São Paulo, quinta-feira, 06 de setembro de 2007
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Idosos não precisam conviver com sintomas desagradáveis; aprenda a prevenir problemas comuns nessa fase da vida e saiba quando é preciso buscar ajuda

Karime Xavier/Folha Imagem
Mara Amaral, 71,que chegou a pensar que estava com Alzheimer e logo buscou conselho médico


PRISCILA PASTRE-ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto a memória vai embora, começam a chegar o cansaço, as dores no corpo, as tonturas e, por vezes, até a depressão. Considerados problemas normais da idade, não raramente esses sintomas são subestimados pelos idosos e por seus familiares, que acabam deixando de procurar ajuda médica.
Mas os especialistas alertam: não é normal ter grandes desfalques de memória, cansaço, falta de ar ou dores musculares por ter passado dos 60 anos -faixa etária, no Brasil, considerada a entrada para a terceira idade. Com o tempo, o corpo fica mais vulnerável, mas isso não significa que seja preciso conviver com inconvenientes. "Pelo contrário, é possível aproveitar essa fase de forma prazerosa", afirma o geriatra Francisco de Brito, coordenador do Centro de Envelhecimento Saudável do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e pesquisador do Centro de Estudos do Envelhecimento da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). E viabilizar essa satisfação não é difícil: o primeiro passo é levar a sério todos os sinais do corpo.
A idéia não é viver em alerta constante, tornando-se um freqüentador assíduo de consultórios médicos ou acumulando remédios para cada dor que aparecer. "É comum ver idosos tomando muita medicação desnecessária", diz Brito. Nos relatos dados à Folha por pessoas que se sentiram vítimas da idade, fica claro que, em muitos casos, basta uma mudança nos hábitos de vida para que os sintomas desagradáveis desapareçam.
Conheça a seguir quais são, segundo especialistas, os principais sintomas com os quais muita gente tende a se acostumar por achar que são normais da idade -e relatos de pessoas que não se acomodaram e procuraram resolvê-los por uma melhor qualidade de vida.

Perda dos dentes

"É senso comum achar que os mais velhos precisam usar dentadura, mas não é verdade", afirma o cirurgião-dentista e professor da Fapes (Fundação de Apoio à Pesquisa e Estudo na Área de Saúde) Oscar Razuk.
Apesar das mudanças que a boca sofre com a idade -mucosas mais sensíveis e diminuição da quantidade de saliva, entre as mais comuns-, basta cuidar bem deles, segundo Razuk, para conservá-los até o fim da vida.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Odontologia, cerca de 75% dos idosos brasileiros sofrem com a falta de dentes. Outro dado preocupante vem de uma pesquisa com a população acima de 70 anos, que revela que mais de 80% dos entrevistados têm algum grau de doença periodontal. Esse índice poderia ser diminuído com uma medida bastante simples: cuidar bem da saúde da boca ao longo da vida.
Para quem não vem tomando esse cuidado, a boa notícia é que nunca é tarde para começar. "Tenho um paciente, hoje com 62 anos, que há dois apareceu no consultório com oito dentes. Ele achava que perderia o que havia sobrado em pouco tempo. Fizemos os implantes necessários e, de lá para cá, ele vem fazendo a higiene correta. Conclusão: não terá de colocar dentadura", conta.
Além da perda de dentes, as escovações malfeitas podem render problemas gengivais e periodontais (inflamações que podem chegar ao osso e aos ligamentos do osso). Para evitar o problema, é aconselhável ir semestralmente ao dentista para fazer a manutenção necessária -não só dos dentes mas também de obturações, canais e outros procedimentos feitos há mais tempo e que podem estar prejudicados.

Perda de memória

Reclamação habitual nos consultórios geriátricos, a perda de memória é causada por um processo natural do cérebro. Primeiramente porque, nos idosos, as informações não entram tão claramente pelos órgãos dos sentidos. Perdas de audição ou de visão, por exemplo, fazem com que os dados não cheguem ao cérebro deles como chegam ao dos jovens. Segundo porque, quando a mensagem entra, é processada mais lentamente. O passo seguinte -buscar o que foi armazenado- também demanda mais tempo na terceira idade.
Lea Tenenholz Grinberg, coordenadora do Banco de Cérebros da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), explica que, com o tempo, ocorrem também perdas de neurônios. Esse déficit é considerado natural desde que, na prática, não comprometa as atividades do dia-a-dia. "Não aceite como algo normal da velhice um problema de memória que atrapalhe a sua rotina", aconselha.
A artista plástica Mara Amaral, 71, chegou a pensar que estava com doença de Alzheimer. "Minhas filhas me incentivaram a procurar ajuda logo", conta. A hipótese foi descartada pelo especialista, que indicou um tratamento simples com um terapeuta de memória.
O déficit acentuado pode ser ainda conseqüência de problemas na tireóide, falha na oxigenação do cérebro, carência de hormônios, necessidade de ácido fólico ou falta de vitamina B12.
Cybelle Maria Costa Diniz, diretora científica da ABRAz (Associação Brasileira de Alzheimer), afirma que buscar um diagnóstico precoce é mesmo o melhor caminho. "No caso de Mara, por exemplo, o simples fato de descartar que ela estava com doença de Alzheimer pode ter evitado que entrasse em um estado de depressão", diz.
Para quem for diagnosticado com a doença, uma esperança: "Mesmo sem uma cura em vista, há tratamentos que, em muitos casos, podem atrasar o avanço dos sintomas em vários anos", afirma.
Diniz lembra ainda que a família tem um papel fundamental na detecção das perdas de memória do idoso. "O paciente pode nem se lembrar de que anda esquecendo demais as coisas."

