São Paulo, quinta-feira, 18 de março de 2010
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DEFICIÊNCIA

A terapia da horta

Importado da Coreia, projeto de horticultura terapêutica ajuda deficientes intelectuais

FLÁVIA MANTOVANI
EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO

Quem gosta de jardinagem costuma dizer que a atividade é "terapêutica": botar a mão na terra, seguir o ritual da rega periódica e acompanhar o crescimento da planta podem, de fato, fazer com que a pessoa se esqueça dos problemas e da correria da vida diária.
Pois agora uma entidade sem fins lucrativos decidiu levar isso a sério e passou a oferecer horticultura terapêutica para deficientes intelectuais de baixa renda. A Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência) importou o método da Coreia do Sul -lá, ele é usado com idosos e é alvo de estudos no National Horticultural Research Institute.
Do fim do ano passado para cá, foram 12 encontros de duas horas com 32 pessoas, 16 deficientes e 16 familiares, na sua unidade em Riacho Grande, São Bernardo (Grande São Paulo). Atualmente, a instituição avalia os resultados desse projeto piloto -se tudo der certo, a ideia é que ele se torne uma atividade permanente nessa e em outras unidades.
Segundo Alexandra Melo, gerente de unidade da Avape, a participação dos parentes é ponto chave no programa. "A ideia é resgatar os vínculos familiares. Atendemos muitas famílias com relações conturbadas, que superprotegem ou negligenciam o deficiente. Isso interfere na reabilitação deles."
Ela afirma que a nova oficina é diferente da simples jardinagem, que já era oferecida no local anteriormente. "Antes, tratava-se de uma atividade mais ocupacional. Agora, cada encontro tem um objetivo terapêutico bem definido, com começo, meio e fim", diz.
Os participantes plantam as mudas, regam as plantas, acompanham o crescimento e replantam em vasos decorados por eles. O objetivo é trabalhar questões como cooperação, afetividade, responsabilidade, senso crítico e criatividade.
Além de dois biólogos, uma psicóloga e um assistente social acompanham a oficina. Após cada sessão, há discussão sobre o que foi trabalhado naquele dia. "É feita uma avaliação inicial da família com testes psicológicos, que são reaplicados no final do processo", afirma Melo.
Ela diz que já deu para perceber uma melhora na afetividade. "Atendemos mães com sérias dificuldades para demonstrar carinho, elogiar o filho. Nesse ponto já sabemos que o projeto foi muito significativo."
Em um dos encontros finais, os participantes aprendem a preparar um prato com as hortaliças plantadas. Foi aí que a dona de casa Olívia da Silva, 59, surpreendeu-se com sua filha, Kely de Santana, 30. "Ela nunca tinha comido alface. Eu tinha que bater as folhas com frutas e dar na forma de vitamina, para "tapear". Dessa vez ela comeu tudo", lembra.
Kely tem deficiência intelectual e, ultimamente, a mãe a vinha notando arredia. "A oficina foi muito importante, fez com que a gente se aproximasse mais. Ela ficou mais próxima e voltou a me procurar", diz.
Kely plantou alface, rúcula e flores -sua preferida era o amor-perfeito, da qual levou um galhinho para casa.


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