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foco nele
Consultor médico é novo especialista
KÁTIA FERRAZ
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Surge um novo especialista na medicina: o consultor médico. O conceito, criado nos Estados Unidos, está sendo introduzido no Brasil pelo médico Antonio
José Sproesser, 49, supervisor do Centro
de Terapia Intensiva da disciplina de clínica médica do Hospital São Paulo, da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e membro da equipe do hospital
Albert Einstein.
De volta ao país após uma longa temporada nos EUA, onde atuou como diretor médico e pesquisador do Institute of
Critical Care Medicine, em Palm Springs,
na Califórnia, Stroesser defende que o
médico tem de tratar o doente, não a
doença. "A medicina é como um sacerdócio, e temos de tratar os doentes como
seres humanos. Um médico tem o dever
de ser humano, dócil, amigo, carinhoso
com o paciente e com a família." Leia entrevista abaixo.
Folha - O que é um consultor médico?
Sproesser - Consultor médico ou "medical adviser", como chamamos nos Estados Unidos, é uma especialidade que
está crescendo, presente na maioria dos
hospitais universitários e grandes hospitais americanos. Esse médico, que é chamado pela família do paciente ou pelo
próprio hospital, acumula uma grande
experiência em unidades de terapia intensiva (UTI), trauma e urgência, o que
lhe permite dar um diagnóstico rápido e
preciso em casos mais graves. Além disso, um consultor médico tem de estar
disposto a conversar com o paciente ou
com os seus familiares sem pressa - durante horas, se for necessário. Até mesmo
de madrugada, na casa do doente.
Folha - Sua atuação é parecida então com
a de um médico de família?
Sproesser - Sim, mas o consultor médico
não precisa conhecer a família. Seu diagnóstico é feito com base em sua experiência e sua especialização.
Folha - Que tipo de formação deve ter o
consultor médico?
Sproesser - O consultor médico tem de
ter uma base clínica grande, mas seu
principal diferencial é a grande experiência adquirida em UTI e emergências. Formamos o consultor médico unindo o conhecimento clínico e a experiência adquirida nessas áreas. Ele é um médico
que trata o doente, não a doença, e também desenvolve um trabalho preventivo
muito importante durante as cirurgias,
conferindo a realização de testes, exames
e procedimentos específicos para aquele
paciente.
Folha - O que o senhor quer dizer com tratar o doente, não a doença?
Sproesser - Eu defendo muito a humanização da medicina. O médico intensivista, ou seja, que trabalha na UTI, deve
checar os aparelhos, mas não pode esquecer o paciente. Em muitas UTIs, o ser
humano é o último a ser olhado. Muitos
médicos, pensando que o paciente está
dormindo ou sedado, conversam sobre
seu estado de saúde em voz alta, ao lado
do leito, o que causa um prejuízo psicológico muito grande, além de ser um desrespeito com aquele ser humano.
Folha - O senhor está divulgando esses
conceitos aqui no Brasil?
Sproesser - Sim. Estou iniciando esse
treinamento com os residentes da Unifesp. Quero conscientizar esses residentes de que o doente é diferente da doença,
de que é preciso mexer no paciente, descobrir o que está acontecendo individualmente.
Folha - Esse é o primeiro passo para a formação de consultores médicos?
Sproesser - Exatamente. Claro que, para
chegar a ser consultor, o médico ainda terá de passar por muitas especializações e
pela experiência no atendimento de urgência. Mas não basta atender. O médico
tem de passar pela experiência de deitar
na cama da UTI, sem relógio, perdendo
literalmente a noção do tempo, procurando sentir o que o doente sente. Mas, a
partir do treinamento que estamos oferecendo agora, os novos médicos já sairão
da residência com uma nova consciência
do que é a humanização da medicina.
Folha - Isso é possível no Brasil?
Sproesser - Nesse treinamento que estou implantando, nunca deixo ninguém
falar de doença perto do paciente. Ressalto a importância de ir à casa do doente, verificar se tem algum problema social e analisar o problema como um todo.
Esse tipo de consciência tem de começar
nas escolas de medicina. Infelizmente, algumas escolas no Brasil chamam um clínico de consultório, em início de carreira, para ser professor de clínica médica.
No Hospital São Paulo, onde estou dando essa abordagem humanística, funciona, no 5º andar, o Centro Alfa, montado
com recursos do Banco Real. Lá, existem
dez salas com ar-condicionado, computadores e equipamentos de última geração, e os pacientes são atendidos com essa nova filosofia. São doentes vindos do
Hospital São Paulo e até mesmo da rua e
que são tratados como nos consultórios
particulares.
Folha - Os convênios médicos cobrem o
atendimento de um consultor médico?
Sproesser - Ainda não existe esse termo
no Brasil, mas as pessoas podem procurar como interconsulta, que é uma consulta médica feita por um profissional
gabaritado. Ainda não existem muitos
no Brasil, mas a tendência é aumentar.
Acaba sendo lucrativo também para os
convênios, uma vez que essa prática reduz o índice de internações hospitalares.
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