Depressão

Segundo um estudo publicado pela "Archives of General Psychiatry", perda de memória e dificuldades de atenção e de concentração podem esconder outro problema que muita gente considera, erroneamente, normal nos idosos: a depressão.
"É algo que somente os familiares e as pessoas mais próximas podem fazer. Não adianta esperar que parta do paciente o desejo de procurar ajuda porque ele pode nem fazer idéia de que tamanha tristeza e falta de ânimo já viraram doença", diz Fabio Nasri, coordenador do programa de geriatria e gerontologia do hospital Albert Einstein.
Para Lea Tenenholz Grinberg, da USP, evitar doenças físicas ajuda a prevenir a depressão nos idosos, já que se sentir debilitado é o primeiro passo para a diminuição da vontade de viver. Outros fatores que podem levar à depressão são o abandono da família e a perda da capacidade de fazer o que antes era realizado com facilidade.
Por essa razão, além de tratamento neuropsicológico, é fundamental que o idoso passe por uma reeducação alimentar e comece a fazer exercícios físicos. "Sentindo-se mais disposto, mais útil e mais capaz, a tendência é que ele consiga sair de estados depressivos ainda com mais facilidade do que pessoas jovens", diz Grinberg.

Dores musculares e nas articulações

A dor que toma conta do corpo com o avanço da idade pode ser aliviada com a ajuda de um paliativo poderoso: a prática de exercícios. A dona-de-casa Maria Dolores Estela Roig, 76, encontrou na atividade física o alívio de que precisava para as dores que a incomodavam. Ela vai à academia três vezes por semana. "Faço musculação, alongamento, exercícios de equilíbrio... Tudo o que a professora manda", orgulha-se. O resultado do fortalecimento muscular e das atividades posturais? Além de sentir menos as dores no corpo, ela não lembra qual foi a última vez em que sofreu uma queda. Prova de que a conscientização sobre a importância da atividade física pode mudar dados como o da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia), que revela que os tombos constituem a primeira causa de acidentes em pessoas acima de 60 anos.
Para José Kawazoe Lazzoli, cardiologista e médico do esporte da SBME (Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte), exercitar-se é a melhor forma de prevenir esse tipo de acidente. "Isso sem falar da lentidão de movimentos nos idosos. Parte dela decorre da redução da potência muscular natural da idade. Mas outra é causada, basicamente, pela falta de atividade física", afirma. Ele lembra, porém, que, antes de se atirar na ginástica, é preciso procurar um especialista (médico do esporte ou ortopedista, por exemplo) para se certificar de que as dores não são conseqüência de uma doença já instalada, como tendinites. Visitar um cardiologista também é recomendável para fazer uma avaliação da atividade mais indicada.

Falta de ar e cansaço

Quando a disposição e a energia vão embora, lá vai todo mundo colocar -de novo- a culpa na idade. Mas, em geral, quando sintomas como cansaço e falta de ar começam a tomar conta, ela não é a grande culpada. Bastou uma bateria de exames para que a terapeuta holística Marcia Maira Runha Titero, 57, descobrisse isso.
Para não chegar à terceira idade carregando o cansaço exagerado que já começava a sentir (acompanhado de sintomas como depressão, insônia e falta de memória), ela encontrou a prevenção de possíveis doenças na alimentação. "Estava perdendo a vitalidade antes mesmo de completar 60 anos. A reeducação à mesa e a suplementação vitamínica, que comecei há cinco meses, já a trouxeram de volta", comemora.
A nutricionista Lucyanna Kalluf, especialista em alimentos funcionais, explica que a idéia não é só incluir na dieta alimentos que fornecem nutrientes ao organismo mas também recomendar aqueles que ajudem na prevenção de doenças. "Já a partir dos 50 anos, é comum passar por distúrbios nutricionais. Com a perda gradual da capacidade de funcionamento dos órgãos, é preciso trabalhar em busca do que chamamos de 'vitalidade positiva'", diz. Entre os alimentos com qualidades funcionais, a especialista cita germe de trigo, linhaça, abacate, aveia, banana, nozes e castanha-do-pará.

Incontinência urinária

Para Gilberto da Costa Freitas, especialista em ginecologia e obstetrícia e membro da SBRH (Sociedade Brasileira de Reprodução Humana), dificilmente fica com incontinência urinária quem tem hábitos saudáveis. "E não falo só de alimentação mas também de exercícios físicos e, o mais importante, atividade sexual."
Freitas explica que a incontinência é mais comum nas mulheres devido à proximidade dos aparelhos urinário e genital. "Quando os hormônios femininos param de estimular os órgãos externos, a tendência é que eles comecem a atrofiar." Manter uma vida sexual saudável na terceira idade treina a musculatura do períneo e melhora a qualidade do tecido vaginal.
Para diagnosticar o problema, é recomendado um teste urodinâmico. Se a questão for na musculatura, possivelmente serão indicados exercícios que ajudem a corrigi-lo. Em alguns casos, o médico pode entrar com medicamentos. Somente para os mais graves recomenda-se a cirurgia.
No homem, a incontinência costuma ser mais associada a uma intervenção médica. Há casos em que a cirurgia da próstata leva a alterações da bexiga. Por ser a uretra mais protegida no homem, é difícil que eles tenham incontinência urinária naturalmente. Em compensação, o tratamento deles pode ser mais complicado.


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