São Paulo, quinta-feira, 12 de dezembro de 2002
Texto Anterior | Índice

outras idéias michael kepp

Para conseguir a façanha, diga aos seus filhos pequenos que ainda acreditam em Papai Noel que ele veio mais cedo só para dar um presente especial para a família toda: um vale-viagem

Uma sugestão radical para o Natal

Aqui vai uma sugestão radical para o Natal. Baseia-se na minha crença de que uma análise da relação custo-benefício da máquina marqueteira natalina mostra que o custo -em termos de obrigações- supera em muito os benefícios, pelo menos para os adultos.
Há a obrigação 1) de trocar presentes com a família mais próxima, parentes e, às vezes, até amigos e de lutar contra multidões nos shoppings para comprá-los; 2) de preparar uma elaborada ceia natalina para, digamos, 12 pessoas; e 3) de ficar com sua família quando preferia fazer outra coisa ou, até pior, de sentir-se mais solitário do que nunca por passar a festa de família sozinho.
Já que o Natal coincide com um monte de prazos de fim de ano e confraternizações inevitáveis, por que fazer a vida ficar ainda mais estressante adicionando ainda mais obrigações à sua longa lista? Por que, em vez disso, não quebra a tradição? Em vez de preparar uma grande ceia e comprar presentes -mesmo para os seus filhos-, por que não usa o dinheiro para levar a família em uma modesta viagem de Natal?
Para conseguir a façanha, diga aos seus filhos pequenos que ainda acreditam em Papai Noel que ele veio mais cedo só para dar um presente especial para a família toda: um vale-viagem.
Dizer aos seus filhos um pouco mais velhos que não vão ganhar skates e bicicletas vai ser um negócio bem mais arriscado e pode reduzir dramaticamente suas chances de ver o Ano Novo. Mas é o preço de romper com a tradição.
Você pode vender a idéia a adolescentes e pós-adolecentes se conseguir convencê-los de que quer passar mais tempo com eles -em uma viagem que satisfaça um de seus desejos materiais. Foi o que minha mulher, Rosa, disse aos dois filhos, Laura, então com 24 anos, e Gabriel, então com 20, quando acabamos com a tradição natalina, há três anos. Pelo fato de terem se emocionado com a sinceridade dela -não porque se sentissem obrigados-, eles toparam a viagem.
No último Natal, a família foi para a Ilha Grande. Todos nós ganhamos presentes sem preço. Laura fez novos amigos. Gabriel descobriu uma caverna especial com um lago turquesa. Rosa não teve de cozinhar. E eu descobri um bom local de mergulho. Além disso, reforçamos nossos laços familiares. Não é para isso que o Natal serve?
Neste ano, vamos para Tiradentes no sábado dia 21 de dezembro e voltamos no dia de Natal.
Se fizer uma viagem semelhante, vai perder, no máximo, um dia de trabalho, pode ficar em pousadas antes de os caros pacotes de fim de ano serem oferecidos e vai chegar ao seu destino em estradas sem muito tráfego. E ainda pode voltar a tempo para o almoço de Natal com os parentes (na casa deles) -se a tradição fizer falta.
Rosa deu força para a alternativa natalina, em parte, por causa de sua criação. Nascida em uma família pobre do Piauí, Rosa passou seus Natais (e as semanas antes deles) sem nenhuma expectativa de presentes, visitando a casa de velhinhas que transformavam uma boa parte da sala de suas casas em presépios. Havia montanhas e um deserto, onde os três Reis Magos, guiados por estrelas penduradas no teto, seguiam para o estábulo em que Jesus dormia na manjedoura. As velhinhas contavam a Rosa e a outras crianças a história do nascimento de Jesus, enquanto os pequenos devoravam biscoitos de polvilho com suco de pitanga ou de murici. Era tudo de que Rosa precisava para o Natal.


MICHAEL KEPP (mkepp@openlink.com.br), jornalista americano, está radicado no Brasil há 20 anos


Texto Anterior: s.o.s. família - rosely sayão: Pais ensinam "hiperatividade" aos filhos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.