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São Paulo, domingo, 13 de abril de 2003

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ESTRESSE

Segundo estudo, 61% dizem receber ordens incompatíveis de mais de dois superiores

Chefes dema is causa m crise nas equipes

Fernando Moraes/Folha Imagem
Com estresse diagnosticado, Maria Adrião optou pela demissão para fugir da "demanda múltipla'


TATIANA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Se um chefe nem sempre é bom, dois ou três já podem ser demais. No trabalho, quanto mais superiores existirem para o mesmo funcionário, mais chances ele terá de desenvolver doenças físicas ou psíquicas decorrentes do estresse.
Essa é uma das conclusões de uma pesquisa inédita realizada pela Isma-BR (International Stress Management Association) com 230 profissionais em nível de gerência. Desse total, 61% declararam receber solicitações incompatíveis de duas ou mais pessoas.
Cada vez mais comum, o "conflito de papéis" é um sintoma alarmante, dizem os especialistas. Com o enxugamento dos quadros, o antigo modelo de hierarquia vertical foi abandonado. O problema é que, no novo organograma "horizontal", as pessoas estariam cada vez mais confusas sobre suas tarefas e prioridades.
"À deriva, o profissional desenvolve reações emocionais negativas, como medo e angústia. Instalam-se disfunções psicológicas e comportamentais, e ele se torna um forte candidato a problemas de saúde", explica a presidente da Isma-BR, Ana Maria Rossi, que vai promover, em junho, um congresso sobre estresse e qualidade de vida (www.ismabrasil.com.br/congresso).

Vontade de morrer
Na opinião de Mário Sérgio Cortella, 49, filósofo e consultor organizacional, as mudanças enfrentadas pelo mundo corporativo estão acontecendo em uma velocidade "superior à da percepção humana". "A reorganização dos quadros se dá muito rapidamente. A demanda múltipla reduz as chances de renovação de energia, e o risco de colapso mental e físico é redobrado", afirma.
Ex-funcionária de uma multinacional, Clara (nome fictício), 32, experimentou esse colapso. Após ter diagnóstico de estresse, ficou impossibilitada de trabalhar, perdeu a capacidade de concentração e teve de recorrer a auxílio médico para poder fazer o caminho de volta.
O ambiente de trabalho era o ilustrado pelo ditado "muito cacique para pouco índio", diz ela. "Éramos três funcionários para atender a cinco chefes que mal conversavam entre si. Confusão e frustração eram a regra", conta.
Durante quatro meses, ela "tentou suportar" para não perder o emprego. Mas, da ansiedade e da angústia para as crises de pânico, foi um pulo. "Cheguei a um estágio em que a vida perdeu o sentido. Só tinha vontade de morrer."

Ciúme
No caso de Clara, as consequências do estresse foram distúrbios psíquicos. Mas não são raros os casos em que a somatização do conflito gera problemas físicos.
Três chefes que mantinham entre si uma relação marcada pelo ciúme foram o principal fator para uma série de disfunções fisiológicas sofridas pelo diretor comercial Alberto (nome fictício), 32.
"As cobranças eram incompatíveis. No começo eu chegava em casa tão irritado que chutava meu cachorro. Depois comecei a ter problemas de pressão", conta.
Foi uma bola de neve. Em meio ao fogo cruzado da tripla chefia, Álvaro foi um dia surpreendido por um aviso de demissão dado por um dos superiores, justamente quando concluía um plano de vendas solicitado por outro. No dia seguinte, um derrame paralisou o lado direito do seu rosto.
Assustados, os chefes adiaram a demissão em mais de um ano. Os problemas hormonais e cardíacos de Álvaro permaneceram.
Na maioria dos casos, o medo de perder o emprego é um dos agravantes do quadro, de acordo com o psicólogo do trabalho Waldir Bíscaro, 69. "Só acentua o estresse. Se a decisão é ficar, é melhor "se fingir de morto'", ensina.
Maria Adrião, 26, não conseguiu. Para ela, pedir demissão de uma empresa do ramo alimentício foi "um gesto de libertação".
"Recebia ordens de várias pessoas ao mesmo tempo e era cobrada de tarefas para as quais não havia sido contratada. A sensação era de esgotamento." O estresse levou-a à decisão: "Pedi as contas. Foi um alívio sair de lá".



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