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Rosely Sayão
Trânsito e cidadania
O comportamento no
trânsito, de motoristas e de pedestres,
anda deplorável. A
todo momento, cenas lamentáveis ocorrem: motoristas insultam e ameaçam outros motoristas ou pedestres e usam o
carro como se fosse uma arma.
Parece uma guerra.
E o problema não é só nosso:
recentemente, a França realizou o "dia da cortesia no trânsito", em que manter o sangue
frio em todas as circunstâncias,
sobretudo nos engarrafamentos, e respeitar pedestres,
crianças e ciclistas foram
orientações dos "dez mandamentos da cortesia ao volante",
divulgados nesse dia.
Um dos motivos desse caos é
que as pessoas não entendem
que o espaço que usam com
seus veículos é público. Ao entrar em um carro, propriedade
privada, a fronteira entre o público e o privado, que já anda tênue, parece se dissipar. Ao dirigir ou andar nas ruas, as pessoas agem como se cada uma
estivesse unicamente por si: ignoram os outros ou se sentem
atrapalhadas por eles.
As regras e os sinais de trânsito, que existem para ordenar
esse espaço público, são desrespeitados repetidamente. Há
movimento intenso no entorno
da escola e o filho está atrasado? Poucos pais vacilam na decisão de parar em local proibido ou em fila dupla. Poucos hesitam em fazer um retorno
proibido para encurtar o caminho ou mesmo em dirigir em
velocidade maior do que a permitida para chegar mais rápido.
Até parece que os sinais de
trânsito são meros caprichos
de um grupo desconhecido de
pessoas. Ninguém mais parece
entender que as leis de trânsito
-aliás, como todas- existem
para proteger os cidadãos, e
não para agredi-los ou restringir suas vidas. Mas a questão é
que o direito de cada um no caso do trânsito -a segurança-
só é garantido quando ele próprio respeita as leis.
Pelo jeito, o carro deixou de
ser um veículo de transporte
cujo objetivo é levar as pessoas
de um local a outro. Virou sinônimo de poder ou de status.
Uma pesquisa britânica mostrou que dois em cada três homens trocariam suas namoradas pelo carro de seus sonhos,
vejam só!
A idéia de cidadania ganhou
tom pejorativo por causa do individualismo, e isso pode ser
constatado principalmente no
trânsito. Cidadania supõe se
responsabilizar pelo coletivo e,
sobretudo no trânsito, o que vemos são atitudes de confronto e
de competição. Creio que não é
exagero afirmar que vivemos
tempos de barbárie nessa questão: cada um por si, e vale tudo
para atingir a meta pessoal.
Quando os adultos se comportam assim, ignoram também que colocam os mais novos em risco. São os jovens as
maiores vítimas de acidentes
de trânsito ou de brigas por desentendimentos com outros
motoristas, pedestres ou motociclistas. Isso sem falar nas lições de incivilidade e de grosseria que são passadas a eles. E os
velhos? Eles que não se atrevam a dirigir ou a andar pelas
ruas. Afinal, lugar de velho e de
criança não é mais na rua. Não é
isso o que temos cultivado?
Precisamos continuamente
lembrar -e praticar- que, no
trânsito, o respeito às leis e os
bons modos permitem maior
qualidade de vida a todos nós.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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