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ROSELY SAYÃO
Adolescência antecipada
A garotada de dez e 11
anos não se identifica
mais como criança.
Responsabilidade
nossa, que temos tido toda a
pressa do mundo para colocar
as crianças no mundo adulto.
Conversamos com crianças
pequenas e oferecemos explicações como se pudessem entender a complexidade de determinados fatos do mundo
adulto e lidar com eles; estabelecemos pequenos contratos
(os "combinados") como se elas
tivessem o mesmo estatuto do
adulto e pudessem cumprir sua
parte; fazemos com que freqüentem locais antes exclusivos dos adultos com a desculpa
de que precisam conhecer o estilo de vida dos pais; exigimos
que façam escolhas como se já
soubessem arcar com a renúncia e tivessem autonomia para
tanto e, para coroar, chamamos
as crianças da idade mencionada de pré-adolescentes.
Bem, isso gera inúmeras conseqüências, e vou tratar de uma
bem importante: a entrada precoce das crianças dessa idade
no relacionamento erótico-afetivo. Por sinal, uma leitora que
é mãe de uma garota de 11 anos
constatou que crianças dessa
idade -e até de um pouco menos- têm solicitado aos pais
permissão para namorar. Eu já
percebi também que crianças
dessa mesma faixa de idade
usam ofensas de caráter erótico
para intimidar colegas.
Quando as crianças pedem licença aos pais para namorar, é
preciso ouvir o pedido além das
palavras pronunciadas. Crianças dessa idade não costumam
pedir autorização para transgredir regras, para fazer o que
querem, mesmo que escondido. Elas fazem mesmo sabendo
que não deveriam. Se pedem, é
sinal de que não conseguem dar
conta sozinhas e de que precisam do adulto.
A vontade de "namorar" foi
plantada de inúmeras formas e
elas nem sabem se querem
mesmo. É bem provável que
não, já que ainda têm outros interesses muito mais pertinentes ao mundo infantil. Mas, do
mesmo modo que não têm discernimento para perceber isso,
não têm condições de fazer
frente à pressão social para que
assim se comportem.
Talvez seja exatamente a
proibição dos pais o que elas
buscam e do que precisam. Afinal, é muito mais fácil responsabilizar o "pai careta" ou a
"mãe chata" por qualquer restrição ou diferença.
É preciso também ouvir a
idéia que elas têm sobre namoro. Quando uma garota que
completaria 11 anos me contou
que tinha namorado, perguntei
o que faziam juntos. "Fico encostada nele, pego na mão, beijo", disse. Quando perguntei se
também conversavam, ela reagiu com um sorriso e um suspiro, que interpretei como "Em
que mundo você vive?".
É isto: a idéia que as crianças
têm de namoro -construída
com nossa permissão- está ligada às sensações corporais
apenas, não mais ao diálogo
que busca o conhecimento mútuo, tampouco às emoções e ao
compromisso.
Como assinalou a leitora, não
dá para os adultos encararem
essa situação como uma "inocente brincadeira de faz-de-conta". Não nessa idade. Isso
ocorre antes dos seis anos,
quando as crianças imitam a vida dos adultos.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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