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ENTREVISTAS RICARDO ANTUNES E FERNANDO TEIXEIRA DA SILVA
Para historiador e sociólogo, trabalhador deixou de ser ator e se tornou mero espectador
Espetacularização é evidente no 1º de Maio
Na física, o trabalho é calculado multiplicando-se a força aplicada pelo deslocamento obtido. Nas ciências humanas -como sociologia, história e antropologia-, o
conceito envolve muitas outras variáveis.
Globalização, movimento sindical, terceirização da mão-de-obra, instrução,
desemprego e salário mínimo são apenas
algumas das questões que dizem respeito
ao trabalhador, classe lembrada nesta semana no 1º de Maio, o Dia do Trabalho.
Para discuti-las, a Folha entrevistou
Ricardo Antunes, professor de sociologia do trabalho, e Fernando Teixeira
da Silva, pesquisador em história social
do trabalho -ambos da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
DIOGO BERCITO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
FOLHA - Comparando o Dia do Trabalho hoje e quando foi implantado
oficialmente, em 1924, o que há de
novo?
RICARDO ANTUNES - A partir da
década de 1990, as centrais começaram a converter o 1º de
Maio em um dia de comemorações, e não de luta. Passou a ser
mais uma disputa entre a CUT
(Central Única dos Trabalhadores) e a Força Sindical.
FERNANDO TEIXEIRA DA SILVA - Assim como no passado, hoje o
Dia do Trabalho continua tendo significados diversos. De
maneira geral, pode-se observar a transformação cada vez
mais nítida da data em espetáculo. É agora uma data oficial
do governo e os trabalhadores
acabam sendo mais espectadores que propriamente atores.
FOLHA - O movimento sindical está
enfraquecido?
ANTUNES - A classe trabalhadora foi terceirizada e o desemprego foi muito acentuado.
O próprio neoliberalismo tem
embutido dentro dele o princípio de demolir o sindicato combativo. Há uma política anti-sindical por parte do Estado em
relação aos sindicatos mais críticos. Ao mesmo tempo, existe
uma política de cooptação de
alguns sindicatos, que aceitam
a nova condição de se tornarem
servos do Estado.
TEIXEIRA DA SILVA - Ao longo dos
anos 1990, os sindicatos foram
enfraquecidos em todo o mundo. Hoje, têm de enfrentar os
desafios típicos da globalização. É cada vez mais difícil pensar em atuação dessas entidades somente em fronteiras nacionais, sem levar em consideração que há uma série de direitos desrespeitados que ultrapassam barreiras locais.
FOLHA - Como a terceirização afeta
o trabalhador?
ANTUNES - A terceirização fragmenta, divide e diferencia os
trabalhadores. São ganhos econômicos e políticos para o empresário, nenhum deles positivo para o trabalhador.
TEIXEIRA DA SILVA - Terceirização
é um eufemismo para flexibilização, eliminação de direitos.
Você cria uma parafernália
de novas práticas de contratação sob um argumento totalmente falso de que haverá aumento no número de vagas.
O resultado é a diminuição
de salários e de direitos. É uma
forma de pulverizar as relações
de trabalho e golpear os sindicatos, já que boa parte dos terceirizados não faz parte das organizações de classe.
FOLHA - A instrução dos trabalhadores vem aumentando?
ANTUNES - Sim. O mercado de
trabalho é uma selva e, se você
tem qualificação, a sua chance
de conseguir emprego é um
pouco maior. Mas às vezes se
trata de uma qualificação tecnicamente desnecessária -um
banco, por exemplo, poderia
contratar trabalhadores do ensino médio que supririam as
necessidades de algumas funções. No entanto, pedem engenheiros, economistas ou sociólogos. Por quê? Como há excesso de trabalhadores, é
possível elevar a exigência,
mesmo pagando menos.
TEIXEIRA DA SILVA - O trabalhador
hoje não é mais aquele operário
vestindo macacão. Há mais
preocupação com instrução,
mas, ao mesmo tempo, é preciso levar em consideração
que há especializações que se
tornam obsoletas rapidamente.
Assim, o estudo formal acaba se
tornando obsoleto.
FOLHA - O que o trabalhador tem
para comemorar no próximo 1º de
Maio?
ANTUNES - Tem pouco. O admirável mundo do trabalho hoje
mais se parece com o abominável mundo do trabalho. Não é
preciso celebrar nada, mas
pensar, diante desse cenário
adverso, quais são os caminhos
para lutar pelos seus direitos.
TEIXEIRA DA SILVA - O Dia do Trabalho é um bom momento para
revitalizar a memória do trabalhador. É preciso olhar para
trás, refletir sobre o passado
para pensar o presente.
Mas são só os trabalhadores
que precisam decidir o que devem comemorar ou não. Não
cabe mais aos intelectuais a definição do que deveria ou não
ter sido feito. Não precisam de
ninguém para dizer o que deveriam ou não comemorar.
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