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foco nele
"Essa banana toda tem de ser aproveitada!"
ANTONIO ARRUDA
DA REPORTAGEM LOCAL
Os 370 milhões de cachos de banana
desperdiçados por ano no Brasil (cerca
de 60% da produção, incluindo os 20%
jogados no lixo já na casa do consumidor) poderiam virar nhoque, sopa, croquete, pastel, pudim e até mesmo brigadeiro. Nas mãos da ex-bananicultora Heloísa de Freitas Valle, 72, a banana verde
adquire um caráter que vai além da utilidade gastronômica -que não é pouca,
diga-se de passagem.
À frente do projeto Pró-Banana Verde,
criado por ela há oito anos e que tem o
apoio da Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar) e do Disque-tecnologia
da USP, Heloísa acredita que sua missão
é maior: "Podemos usar a banana verde
para diminuir custos de produção e aumentar o valor nutricional dos alimentos", diz ela, que transforma 300 g de carne em 1 kg, depois de acrescentar casca de
banana ao produto.
Heloísa, que plantava bananas em suas
terras no Vale do Ribeira, já preparou linguiça de banana verde para professores
da UFSCar e panetone para pesquisadores da Embrapa -Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária. Esses são dois
dos vários locais onde ministrou palestras e promoveu degustações. Recém-contratada por uma empresa alimentícia
de Santa Catarina, Heloísa aguarda ansiosa um laudo que está sendo preparado
por alguns institutos da USP, entre eles o
de microbiologia. "É para uma empresa
de São Paulo que pretende produzir a
biomassa de banana verde para servir
outras indústrias e fazer produtos como
sucos", conta ela, que também lança um
livro de receitas no segundo semestre. E
alerta: "Esse é um projeto do Brasil, não
da dona Heloísa".
Folha - Como a sra. começou a usar banana verde como alimento?
Heloísa de Freitas Valle - Eu era bananicultora, e, quando ia comprar adubo em
uma loja perto da fazenda, no Vale do Ribeira, o vendedor perguntava se eu já havia tomado sopa de banana verde. Curiosa, eu pedia a receita, mas ele nunca dava.
Um dia, quando pus os pés na minha terra, o filho do empregado informou que
haviam roubado todos os mantimentos.
Como só tinha banana -e verde-, pensei: "Vou fazer aquela sopa". Ficou ótima! A partir daí não parei mais de inventar pratos com banana verde.
Folha - Como surgiu e o que é o projeto
Pró-Banana Verde?
Heloísa - Surgiu em parceria com o professor Luiz Márcio Poiani, da UFSCar,
que foi ao Vale do Ribeira e disse: "Nossa,
isso parece um mar de bananas; num lugar como este não há uma indústria que
aproveite isso tudo?". Depois desse encontro -e depois do assalto que comentei-, eu liguei para ele, dizendo: "Olha,
professor, eu descobri umas coisas sobre
a banana!". Nós nos encontramos novamente e, àquela altura, eu já havia feito
hambúrguer, bolinho, nhoque, croquete
e até maionese com a fruta, que fica maravilhosa, e não precisa nem pôr ovo!
Daí, comecei a formatar o Pró-Banana
Verde com o Poiani, que é um projeto para diminuir custos de produção e aumentar o valor nutricional dos alimentos. Temos que transformar o uso da nossa banana verde. Sabia que desperdiçamos
60% da nossa produção e somos o 2º
maior produtor do mundo? Essa banana
toda tem de ser aproveitada.
Folha - E como está o projeto?
Heloísa - Nós estamos nos organizando
mais. Há um grupo de profissionais da
UFSCar, do Ipen (Instituto de Pesquisas
Energéticas e Nucleares), do Disque-tecnologia e do departamento de microbiologia da USP dando orientação e assessoria. Estamos preparando o projeto para
entregar ao CNPQ para ser publicado. Já
temos vários dados, pesquisas que comprovam os benefícios da biomassa. Como você vê, esse é um projeto do Brasil,
não da dona Heloísa.
Folha - O que é a biomassa de banana
verde?
Heloísa - É simplesmente a banana cozida e processada. Estamos estudando se
vai ser necessário algum tipo de conservante, mas a gente já sabe que, fechando
à vácuo e mantendo na refrigeração, essa
massa dura meses. A partir dela é que você faz o pão, o macarrão, a sopa...
Folha - A biomassa já está sendo usada
em alguma indústria?
Heloísa - Depois que dei cursos em Santa Catarina, recebi cartas de prefeitos dizendo que iam pôr na merenda escolar.
Fui contratada por uma indústria do Paraná que quer usar a biomassa para compor as refeições que eles distribuem nas
empresas. Há também uma empresa de
São Paulo que pretende produzir a biomassa para servir outras indústrias e fazer produtos como sucos; essa empresa
só aguarda as análises da USP.
Folha - Se bem utilizada, a biomassa de
banana verde pode reduzir a fome no
país?
Heloísa - As pessoas podem aumentar
muito os nutrientes da sua comida, de
forma simples e barata. Se produzirmos
flocos de banana verde, então, podemos
realmente ser o celeiro do mundo! A pessoa pega os flocos, mistura com água,
com leite, com caldo de sopa, e aquilo já
virou alimento. E podemos exportar!
Folha - Como as pessoas podem conhecer
suas receitas?
Heloísa - Meu livro de receitas deve sair
em quatros meses. As pessoas podem me
achar por e-mail (noelj@uol.com.br) ou
por telefone (0/xx/11/3487-2065).
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