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S.O.S. família
Reuniões em família
Rosely Sayão
Parece que hoje ninguém mais sabe como
viver sem fazer reunião. São reuniões de
trabalho, na escola, por telefone, no almoço. São reuniões
que se estendem por horas, e
todo mundo reclama delas.
Nem as crianças estão livres
dessa praga: as escolas estimulam o trabalho feito em grupo, e
elas precisam se reunir além do
horário escolar. Se elas são produtivas e cumprem esse objetivo, quem sabe?
Mas há um tipo de reunião de
que não ouvimos falar com freqüência: a reunião familiar. E
vejam que não me refiro às reuniões tradicionais e festivas que
ocorrem em determinadas datas, já que nos aproximamos
justamente dessa época. Eu me
refiro às reuniões cotidianas
entre todos os integrantes do
grupo familiar.
A família não se reúne para
conversar, cobrar responsabilidades, distribuir tarefas e avaliar a execução delas, contar e
ouvir as histórias que vive cada
um de seus integrantes e opinar
a respeito delas.
Ouço queixas freqüentes de
mães cujos filhos não colaboram com pequenas tarefas em
casa, não cumprem suas obrigações de estudante, não organizam nem seus brinquedos.
Pois talvez uma das razões disso seja exatamente o fato de as
crianças não saberem como
funciona a família e qual o papel de cada um nesse grupo, a
não ser observando e tirando
suas próprias conclusões e recebendo orientações.
Não é fácil viver em família.
Trata-se de um conjunto de
pessoas diferentes que têm algumas afinidades, compartilham sua vida e exercem papéis
distintos e, no caso de pais e filhos, assimétricos. Fora da vida
familiar, cada um tem um tipo
de experiência e traz para o
grupo, portanto, novos conhecimentos. Por isso, a família
muda a cada dia, já que todos
são diferentes a cada dia.
Além disso, o eixo principal
em torno do qual se reúnem os
integrantes da família são os
afetos, e eles são muito dinâmicos. Todo sentimento tem mais
de uma face, e elas se alternam
no relacionamento familiar.
Por isso, para conseguir a
adesão de todos nesse grupo e
fazer com que ele funcione, de
fato, como uma panelinha, é
preciso atualizar constantemente as relações, as transformações e os pactos. E como fazer isso nesse corre-corre em
que se transformou a vida? Talvez reuniões familiares regulares possam colaborar com a
busca da configuração estável
do grupo, mesmo que ela seja
permanentemente provisória.
A família pode ser um universo envolvente em que seus
integrantes aprendem a distinguir papéis (localizar o seu e
respeitar o dos outros), a organizar o espaço e o tempo de modo a conseguir uma convivência integrante, a negociar conflitos, a reagir de maneira sadia
frente ao que os outros esperam, entre outras experiências
importantes. Mas, para tanto, é
preciso fazer com que todos,
principalmente os filhos, entendam e participem dos modos de funcionamento que estruturam o grupo.
Para que isso ocorra, é preciso promover o encontro -e não
apenas de corpo presente- das
pessoas que fazem parte da família, não é mesmo? O aprendizado solitário a respeito da família pode acabar por produzir
um grande desencontro familiar, que é o que temos constatado de um modo geral.
Entretanto, as reuniões familiares não podem seguir o
padrão das profissionais. Não
se trata de administrar a família como se administra uma
empresa. Não é preciso uma tarefa ou um objetivo específico
para reunir a família. É preciso
apenas disponibilidade para falar, ouvir, silenciar, olhar nos
olhos, expor-se, cobrar e reconsiderar. Assim, todos podem
aprender que as frustrações
que a vida familiar impõe levam a satisfações maiores e que
as tradições de cada família não
são simples caprichos, e sim valores que esse grupo cultiva.
[...] A família não se reúne para conversar, cobrar responsabilidades, distribuir tarefas e contar e ouvir histórias
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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