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entrevista
MAURÍCIO SERVA
"Carga de trabalho, além de pressão
pelo sucesso, são fatores importantes
que levam o profissional à doença"
Vício em trabalho é gerado por exigência corporativa
ANDRESSA ROVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Trabalhar mais do que se
gostaria é reclamação recorrente no universo corporativo.
Tanto que se dedicar ao trabalho a ponto de torná-lo compulsivo é um fenômeno que,
aos poucos, ganha atenção.
Para Maurício Serva, 50, professor da UFSC (Universidade
Federal de Santa Catarina), um
novo elemento entra em jogo:
as exigências organizacionais
tornaram-se fatores determinantes no desenvolvimento da
doença -contrariando a idéia
de que o transtorno é só fruto
de uma predisposição psíquica.
Tema ainda pouco explorado, o "workaholicismo" sofre
de um preconceito às avessas:
é, em geral, bem-visto por empregadores e colegas. Serva,
que estudou o tema em parceria com o pesquisador Joel Lincoln Ferreira, falou à Folha.
FOLHA - Pode-se considerar o
"workaholicismo" uma doença?
SERVA - Sim. É um distúrbio de
ordem psicossocial que leva o
indivíduo a trabalhar excessivamente, numa espécie de "vício" do trabalho.
FOLHA - O que leva um profissional
a trabalhar mais do que deveria, a
ponto de ficar doente?
SERVA - Vários fatores já foram
detectados. Os estudos iniciais
sobre o fenômeno se concentravam nos fatores psicológicos, indicando causas como a
predisposição psíquica de certos indivíduos para desenvolverem essa patologia.
Sem negar fatores psicológicos, o estudo chama a atenção
para o contexto histórico, ressaltando dimensões sociais,
econômicas e organizacionais
que agem sobre o indivíduo.
Assim, exigências organizacionais tais como aceitação ao
risco, flexibilidade, resultados
em curto prazo, ritmo e carga
de trabalho, além de pressão
pelo sucesso, são fatores importantes que levam o profissional à doença.
FOLHA - Por que, na sua opinião, o
"workaholic" é mais tolerado socialmente do que outros viciados?
SERVA - Porque vivemos numa
sociedade em que o produtivismo, a competição e o individualismo são alçados à condição de
valores que devem ser cultuados e concretizados. São diversas implicações: tendência ao
aumento de neuroses, frustração, crise de sentido para a vida.
FOLHA - Quais são os sintomas?
SERVA - Todos os profissionais
entrevistados tiveram implicações em menor grau (esgotamento físico e mental, enxaquecas) ou em maior grau (enfarto, úlcera, distúrbio do sistema imunológico). Alguns incorporaram atitudes que praticamente os excluem dos outros
segmentos sociais ou familiares, demonstrando, inclusive,
não saberem como viver nos
demais espaços sociais.
FOLHA - Como isso influencia o trabalho de seus subordinados?
SERVA - De várias formas. Por
exemplo, ao elevar os graus de
exigência com prazos e de perfeição no cumprimento das tarefas. Sem falar no incômodo
de ter um superior hierárquico
acometido de anomalia que o
leva a apresentar ações, de certa forma, desequilibradas.
FOLHA - Podemos estimar quantos
brasileiros sofrem da doença?
SERVA - Infelizmente, não, pois
estudos de natureza quantitativa ainda não foram realizados.
FOLHA - O sr. acredita que esse número esteja aumentando?
SERVA - Acredito piamente.
FOLHA - O que é preciso fazer?
SERVA - Precisamos compreender melhor o fenômeno
em si. O aumento de "workaholics", como o de outras patologias sociais, acaba por se constituir um caso de saúde pública.
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