São Paulo, terça-feira, 08 de fevereiro de 2011
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NEURO

SUZANA HERCULANO-HOUZEL suzanahh@gmail.com

Calor na medida certa

Graças ao nosso ‘verão interno’ conseguimos funcionar em vários ambientes e em qualquer estação

VERÃO é aquela época do ano em que uns vão às praias com o mínimo de roupa, para refrescar o corpo ao vento e no mar, e outros, como eu, se escondem no ar-condicionado e fogem para lugares mais frios. As estratégias diferem, mas todos queremos o mesmo: fugir do calor excessivo.
O quanto o calor ambiente nos afeta é evidência de uma de nossas características mais básicas. Você e eu, como todos os outros mamíferos e também as aves, somos animais endotérmicos, com o metabolismo basal elevado o suficiente a ponto de manter o corpo permanentemente aquecido. Esse "verão interno" constante é produto direto da respiração celular: a transferência da energia de moléculas, como a glicose, por uma série de intermediários, até chegar ao oxigênio.
O mesmo processo que nos mantém vivos também nos aquece, o que tem uma série de vantagens. Uma das mais evidentes é que, com o metabolismo sempre elevado, conseguimos nos mover rapidamente e por longos períodos (o que lagartos, com baixo metabolismo, não conseguem). Outra é que, com o calor interno regulado, funcionamos normalmente em vários ambientes, e tanto no inverno quanto no verão.
A endotermia, contudo, tem seus custos, e alguns ficam mais notáveis justamente no calor do verão. O calor gerado pelo corpo precisa se dissipar para o ambiente, ou o corpo começa a superaquecer perigosamente. A evaporação do suor ajuda a retirar calor do corpo -mas nos faz perder água rapidamente. Se o ambiente está mais quente que o próprio corpo, a tendência natural é o superaquecimento corporal e, com ele, o risco crescente de desidratação e insolação: a danificação do corpo pelo próprio calor.
Fazer exercícios físicos eleva ainda mais o metabolismo, e com isso a temperatura do corpo, que começa a suar copiosamente. Isso ajuda a manter o corpo fora de perigo -mas, no calor do verão, superaquecer é apenas uma questão de tempo.
É justamente o superaquecimento do sangue, aliás, detectado pelo cérebro, que nos faz parar o exercício. Esse é o sistema interno de segurança térmica: a sensação de cansaço, esgotamento e sede nos impede de continuar aquecendo perigosamente, e ainda nos leva à água fresca.
Para um corpo que está sempre no seu próprio verão por dentro, buscar repouso, sombra e água fresca no auge do calor é, portanto, a decisão mais sábia que o cérebro pode tomar.


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog
www.suzanaherculanohouzel.com



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