São Paulo, quinta-feira, 11 de setembro de 2008
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Sem sair do lugar

Três corredores testam esteira que, por preço de carro popular, simula percurso de maratonas pelo mundo

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma maratona soma 42 quilômetros e 195 metros -mas é possível correr uma sem sair do lugar. Essa é, pelo menos, a proposta da esteira E-750, que promete simular o percurso de competições como as maratonas de Nova York e de Paris, reproduzindo as subidas e descidas reais de cada prova. Desenvolvida por uma empresa nacional, traz também simulações de seis percursos em São Paulo, incluindo o da São Silvestre e de circuitos como o do parque Ibirapuera.
Segundo a fabricante, o recurso é "eficiente para corredores profissionais e perfeito para quem gosta de desafios". Será? Ao ouvir a descrição, Luiz Bernabeu, 53, treinador da VO2 Clube de Corrida, pareceu curioso e cético. "Para quem treina na rua, usar esteira é complicado", disse ele, que topou testar o produto para a Folha.
A avaliação contou, ainda, com a treinadora Adriana Argila, 44, e com o atleta Rafael Santos, 23. Na sexta-feira passada, eles acompanharam a reportagem à 9ª Ihrsa-Fitness Brasil, feira de negócios em exercícios e bem-estar na qual a esteira estava exposta.
"Um dos principais problemas de correr em esteira é a monotonia", conta Rodrigo Moraes, engenheiro de produtos da empresa. O novo recurso busca tornar a atividade mais atraente. São 30 opções de circuito: seis em cada cidade contemplada (Paris, Nova York, Sydney, São Paulo e Tóquio).
Na tela, sensível ao toque, cada percurso aparece visto de cima, e o atleta é representado por uma bolinha, que se desloca à medida que a corrida avança. Outro recurso que busca aproximar a experiência de uma corrida de rua real é o sistema de amortecimento do piso.
Uma vantagem das esteiras sobre a corrida na rua é que o impacto sobre a articulação do joelho é menor nesse equipamento. Mas, segundo Moraes, muitos corredores se queixam de que as esteiras são "moles" demais. Para atendê-los, o equipamento tem três opções, do piso mais macio ao duro.
Durante o exercício, é possível assistir TV na tela da própria esteira ou monitorar gráficos que registram a velocidade, o pulso do atleta etc.
Além das simulações, o usuário também pode escolher alguns programas preestabelecidos -como o de montanhas, no qual a esteira fica mais inclinada e menos rápida- ou personalizar a corrida.
A aceleração e a inclinação podem ser reguladas na tela ou no apoio lateral para as mãos: a esteira atinge um aclive de 15% e um declive de 5% e chega a 25 km/h -velocidade alcançada por um maratonista de alto nível, segundo Moraes.

Altos e baixos
Com 17 São Silvestres seguidas no currículo, Bernabeu avaliou a simulação da prova. A surpresa começou na "av. Paulista". De plana, a esteira passou para uma inclinação de 2%. "É uma informação nova, porque a impressão é a de que é um trajeto reto", diz.
Ao chegar à "rua da Consolação", a esteira simulou a descida. Para Bernabeu, o declive, de 2%, é "muito diferente da realidade da rua". Mas o principal problema, diz, é a duração: a esteira logo voltou a ficar plana, embora a tela ainda indicasse um trecho que é inclinado.
"Não dá para identificar o percurso claramente", afirma Adriana Argila. "A descida é muito suave. O que mais machuca o joelho é a descida -tem de ser mais conservador mesmo. Mas, na rua, ela existe."
O corredor Rafael Santos, que até então só havia corrido na rua e em pistas de corrida, também disse que não conseguiu perceber muito bem as inclinações da esteira.
Segundo Rodrigo Moraes, o programa é baseado em dados obtidos via satélite, que são adaptados para as limitações da máquina. "A gente normaliza para que a pessoa tenha a sensação de descida, mas sem prejuízos à saúde", afirma.
A variação no sistema de amortecimento também não foi significativamente perceptível para os três. A avaliação, porém, foi prejudicada pelo fato de o aparelho estar sobre uma plataforma no estande, o que amenizava o impacto.
Para Adriana Argila, que também é personal trainer, a vantagem do equipamento é a motivação. "Ela parece ser muito boa para um personal trainer devido à grande variedade de percursos. Muitos alunos não gostam de se exercitar na esteira porque se cansam de fazer a mesma coisa todos os dias", conta.
Luiz Bernabeu acha que o aparelho é uma opção para animar o treino quando não é possível correr na rua, seja pela chuva, seja pela falta de tempo. Mas a motivação, afirma, depende do percurso escolhido. Ele, que subiu na esteira achando que a parte mais divertida seria a das maratonas, mudou de opinião. "Fazer uma corrida longa assim na esteira é monótono. Por mais que ela ofereça opções que nos distraiam, quatro horas é muito tempo. Já o circuito da USP é muito interessante. Dá para fazer em uma hora e não cansa."

Preço
A E-750 é mais cara do que alguns carros populares: o preço sugerido é R$ 29.400.
Para Adriana, Luiz e Rafael, um equipamento com esse preço poderia trazer alguns detalhes que se traduzem em conforto, como um ventilador direcionado para o rosto, mais suportes para garrafas d'água e um local onde colocar as chaves e o celular, por exemplo. "É uma esteira que tem tantas coisas e essas, que são simples, não tem", comentou Adriana.
Rodrigo Moraes, representante da empresa, explica que o porta-trecos foi retirado devido ao tamanho do painel, mas que a previsão é que ele seja incluído em novos projetos. Quanto ao ventilador, afirma que ele não foi instalado porque o modelo, profissional, é voltado para ambientes que já costumam ser climatizados, como academias e clubes.
Mas o que mais faz falta, brinca Bernabeu, é a paisagem. "O mais legal, para a maioria dos corredores, é que a gente acaba conhecendo muitos países por conta das corridas. Na esteira, você perde tudo isso. Nunca conseguirão simular a sensação de correr embaixo do Arco do Triunfo, em Paris."


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