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São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 2003
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foco nele

Autor relaciona quase 500 modos de beijar

GUSTAVO PRUDENTE
FREE-LANCE PARA A FOLHA


"A mulher ficou em segundo plano. Era ela quem tinha de doar, de fazer sacrifícios. O homem foi criado para agir, para ser predatório. Era o homem em primeiro lugar. Isso se reflete no beijo, que é uma forma íntima de demonstrar afeto, amor, ódio ou desejo"


Beijo. Esse é o objeto de estudo do jornalista Pedro Paulo Carneiro, 40. O interesse pelo assunto surgiu cedo, aos 17 anos, quando ele deu seu primeiro beijo "marcante". Dez anos depois, a pesquisa, que começou quase por brincadeira, ganhou metodologia. O "beijólogo" elaborou um questionário com 12 perguntas e, ao longo de 13 anos, entrevistou mais de 16 mil pessoas no Brasil e em vários países, entre eles Reino Unido, França, Indonésia e Estados Unidos.
Além de depoimentos inusitados, Carneiro reuniu informações sobre a história do beijo e listou 484 formas diferentes de beijar. O resultado da pesquisa é o livro "Dossiê do Beijo", que deve ser lançado pela editora Catedral das Letras no final deste mês. Leia entrevista abaixo.

Folha - Qual o primeiro registro de beijo na história?
Carneiro -
Nas cavernas de Khajuraho, na Índia, há a primeira manifestação precisa e cultural do beijo erótico de que se tem notícia. No meu entender, a Índia é o país onde mais o beijo se desenvolveu. Das centenas de formas de beijar que descobri, quase metade é de lá. O beijo é cultural, e eles vão muito a fundo na questão corporal, no ato de se sentir bem. Afinal, o "Kama Sutra" surgiu na Índia.

Folha - Quais são as diferenças culturais do beijo?
Carneiro -
A liberalidade de nossa sociedade é transmitida para o beijo, que é realmente mais puxado para o erótico. Aqui, não existe o pudor do beijo de língua na rua. Mas, na Índia, não se beija na rua. Na China e no Japão, muito menos. É algo olhado com espanto, até com desprezo. Na China, antigamente, um casal pego beijando na rua tomava uma surra de bastão. Os chineses chegaram até mesmo a desenvolver um "beijo do silêncio", porque as paredes de suas casas eram muito finas, e a acústica, grande. Dessa forma, era possível curtir sem ser escutado. Em Londres, apesar de ser uma cidade liberal, você não vê muita gente se beijando na rua. Já dentro das casas noturnas, onde as pessoas se soltam, o beijo é liberado e é talvez mais lascivo que o brasileiro. Na Rússia, os homens se beijam de língua para selar a amizade. O beijo é também um elemento de ligação social, um contrato de amizade. Ao beijar alguém, a pessoa está dizendo para o outro que o aceita em seu grupo.

Folha - O que você descobriu de mais interessante em 13 anos de pesquisa?
Carneiro -
O mais interessante são os depoimentos, como o de uma mulher de 87 anos, que teve nove filhos com o mesmo homem e nunca deu um beijo na boca dele. A primeira e única vez que ela o beijou foi no caixão -e na testa. Ou seja, fazer sexo podia, beijar na boca, não. Há também algumas histórias inusitadas, como a do prefeito de Sorocaba (SP) que, em 1983, proibiu o beijo na rua.

Folha - Homem e mulher beijam de maneira diferente?
Pedro Paulo Carneiro -
Durante muito tempo, no Brasil e em todo o mundo, a mulher ficou em segundo plano. Era ela quem tinha de doar, de fazer sacrifícios. O homem foi criado para agir, para ser predatório. Era o homem em primeiro lugar. Isso se reflete no beijo, que é uma forma íntima de demonstrar afeto, amor, ódio ou desejo. O homem, em geral, está preocupado em deixar uma boa impressão, em enfiar a língua na boca da mulher, fazer um "liquidificador". A mulher, não. Ela vai para o beijo com instinto romântico, de doação, de dar prazer.

Folha - Quais os tipos de beijo mais comuns?
Carneiro -
O "selo" seco, o "selo" molhado e o beijo de língua em cruz, em que as duas pessoas que estão se beijando inclinam suas cabeças para lados opostos, formando uma cruz. Infelizmente, porém, o "selinho" é o mais popular. É a mecânica de repetição, o beijo do casamento e dos namoros longos. Se você conviver muito tempo com uma pessoa, vai ver que o beijo de bom-dia e de boa-noite é sempre o mesmo. Em meu livro, chamo a atenção para que as pessoas se beijem sempre de formas diferentes.

Folha - E quais os mais inusitados?
Carneiro -
Há o beijo indiano que anestesia o céu da boca por alguns segundos. É uma técnica que inclui pressionar três vezes a língua na gengiva da outra pessoa. Existe também o "rodutor", um beijo africano no qual um parceiro morde a língua do outro até sangrar e depois a beija, chupando a língua e o sangue. Há outra modalidade indiana em que uma das pessoas passa pimenta na boca e beija imediatamente a outra. Quando começa a arder, as duas pegam um cubo de gelo e chupam juntas. Experimentei todos esses tipos. Das mais de 500 variações de beijo que eu encontrei, 484 eu aprovei.

Folha - Qual o seu beijo preferido?
Carneiro -
O beijo mais gostoso é o imprevisível. E o predileto acontece quando as bocas se casam, quando existe a química, quando as duas pessoas se doam. Pode ser o "selo" ou o beijo indiano de anestesiar o céu da boca. Na verdade, um "selo" pode ser maravilhoso, tudo depende da carga emotiva que você dá. Por exemplo: chegue perto de uma pessoa, olhe nos olhos dela, pegue em sua nuca e faça uma massagem naquela região. Vai fazer com que o sangue flua melhor e ela fique relaxada. Chegue perto, encoste o lábio -sem beijar- e inspire a pessoa. Só depois de respirar, dê um leve beijo. Você vai ver que diferente!


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