São Paulo, domingo, 31 de outubro de 2004

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BASTIDORES DA RECOLOCAÇÃO

Após incluir dados em sites de recolocação, 76% recebem ligações de outras consultorias

Currículo on-line facilita golpe do emprego

ANDRESSA ROVANI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O que todo desempregado espera é que o telefone toque. Mas atendê-lo é cada vez mais arriscado. Do outro lado da linha, pode estar alguém que se diz "head- hunter" (caçador de talentos) repetindo um texto decorado: "Tivemos informações sobre você no mercado e temos uma vaga exata para o seu perfil. Vamos marcar uma entrevista com urgência".
É um dos sinais do golpe. A proposta é tentadora, o potencial empregador "adorou" o profissional, e a contratação será imediata. Mas, após o pagamento pelo serviço (outro sinal de alerta, já que os verdadeiros "head- hunters" são pagos pelas contratantes e não pelos profissionais), o "quase empregado" não é chamado para trabalhar.
Segundo levantamento feito pela Folha com pessoas que caíram ou quase caíram no golpe, 80% receberam o telefonema. Dessas, 76% tinham incluído recentemente seus currículos em sites de grandes empresas de recolocação.
Anselmo Zacaria Portes, 25, diz que recebeu ligação da Marca RH dias depois de se cadastrar em um site de empregos. Perdeu R$ 300. "Não tenho dúvida de que me escolheram a partir do banco de dados do site. Me senti enganado duas vezes: ao assinar o contrato e quando ouvi que esperar [pela vaga] fazia parte do processo."
A Folha tentou contatar a Marca RH, mas, até o fechamento da edição, ninguém atendia o telefone presente no site da consultoria.
O tradutor G.L., 48, que prefere não se identificar, diz que foi enganado por dez consultorias depois de cadastrar seu currículo em sites. O prejuízo total foi de R$ 10 mil. "Você fica desesperado e sempre acha que vai dar certo."
A economista carioca Janaína de Lima Carvalho, 30, só se deu conta de que tinha caído em uma armadilha quando saiu da Interview RH, em São Paulo. "Foi quando reli o contrato." Após se cadastrar no site da Manager, ela recebeu uma ligação. Na entrevista, questionou o valor a pagar (R$ 700). A resposta: "Não tirei você do Rio à toa". Ela perdeu o dinheiro e o que gastou com a viagem.
André Chede, advogado da Interview RH, confirma que a empresa procura currículos em sites. "Não vou dizer que não fazemos. Mas não é crime, já que pesquisamos em sites de acesso gratuito. Qualquer um pode ligar para ele."
Para a advogada do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) Maíra Feltrin, o cliente é a parte vulnerável no processo. "Dados do consumidor não podem ser passados adiante sem o conhecimento dele."
O diretor-executivo da Manager Online, Leandro Idesis, diz que a tecnologia é segura. "A consultoria só consegue ter acesso aos currículos ao se cadastrar falsamente como empresa. Estamos sempre correndo atrás delas e tirando-as do site."
"É impossível evitar a disponibilização dos dados de contato dos clientes, pois o convite para a entrevista [verdadeira] se dá por esse meio", justifica o diretor-geral do Grupo Catho, Adriano Arruda. "Mas só empresas inspecionadas têm acesso aos currículos".
A Catho é ré em processo aberto em 2002 pela Curriculum, pela Manager e pela Gelre por "furto" de dados. A Catho diz que está segura de que ganhará o processo, já que não fez nada de errado.


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