas muito melhor do que os economistas
treinados nos Estados Unidos.
FOLHA - No Brasil sempre se diz
que é preciso fazer planos de negócio, colocar tudo no papel e seguir o
modelo americano de planejar. Mas
há resistência.
TALEB - Eles estão certos em
resistir. A maneira como as
pessoas conduzem planos aqui
[nos Estados Unidos] é estúpida. Planos de negócio não funcionam. Planejamento estratégico é bobagem. Funciona para
as firmas de consultoria, mas
não na realidade.
FOLHA - O que devem fazer, então?
TALEB - Devem operar com o
máximo de cautela e ser o mais
flexível que puderem.
FOLHA - Mas dizem-nos que temos
que fazer previsões.
TALEB - Previsões tornam as
pessoas bobas. Você deve estar
preparado para perceber uma
eventualidade, o que é muito
diferente de uma previsão. Se
não sei uma informação, o problema é de teólogos e físicos.
FOLHA - Além de ler o seu livro, o
que o senhor recomenda para que
as pessoas se preparem para o que
não sabem?
TALEB -
Vou dar muitas dicas. A
primeira é: não aceite conselhos de alguém usando uma
gravata; a segunda, aumente a
redundância no sistema. Estou
escrevendo um livro, "How to
Live in a World Without Understanding" ["Como Viver em
um Mundo Sem Compreensão"]. Você tem que fazer um
mapa do que compreende e do
que não compreende. Fora do
mapa, o conhecimento não
funciona. O conhecimento acadêmico é besteira fora do mapa.
FOLHA - Mas como saber o que não
sabemos?
TALEB -
Nós entendemos cassinos, não entendemos a aleatoriedade socioeconômica. Nós
entendemos como carros funcionam. Nós não entendemos
produtos financeiros complexos. Todos esses professores
acham que entendem a crise,
mas explodiram a sociedade. A
melhor coisa que posso fazer
pela sociedade é entrar em departamentos econômicos e demitir 90% dos economistas
aleatoriamente. Cada dólar que
se corta do financiamento dos
departamentos de economia
melhora a saúde da sociedade.
Eu tenho planos, mas esse seria
um começo muito bom.
FOLHA - Essa crise é um problema
criado por pessoas que acham que
sabem coisas que, na verdade, desconhecem?
TALEB - É exatamente isso. Algumas pessoas, como os médicos e os engenheiros, acham
que sabem muito, mas não são
tão perigosos. Mas há uma classe de gente que não sabe mais
do que motoristas: são os economistas. A questão não é que,
às vezes, achamos que sabemos
muito, é que, às vezes, não sabemos nada e achamos que sabemos tudo.
FOLHA - Saber o que não posso
fazer é melhor do que saber o que
posso?
TALEB - Exatamente. Isso se
chama conselho negativo.
Como se vive mais? Evitando
morrer. Mas, se você fala sobre
o dinheiro, as pessoas querem
conselhos positivos: como ficar
rico, como ser saudável -não
entendem que, evitando grandes erros, vivem mais.
FOLHA - É o mesmo para companhias? Elas deveriam reunir seus
melhores profissionais para decidir
o que não fazer?
TALEB - Sim. Mas deixe-me dizer: vá a uma livraria em São
Paulo e conte quantos livros há
dizendo "como perdi minha
fortuna"? Empiricamente, você aprende com o fracasso.
FOLHA - O senhor quer abolir o
risco na sociedade?
TALEB - Não. Quero controlar
melhor os riscos, é minha profissão. E parece que não há alternativa às mensagens que
proponho. Temos de diminuir
a exposição a cisnes negros
[imprevistos] negativos e maximizar a exposição aos positivos,
mas faz-se o contrário.
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