São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 2000
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s.o.s. família

Meu filho fuma maconha. Onde eu errei?

Rosely Sayão

" Descobri que meu filho de 15 anos está fumando maconha, e agora a nossa relação se tornou quase impossível, pois não consigo aceitar a situação." Esse é um trecho de uma correspondência que um leitor enviou, mas poderia ter sido enviada por qualquer pai ou mãe que tenha filho adolescente em casa.
Incidentes acontecem. E, quando acontecem, principalmente em casa de pais que investiram e continuam dando duro na educação dos filhos, geralmente costumam provocar intensas reações.
A primeira e fatal pergunta que os pais costumam fazer nesse momento é: "Onde foi que eu errei?".
Não: nem sempre houve erro, ausência, descaso, falta de amor ou de diálogo com os filhos que justifique o comportamento deles. Portanto a culpa dos pais, que provoca esse questionamento, deve ceder lugar à responsabilidade. E isso significa aceitar o fato para poder continuar agindo ativamente na educação dos filhos.
Aceitar o fato não significa achar normal que o filho fume maconha. Longe disso.
Aceitar o fato significa apenas não se revoltar com o que o filho está fazendo, não ignorar o acontecimento, tampouco deixar que as coisas se resolvam sozinhas. Significa considerar o que está acontecendo para que a maneira de conduzir a educação do filho se adapte à circunstância.
Primeiro é bom entender que é difícil passar pela adolescência. Nesse período, o filho tem que sair da total dependência que tem dos pais para viver, que caracteriza a infância, e partir para a independência, para a autonomia da vida adulta.
Mas isso não acontece de forma mágica. É um processo de descoberta, de estranhamento, incertezas, conflitos, angústias, incoerências e muito mais. Os filhos sofrem muito com essas transformações, pois delas são vítimas, e isso gera revolta, pois não é fácil abandonar a infância.
O filho, que até então se sentia protegido, precisa enfrentar o mundo exterior por sua própria conta e risco. E é nesse mundo que o adolescente experimenta a liberdade que está ganhando. Um dos modos de o filho comunicar aos pais que agora ele é livre, independente, é desafiando o proibido. É um jeito, meio desajeitado sem dúvida, de ele distinguir-se dos pais, diferenciar-se deles. Aí é que entra a droga, que invade nossa sociedade.
É justamente quando o filho deixa os pais perceberem que está usando drogas que ele mais precisa dos pais, da presença educativa deles. Por isso o pai que me escreveu precisa superar a frustração de saber que o filho fuma maconha para, então, poder ajudá-lo a se desenvolver.
Educar é difícil. Para aprender a enfrentar as dificuldades que aparecem, é preciso encarar a frustração e continuar brigando.
Geralmente o jovem usa a droga para se desconectar dessa realidade que ele vive e que o faz sofrer com tantas frustrações. Os pais não podem, portanto, fazer o mesmo: eles precisam assegurar a educação dos filhos até sua maioridade.
Fazer o quê? Continuar cuidando do filho naquilo que ele precisa para que ele vá aprendendo, pouco a pouco, a se cuidar sozinho; apontar sempre as leis e os familiares que o jovem deve acatar, mas sem ultrapassar jamais o direito à liberdade do filho. Em termos práticos isso significa, por exemplo, proibir o uso da maconha em casa, deixar de dar o dinheiro que permite que ele compre a droga e restringir alguns programas que o filho faz. Cada família encontra o seu jeito de praticar a discreta vigilância sobre a liberdade do filho. Mas, para que a vida do filho não seja invadida, é preciso equilíbrio.
É, educar é tão incerto e difícil quanto viver.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br


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