São Paulo, quinta-feira, 07 de janeiro de 2010
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ANNA VERONICA MAUTNER

Senta e estuda

Costuma-se dizer, sem parar para pensar, aos estudantes: senta e estuda! Isso pressupõe que, para adquirir novos conhecimentos, devemos estar mais ou menos imóveis, apenas mãos e braços livres para anotar. Mas será que essa ordem é suficiente para uma aprendizagem eficiente?
É muito difícil definir exatamente o que é estudar. O processo de aprendizagem -estudar- pode estar mais voltado para a fixação de um conhecimento do que para a descoberta, a invenção e mesmo a compreensão. No início do processo, movimentar-se não atrapalharia.
Muitas vezes, para uma boa compreensão de um conhecimento, o diálogo vem bem.
Mesmo sentados, podemos ter mais alguém participando do processo. É o que ocorre quando se diz "vou estudar com fulano". Estudar junto não é decorar -essa tarefa pode se fazer sozinho. Inclusive, muitos atores decoram -mas não estudam- seus textos andando.
Já vai longe o tempo em que os professores ditavam "o ponto" e a lição de casa era apenas fixar o conteúdo do "ponto". Aí sim cabia o "senta e estuda".
Para orientarmos o estudo dos jovens, precisamos atentar para a complexidade embutida nessa ação. Estudar se compõe de múltiplas aptidões mentais: perceber, ler, investigar, entender, relacionar, comparar, lembrar o que já se sabe, procurar novas informações, trocar ideias, verificar se esse é o caminho certo para chegar a uma conclusão válida.
Depois de tudo isso, chega a hora de fixar o conhecimento pela releitura, eventual anotação de fontes de referência e catalogação mental. Aí sim "senta e estuda" faz sentido.
Existe um momento da escolaridade -o cursinho- em que a aula expositiva praticamente volta. Afinal, é a revisão do que já deveria ter sido ensinado e aprendido. Aí o professor é um lembrador. Deveria ser o despertador da memória acumulada nos anos anteriores passados na escola.
Escrevo agora pensando em pais e mestres. Um bom professor é aquele capaz de antecipar as etapas do processo de aquisição de conhecimento. Cabe a ele, que conhece o conteúdo, decupá-lo nas várias etapas: mandar procurar na biblioteca, sugerir pegar um caderno do semestre passado e por aí afora, indicando como complementar com o necessário para que o aluno esteja pronto para encarar a etapa da fixação do conhecimento. Quando se diz "senta e estuda", está se pensando só no final.
Cabe aos pais estarem atentos ao fato de que estudar não é só prestar atenção, imóvel diante da escrivaninha. Muitas vezes pode ser necessário telefonar para o colega que tem um certo livro ou enciclopédia ou ir a uma biblioteca e até, modernamente, recorrer à internet.
Muitas matérias demandam laboratório, experiências e observação, mesmo as do curso fundamental.
Nas etapas mais adiantadas da escolaridade, cada vez menos sentar para estudar é suficiente. É por isso que o trabalho em grupo e os seminários aparecem com frequência lá pelo final do nível médio.
Tudo isso não elimina a aula, o professor falando lá na frente para todos ao mesmo tempo.
Cabe a ele indicar o novo e orientar para a forma de sua captação.


ANNA VERONICA MAUTNER , psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é autora de "Cotidiano nas Entrelinhas" (ed. Ágora)

amautner@uol.com.br

A colunista Rosely Sayão volta a escrever em 21/1


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