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São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 2003
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outras idéias - marisa marega

Todas as tradições espirituais tiveram seguidores ao longo dos milênios -santos, monges, lamas, mestres-, que, por um caminho ou outro, usaram a meditação

O extenso cardápio de meditação

marisa marega

Muita gente vem descobrindo nos últimos anos uma prática que não só relaxa o corpo como melhora o humor e a qualidade de vida em geral. É a meditação. E pode ser que você agora tenha exclamado: "É inviável!". Mas pense comigo: se outras pessoas já conseguem, que mal há em examinar o assunto?
Ninguém está dizendo que é preciso fazer como os Padres e Madres do Deserto, primeiros cristãos da história a se dedicarem à meditação. Nos séculos 3º e 4º, cansados dos desvios éticos e morais, eles abandonavam as cidades e saíam em busca de iluminação nas cavernas da Síria e do Egito. Não é necessário também seguir o caminho de Siddartha Gautama, o Buda, que, entre os séculos 4º e 5º a.C., aos 29 anos, abandonou o palácio em que vivia para buscar um meio de acabar com o sofrimento humano. Também não precisa acreditar na teoria do carma, que prega a libertação do homem pela vivência de diferentes vidas. Então o que fazer?
Todas as tradições espirituais tiveram, ao longo dos milênios, seguidores -santos, monges, lamas, avatares, mestres-, que, por um caminho ou por outro, usaram a meditação para atingir a transcendência. Esses sábios deixaram tantas técnicas para as gerações futuras quantos foram os que buscaram a iluminação por meio da meditação. Muitos desses caminhos mantiveram-se até o século 21 e podem servir de pistas quando o assunto é relaxar e viver melhor hoje.
Você pode descobrir e escolher, por exemplo, as indicações usadas por são Francisco de Assis, santa Teresa D'Avila, são João da Cruz ou santo Inácio, se gostar das linhas mais tradicionais do cristianismo. Isso também não significa ter de levitar, como fez santa Teresa -em momentos de êxtase místico, ela pedia às carmelitas que amarrassem seus pés a um banco porque, nessas circunstâncias, costumava levantar vôo na capela do convento.
Ainda no cristianismo, para quem preferir algo mais próximo no tempo, a lista é longa. Vai do mestre Eckart (1260-1327), passando pelo beneditino irlandês John Main (1926-1982) às dicas do psicólogo jesuíta indiano Anthony de Mello (1931-1987). Todos eles desenvolveram técnicas para tornar a meditação mais palpável às cabeças tumultuadas do século 20.
Mais recentemente ainda, integrantes do Colégio Internacional de Terapeutas (formado por psicólogos, psiquiatras e sociólogos) desenvolveram uma visão holística da meditação, integrando colaborações da filosofia, da arte, da ciência e das tradições espirituais. Nessa linha, é possível aprender com religiosos e leigos da atualidade, como os franceses Jean Yves Leloup e Pierre Weil e o teólogo brasileiro Leonardo Boff.
Dentro da rica tradição do hinduísmo, há alguns caminhos deixados por grandes mestres espirituais, como Krishnamurti. Este era de um bom humor contagiante, o que atribuía à meditação. O jesuíta Carlos Vallés, do início do século, conta que, num encontro entre os dois, Krishnamurti disse: "Ao fazer minhas caminhadas sozinho na floresta, por uma ou duas horas, nenhum pensamento me vem à mente. Os psicólogos dizem que isso não é possível, mas acontece comigo. Devo ser um desatinado". E abriu uma enorme gargalhada.
A experiência de esvaziar a mente é o pulo do gato para quem vive rotina extenuante e é comum a muitas linhas de meditação.
Dentro do budismo e do zen-budismo, além do dalai-lama, há outros monges que também ensinam técnicas muito interessantes para os dias de hoje. Tartang Tulku, por exemplo, o lama-chefe do Centro Tibetano de Meditação Nyingma, tem muitos adeptos no Brasil.
Muita gente pensa que a meditação distrai a atenção, mas é justamente o oposto: com a mente alerta, a pessoa foca o eixo, e esse estado a leva ao equilíbrio e à serenidade.
Muitos centros e grupos estão formados nas grandes cidades apenas para fazer meditação sem exigir a adesão a religião. A maioria deles segue práticas aprendidas dentro das religiões, mas adaptadas às loucuras do cotidiano pós-moderno.
A meditação -já foi comprovado pela medicina- ameniza as dores físicas e reforça o sistema imunológico. Para as pessoas irritadiças, de ânimos desgastados pela tensão, é particularmente indicada, pois deixa a vida mais centrada, equilibra a energia interna, clareia a mente e a torna mais rápida nas decisões, além de marcar as pessoas pela figura serena.


MARISA MAREGA é jornalista, professora universitária e pesquisadora das práticas de meditação; participa de um grupo de oração orientado por Frei Betto há 23 anos; e-mail: mamarega@uol.com.br


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