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foco nele
Atividade física em excesso pode piorar humor
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Atividade física melhora o humor, mas
também pode fazer estragos no estado de
espírito do atleta. Um estudo realizado
durante três anos pelo psiquiatra Marco
Aurélio Monteiro Peluso, 36, para a sua
tese de doutorado mostra que treinamento em excesso leva a alterações de
humor com características depressivas.
Ex-atleta, o interesse em pesquisar
cientificamente o assunto surgiu da experiência que o próprio médico viveu como
vítima do excesso de treinamento.
"Desânimo, cansaço e a vontade de largar tudo foram apenas alguns dos sintomas que vivenciei quando não atingi as
marcas de tempo que já atingira antes",
diz Peluso. Leia a entrevista abaixo.
"Eu realmente fiquei mal. Uma queda no rendimento do
atleta pode ter milhões de razões, mas eu não tinha nenhum
problema externo. Apesar disso, o desânimo veio forte"
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Folha - Como foi a sua história com excesso de treino físico?
Marco Aurélio Monteiro Peluso - Até o
primeiro ano da faculdade, eu era atleta,
nadador. Treinava diariamente durante
horas, participando até de campeonatos
nacionais. Naquele ano, em 1986, percebi
que o meu rendimento havia caído durante a fase de treinamento. Eu me sentia
cansado, desanimado e não consegui
atingir a marca que já atingira antes. Estudos científicos começavam a estudar o
assunto, mas, no meio esportivo, isso
ainda era pouco conhecido.
Folha - Isso afetou a sua qualidade de vida?
Peluso - Eu realmente fiquei mal. Uma
queda no rendimento do atleta pode ter
milhões de razões, mas eu não tinha nenhum problema externo. Apesar disso, o
desânimo veio forte. Muito tempo depois, por volta de 1995, quando acabei a
residência em psiquiatria, decidi desenvolver pesquisas sobre a relação entre atividade física intensa e piora de humor.
Folha - Como foi o seu estudo?
Peluso - Apliquei determinadas escalas
de avaliação de humor, que são instrumentos de avaliação usados na psiquiatria e na psicologia. Os participantes, 278
pessoas entre homens e mulheres, integravam dois grupos: atletas com idade
entre 14 e 28 anos e vestibulandos entre 16
e 18. Isso foi feito durante as três fases de
preparação para a competição mais importante da temporada, no caso dos esportistas, e também em três momentos
ao longo da preparação para o vestibular.
Folha - Quais são essas fases?
Peluso - No caso dos atletas, a primeira
fase é de treinamento de intensidade normal. Na fase do meio, o esforço é bem
mais acentuado, pois treina-se em mais
quantidade e intensidade, e na final, próxima à competição, o treinamento é mais
leve, de mais descanso. Quanto aos estudantes, eles foram avaliados a primeira
vez em março, o mais longe possível do
vestibular, depois, no final de agosto,
bem no meio do caminho, e, por fim,
duas semanas antes do vestibular.
Folha - E por que comparar o vestibulando com o esportista se o foco era a relação
entre atividade física e humor?
Peluso - Porque o estresse intelectual
também causa mudança de humor, e
quis compará-lo com a influência do estresse físico na alteração do humor.
Folha - E qual o resultado?
Peluso - Ao contrário do que se possa
imaginar, os atletas não tiveram seu humor prejudicado próximo das competições, mas quando a capacidade física é
mais exigida e o treino, mais puxado.
Piorou da primeira para a segunda fase e
melhorou da segunda para a terceira. Ou
seja, existe uma ligação entre piora de humor e quantidade e intensidade de treinamento, diferentemente dos vestibulandos, cuja proximidade das provas foi
o fator mais importante para a alteração
de humor, que piorou progressivamente
da primeira até a terceira fase.
Folha - E qual a importância disso?
Peluso - Identificar as características da
piora do humor é importante. O tipo de
alteração de humor entre os atletas tem
mais relação com depressão. Entre os
vestibulandos, tem mais ligação com a
ansiedade. Uma coisa é ansiedade, outra
é depressão. Insônia, inquietação e falta
de concentração são sintomas comuns
de ansiedade, mas também de depressão.
O que é mais específico da depressão é a
falta de prazer em fazer as coisas, a falta
de ânimo e de iniciativa. Já sinais como
mão formigando, vontade de ir ao banheiro ou coração disparado são mais específicos da ansiedade.
Folha - A mudança de humor no atleta é
um sintoma de depressão?
Peluso - Não, nem significa que ele vai
ter depressão, mas que o humor alterado
tem características do estado depressivo.
Folha - Qual seu próximo estudo?
Peluso - Preparo um projeto para estudar imagens cerebrais de pessoas com "overtraining" e compará-las com as imagens de pessoas com depressão.
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