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Rosely Sayão

O limite do apego

Filhos precisam ser prioridade, mas priorizá-los não significa se dedicar exclusivamente a eles

"Você é mãe o suficiente?" Foi com essa frase provocativa ao lado de uma foto que mostra uma jovem mãe amamentando seu filho bem crescido -mais de três anos- que a revista "Time", uma prestigiada e conhecida publicação semanal dos Estados Unidos, chamou a atenção para um tema dos mais polêmicos.

O assunto da capa da revista não se restringiu ao tempo de amamentação do filho. O tema explorado tratou dos princípios da teoria de um médico de lá que afirma que criar os filhos com muito apego promove a formação de pessoas confiantes e seguras.

Segundo o médico Bill Sears, criador dessa teoria, a mãe deve passar o maior tempo possível com os filhos, estender o tempo da amamentação e dormir com os pimpolhos na mesma cama, entre outras coisas. Temos um bom assunto, não temos?

E podemos começar com a ideia do apego. Tal palavra quase sempre aponta para um excesso, não é verdade? E, por falar em excesso, muitas mães hoje já têm uma relação de proximidade excessiva com seus filhos. Sabem de tudo -tudo mesmo- da vida dos filhos, declaram seu amor a eles o tempo todo, beijam e abraçam com uma frequência que incomoda até os filhos etc.

E não é um fato curioso que justamente essa geração que tem tanta proximidade com seus filhos sofra de uma culpa permanente em relação a eles? Aparentemente, essas mães nunca conseguem realizar o que acham que deveriam na maternidade.

O médico Bill Sears parece ter conseguido concretizar a fórmula ideal que habita o imaginário dessas mulheres: ser mãe é se dedicar completamente ao filho.

Será que isso faz bem aos mais novos? Muitos afirmam que não e já temos alguns indícios: a geração que passou a ser criada dessa maneira mostra ter falta de maturidade e de autonomia quando termina a adolescência. Que, por sinal, parece não terminar nunca!

A dedicação aos filhos precisa, é claro, ser a prioridade na vida da mulher. Mas priorizar os filhos não significa se dedicar única e exclusivamente a eles. Significa estar disponível quando eles precisam -e não quando eles querem-, saber que educar supõe quase sempre desagradar os filhos e aguentar o sofrimento inevitável que a vida impõe às crianças, por exemplo.

E priorizar o filho significa também -e esse é um ponto delicado no mundo contemporâneo- que o tempo, mesmo que pequeno, dedicado a ele não pode ser interrompido por nada.

Um outro ponto que quero comentar hoje a respeito do tema é o tempo da amamentação. Temos inúmeros estudos e pesquisas que mostram que a criança amamentada por mais tempo cresce fisicamente mais saudável. Mas saúde é um conceito complexo que não se refere apenas ao aparato biológico.

A amamentação não alimenta apenas o corpo do bebê: alimenta também o tipo de relacionamento da criança com sua mãe, relacionamento esse que não conhecemos totalmente e que pode produzir os efeitos mais variados.

Dormir na mesma cama que a mãe e ser amamentada no peito por anos são situações que podem confundir a criança na compreensão de seu lugar de filho. E isso terá reflexos em sua saúde mental. Quais tipos de reflexo que podem surgir é o que não sabemos.

"Você é mãe o suficiente?" é uma pergunta que tem estado no ar faz tempo. Tempo suficiente para provocar culpas que são vividas como reais por muitas mulheres, mas que, de fato, são produzidas por esse mercado que vende de tudo, inclusive ideias. Como bons consumistas, compramos quase tudo que nos é ofertado, não é verdade?

ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

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