São Paulo, terça-feira, 02 de novembro de 2010
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ROSELY SAYÃO

COM QUE ROUPA?


As chamadas boas maneiras foram abrandadas, depois criticadas e, por último, esquecidas


UMA ESCOLA promoveu reunião para os pais de alunos que terminam o ensino fundamental este ano e iniciam, no próximo, o ensino médio.
Um dos temas abordados e que gerou grande interesse na discussão foi a não obrigatoriedade do uso do uniforme para esse ciclo.
O argumento da escola para liberar a presença dos alunos nas aulas sem o uniforme foi o de que, nessa idade, os jovens preferem usar roupas informais.
Já alguns pais pediam seu uso por uma questão de economia apenas.
Esse tema me lembrou dois fatos. O primeiro foi a conversa que tive, pouco tempo atrás, com uma executiva de empresa multinacional que lidera uma jovem equipe. Ela contou, na época, que enfrentava uma situação bastante constrangedora para ela: ter de falar com seus funcionários a respeito das roupas que eles não deveriam usar no ambiente de trabalho, por serem inadequadas. Aliás, vários diretores de escola e coordenadores já tiveram de fazer o mesmo com alguns professores.
O outro fato foi a observação que fiz em horários de entrada ou saída de escolas de ensino médio.
As roupas que alguns alunos usam são próprias para a praia, para o período de férias ou mesmo para uma reunião entre amigos. Vemos até garotas vestidas com roupas provocantes, extremamente curtas e decotadas.
Que tipo de roupa usar em determinadas situações? Como se comportar em diferentes locais da comunidade?
Qual o tom de voz apropriado para uma breve troca de ideias com o colega na sala de um cinema etc.?
Os manuais de boas maneiras ou de etiqueta já não fazem o mesmo sucesso experimentado décadas atrás, e perguntas como essas já não têm respostas únicas.
E agora?
Com mudanças velozes nos costumes, no comportamentos e nas regras, e a introdução na vida cotidiana de novos hábitos como o uso do telefone celular, por exemplo, são tamanhas transformações na convivência social que as chamadas boas maneiras foram inicialmente abrandadas, depois duramente criticadas para, em seguida, serem esquecidas.
Agora, entretanto, têm sido evocadas em diversos ambientes e por várias instituições. Famílias e escolas, por exemplo, têm se debruçado sobre essa questão.
É compreensível: num momento em que vivemos uma crise de civilidade, a cortesia, a gentileza, o respeito e a polidez no trato com o outro parecem ser bons remédios para acalmar a generalizada grosseria e a agressividade reinante nos relacionamentos interpessoais.
Precisamos reconhecer que já não é mais possível apontar maneiras únicas de se portar na relação com os outros, nos mais diversos locais e situações.
Ao mesmo tempo, precisamos também considerar que a vida pública e os relacionamentos sociais precisam ser mediados por algumas normas e essas sempre estão referenciadas a alguns princípios e valores.
Pensar no uso ou não do uniforme na escola considerando apenas a preferência juvenil ou os gastos familiares é ignorar que os mais novos precisam conhecer os valores e princípios que escolhemos para construir o presente deles e, logo, o nosso futuro.
Mas será que a maneira como nós temos conduzido esse processo irá permitir que eles façam escolhas bem informadas? Pelo depoimento da executiva citada antes e pelo ainda recente "caso Geisy Arruda", parece que não.


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)


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