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odontologia
Tratamento de sopro
Instrumentos como flauta, saxofone e trompete influenciam músculos do rosto e posição dos dentes das crianças e podem ajudar a tratar lábios flácidos
e queixo para a frente , entre outros problemas
FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Criatividade, sensibilidade, disciplina, capacidade de improviso,
formação cultural. Os
pais que matriculam seus filhos
em aulas de música costumam
conhecer os benefícios que a
atividade traz em relação a esses tópicos. O que nem todo
mundo sabe é que, se o instrumento for de sopro e, caso usado continuamente, pode trazer
uma vantagem extra: ajudar a
corrigir certos desvios dos
músculos do rosto, que, por sua
vez, influenciam a posição dos
dentes.
Queixo projetado para a
frente ou para trás e lábios flácidos, curtos ou separados são
exemplos de problemas que
podem, em alguns casos, ter
uma melhora com o uso desses
instrumentos.
"Os instrumentos de sopro
trabalham a musculatura da face e podem exercer influência
sobre a posição dos dentes. Em
algumas crianças, eles ajudam a
melhorar determinados desvios miofuncionais [relacionados ao funcionamento dos
músculos]", afirma a odontopediatra Maria Cristina Ferreira
de Camargo.
A dentista, que atende em
consultório há mais de 30 anos
e é autora de pesquisas sobre o
crescimento da face, decidiu
observar quais músculos cada
instrumento de sopro trabalha
e de que maneira ocorre essa
ação. A partir disso, passou a indicar a atividade a alguns pacientes como coadjuvante no
tratamento.
Para Eduardo Felipe Fernandes Pereira, 9, que tinha o
hábito de respirar pela boca, ela
prescreveu a gaita, "uma forma
lúdica de estimular a sensibilidade, o toque e a percepção dos
lábios". "Ele ficava sempre de
boca aberta. No início, tocava a
gaita mais por obrigação, mas
hoje ele adora e vê como brincadeira. A respiração dele já
normalizou", conta a mãe do
menino, a auxiliar de odontologia Misleine Pereira, 27.
A fonoaudióloga Irene Marchesan, diretora clinica do Cefac (Centro de Especialização
em Fonoaudiologia Clínica), de
São Paulo, confirma que os instrumentos de sopro funcionam
bem para casos como o de
Eduardo. "Eles fortalecem a
musculatura de sustentação da
mandíbula e ajudam a pessoa a
treinar manter a boca fechada.
Muitos fonoaudiólogos indicam exercícios com bexigas,
apitos e línguas-de-sogra, mas,
se o paciente se interessar por
música, o instrumento de sopro é uma atividade mais continuada, que incentiva a criança a
fazer por mais tempo", diz.
Piora
Da mesma forma que trazem
benefícios em alguns casos, os
instrumentos de sopro podem
agravar -ou impedir que melhorem- certos desvios já instalados. Assim, crianças com
tendência a mordida aberta
(quando os dentes da frente
não se tocam) devem evitar o
clarinete, o saxofone, o oboé, o
fagote e a corneta, de acordo
com Camargo, já que os movimentos realizados podem piorar o afastamento entre as arcadas dentárias.
Isso não significa, no entanto, que quem não tem nenhum
problema vá apresentá-lo após
tocar flauta ou saxofone, por
exemplo. "Se você tem uma boca de formas corretas e com
uma musculatura equilibrada
nada vai acontecer. O problema
é quando a pessoa já apresenta
uma deficiência e toca sistematicamente um instrumento que
ratifica aquilo", diz a dentista.
A fonoaudióloga Irene Marchesan lembra que a interferência dos instrumentos sobre
a musculatura e o crescimento
ósseo ocorre apenas na infância
e na pré-adolescência. "Isso
não vale para a idade adulta,
quando já terminou o crescimento do indivíduo. O último
pico de crescimento ocorre por
volta dos 12, 14 anos", diz.
O dentista José Fernando
Castanho Henriques, professor
titular da USP (Universidade
de São Paulo) e consultor da
Associação Brasileira de Odontologia, afirma ainda que os
efeitos dependem da freqüência, da intensidade e da duração
do uso do instrumento. "Se a
pessoa treinar só de vez em
quando e não usar muita intensidade, a influência não é tão
grande", pondera.
Ele também observa que é
importante identificar as causas principais de cada problema. "É preciso investigar se o
desvio tem uma causa médica.
A falta de selamento labial [boca aberta] pode ocorrer devido
a uma obstrução, uma adenóide hipertrofiada, por exemplo.
Os instrumentos musicais podem ajudar, mas são só coadjuvantes no tratamento", diz.
Para Cristina Camargo, é
preciso analisar cada caso individualmente. "O ideal é que haja sintonia entre o professor de
música e o dentista da criança,
para que os dois possam adequar o instrumento às necessidades de cada pessoa."
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