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São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2003

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MEDO DO TRABALHO

Segundo a OMS, 17,8% dos brasileiros devem manifestar, algum dia, transtornos fóbico-ansiosos

Ansiedade e fobias assustam empregados

Fernando Moraes/Folha Imagem
Murilo Serrano (sentado), que evita falar em público e tem colega que faz apresentações por ele


BRUNO LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Medo de fazer o próprio trabalho. Parece mentira, mas foi o que sentiu a psicóloga Maria Alice Prado, 43, depois de ter, há dez anos, uma crise de pânico. Ela era gerente de RH (recursos humanos) de uma grande empresa, coordenava dinâmicas de grupo e fazia entrevistas de recrutamento.
"Tinha passado por um estresse absurdo." Antes da crise, conta, recrutou 450 pessoas e montou o RH de nove unidades da empresa. Seu pavor era ter outra crise e passar mal perto de candidatos e de colegas de trabalho. Pensava que, se ficasse em ambientes fechados, não seria socorrida, recorda.
"Eu estava o tempo todo com pessoas, e era exatamente o que me incomodava." Já que não se sentia capaz, começou a delegar funções a subordinados. Temia que a chefia pensasse que o que sentia não passava de "frescura".
De acordo com os médicos, não é pequeno o número de profissionais que, como Prado, sofrem com transtornos relacionados a fobias e ansiedade sem saber que estão doentes, temendo que o problema lhes custe o emprego e, pior, sem buscar tratamento.
No Brasil, os chamados transtornos mentais fóbico-ansiosos, segundo estudos da OMS (Organização Mundial da Saúde), manifestam-se ao longo da vida de 17,8% das pessoas. A ocorrência de fobias na população mundial seria de 10%, de acordo com estimativas norte-americanas.
Grande parte das fobias aparece no local de trabalho, afirmam os especialistas. O motivo é simples: é no emprego que, em geral, o profissional enfrenta o estresse e as outras emoções capazes de desencadear fobias e doenças como a síndrome do pânico, caso haja predisposição para o problema.
Embora não sejam causados por essas emoções, as fobias e os outros distúrbios ansiosos, dizem médicos e psicólogos, são potencializados por esses sentimentos e podem ter neles o seu gatilho.

Porta-voz
O analista de sistemas Murilo Serrano, 36, diretor-executivo de soluções de infra-estrutura de uma multinacional de eletrônica, conta que, desde o ano 2000, passou a experimentar sintomas típicos de fobia social. Ele diz que sempre havia lidado com clientes e que fazia apresentações sem problemas. Aos poucos, entretanto, passou a evitar essas situações.
"Foi se tornando um sofrimento grande pra mim. Começou como ansiedade nos momentos anteriores [ao compromisso], depois apareceu nos dias anteriores e, por fim, mesmo antes de assumir o compromisso. Eu dava sempre um jeito de escapar."
Hoje, em tratamento, diz que está "bem melhor", mas revela que ainda sente desconforto ao falar em público. No escritório, tem um colega de trabalho que assume por ele as apresentações. Serrano fica ao lado, para dar suporte e complementar as informações.
A "solução" encontrada pelo executivo não é a mais indicada, na opinião dos médicos. Nesses casos, a recomendação é procurar apoio logo, justamente para não se adaptar à situação. Para quem tem fobia de elevador, por exemplo, o pior a fazer seria acostumar-se a subir as escadas.

Tratamento
Mas a melhor prova de que há como se tratar é a possibilidade de acabar se consultando com uma psicóloga especialista no assunto: Maria Alice Prado, a mesmo do início da reportagem.
Encarando de frente o problema, ela fez tratamento com psicoterapia e diz ter atingido a cura. Depois, especializou-se em síndrome do pânico e voltou todo o seu trabalho para o tema. Criou até o projeto Katavento, iniciativa que tem como objetivo ajudar pacientes a entender a doença.


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