São Paulo, quinta-feira, 06 de abril de 2006
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Vegetarianismo

Grupo de pesquisa da PUC usa alimentos na busca de soluções artísticas

Natureza viva

DENISE MOTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em tendas sustentadas por bambus ou em sala de aula ladeada por jaqueiras, eles trabalham em torno do poder da flor -e não há nenhum exercício de nostalgia sessentista. Trata-se de um dos temas centrais sobre o qual se organiza o Biochip, grupo de experimentação da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), aberto à participação pública até 10 de junho.
A atividade principal do Biochip -nascido como disciplina alternativa do departamento de artes e design da universidade- é, a partir da observação de cores, cheiros, sabores, texturas e estados pelos quais passam flores, frutas, hortaliças e sementes, transformá-los em matéria-prima de criações artísticas. Tal processo possui objetivos estéticos, mas também carrega o propósito de ser uma ferramenta de "religação" do homem com a terra, tornando-o capaz de ler "códigos não-verbais presentes na natureza", como afirma a coordenadora do grupo, Ana Branco, pesquisadora e professora da PUC há 24 anos.
"Com a valorização dos processos industriais, adormecemos atividades que usam nossas mãos, zonas reflexas do organismo capazes de recordar nosso modo de conhecer o mundo através do sensível, do intuitivo", diz ela. E exemplifica: "Na bananeira, com sua capacidade de se adaptar às encostas das montanhas, como as raízes reagem às alterações do solo? Quem decide lançar novas folhas? É a espécie como um todo, é o passado recordado que está ali agindo no desenvolvimento desse exemplar. O passado está presente e compatibiliza a bananeira e o meio. Também o corpo humano busca compatibilizar o agir do organismo e o meio."
Como computadores que vêm compilando informações desde o início dos tempos, os vegetais são para os pesquisadores fonte de arte e conhecimento. Daí o nome do grupo, que remete ao componente eletrônico e a dados acumulados pela natureza. "As sementes são concentrados de informações vivas armazenadas em microembalagens. Esse "biochip", semente nativa que é potencializada pela germinação, acorda nosso coração para a confiança no mundo natural, onde é bem-vindo nosso ser mamífero, gentil, amoroso, solidário e cooperativo", afirma a pesquisadora.
Os trabalhos do Biochip se dividem em dois grupos. Ao público, estão abertas as atividades do primeiro, de estudo, pesquisa e desenho com modelos vivos, que conta com 75 vagas. Não é necessário cumprir nenhum pré-requisito para integrá-lo, e a participação é gratuita.


Enquanto o público manuseia os vegetais, recorda não só o que é belo para os olhos mas o que é belo para o paladar, para o olfato

O outro, de formação em empreendedorismo ambiental solidário, tem como exigência haver participado do primeiro grupo. O objetivo aqui é expandir as experiências realizadas na pesquisa com os alimentos, e a ênfase está em atitudes e atividades voltadas para a promoção do ambiente. "Aprendemos com a cenoura, com a maçã, com a couve, com o girassol", afirma Branco. "E, como nosso corpo passa a ser composto por essas verdades, naturalmente irradiamos essa luz contida nos frutos da terra."
O grupo realiza todas as quintas-feiras a Feira do Desenho Vivo, onde são oferecidos para degustação alguns dos resultados do Biochip.
No Brasil, o trabalho com "alimentos vivos", como são descritos os materiais que integram a pesquisa, encontra na arte sua mais visível forma de expressão. Mas, alerta a professora, apreender as propostas e conceitos aliados a esse estudo -"o modo de fazer", como ela descreve- requer tomar contato com escritos de fontes bastante diversas. A pesquisa se baseia em autores que tratam desde nutrição e agricultura ecológica a taoísmo, shiatsu, filosofia e ética, por exemplo.
O Biochip também realiza projetos direcionados a crianças. Durante as feiras, oferece oficinas que têm o objetivo de desenvolver uma massa de modelar comestível. "Comer é conhecer. Sabor e saber são palavras que têm a mesma origem", comenta a pesquisadora. "Enquanto somos crianças, usamos as mãos para levar à boca tudo aquilo que queremos conhecer. E agora podemos continuar a fazer o mesmo. Cada semente armazena informações singulares, sabe do sol, das estações, da chuva, dos insetos, de quem plantou, de quem as cuidou", afirma.

GRUPO DE ESTUDO, PESQUISA E DESENHO COM MODELOS VIVOS
Onde: Laboratório de Investigação em Living Design da PUC-RJ (r. Marquês de São Vicente, 225, Gávea, Rio de Janeiro, tel. 0/xx/21/3114-1585, ramal 361)
Quanto: entrada franca
Quando: às segundas e quartas-feiras, das 9h às 11h; e alguns sábados, das 8h às 12h, em hortas de cultivo orgânico; até 10 de junho



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