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s.o.s. família rosely sayão
Pais dão limites demais e respeitam pouco
Discutir a educação é sempre muito estimulante, já que é principalmente por ela
que preparamos o futuro. Mas, vira e mexe,
volta aquela velha história de que nossas
crianças e jovens não têm limites, e parece que
esse é nosso maior -se não único- problema na educação. Ora, se faz tempo que ouvimos essa frase e as coisas continuam na mesma, é sinal de que precisamos problematizar a
questão e olhar de uma outra ótica. Afinal,
qual educador -pai ou professor- não quer
praticar uma educação que dê melhores frutos? Todos querem e, se dar limites fosse algo
simples, não teríamos tantos problemas.
Importante é lembrar que, para impor limites, é preciso exercer autoridade. Desde o início do mundo moderno, vivemos uma crise de
autoridade, e não foi a escola -muito menos
a família- que a originou. Ao contrário: pais
e professores arcam com o fato. Assumir a autoridade sendo mãe, pai ou professor, portanto, não tem sido nada fácil. Mas é possível.
Colocada essa questão, podemos começar a
pensar os limites de outra forma. Será que
nossas crianças não têm limites em demasia,
ao contrário do chavão que vem sendo exaustivamente repetido? Vejamos as crianças com
menos de sete anos, que vivem a primeira parte da infância. Nessa idade, tudo o que a criança precisaria é de tempo, espaço e liberdade
para construir sua identidade, reconhecer-se e
aprender a respeitar-se, conviver com outras
crianças com respeito e aprender a proteger-se do meio, a cuidar-se. E o que temos oferecido a elas? Limites, limites e mais limites.
Elas não têm espaço para explorar o mundo,
o tempo é tomado por atividades programadas pelos adultos, elas nem sequer têm a liberdade de fazer do que gostam pelo tempo que
querem. Não conseguem ficar quietas e sozinhas, brincando só com o pensamento e a imaginação. Sempre há um adulto mediando
a relação da criança com o meio, com suas
tentativas -muitas vezes desastradas- de
alcançar a autonomia. Assim, é compreensível
que ela reaja negativamente quando se defronta com um limite vital, imposto por pais ou professores. Afinal, não respeitamos essa
etapa da infância, em que o mais importante
na vida é brincar, mas queremos que a criança
respeite os limites da vida mesmo assim. Mas
será possível que seja diferente já que essa é a
nossa vida? É possível e talvez seja da escola de
educação infantil a maior responsabilidade.
Como se estruturou essa escola? Da mesma
maneira que a escola de ensino fundamental:
em turmas de mesma idade, com organização
seriada -maternal, jardim etc.-, com atividades programadas o tempo todo. O que varia de escola para escola são as brincadeiras, a forma de os professores se relacionarem com as
crianças e colocarem os limites, por exemplo.
Mas crianças de menos de sete anos precisam
de uma vida bem diferente.
Há uma escola aqui em São Paulo, a Tearte,
dirigida por uma grande educadora -a Thereza Pagani, chamada de "Therezita" ou de "Tê" pelas crianças- que se propõe a respeitar a criança dessa idade e permitir que ela se organize do seu próprio jeito, sem impor limites desnecessários. Dessa maneira, os limites
inevitáveis são aceitos mais facilmente.
As crianças, de zero a sete, brincam à vontade num espaço livre repleto de estímulos e riscos também, é claro. Não são separadas por
idade, não há classes, não há atividade obrigatória, muito menos rotina estabelecida com rigidez. Os professores -sempre há pelo menos um homem na função- acompanham as
conquistas que a criança faz nesse espaço e a
convidam para atividades. Resultado? Crianças tranquilas -com vivacidade, mas sem excitação-, que convivem em harmonia, se respeitam e respeitam os outros e o ambiente.
"Therezita", aos 71 anos, dirige essa escola
há 30. É respeitada porque impõe os limites
necessários. Não é maravilhoso saber que essa
prática educativa existe, é possível e dá certo?
A criança que passa por um processo desses
na primeira infância recebe uma formação
que irá sustentá-la pelo resto da vida porque
teve o que precisava na hora certa.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Sexo é Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-
mail: roselys@uol.com.br
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