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s.o.s família - rosely sayão
Deslizes de educador quando há namoro na escola
Recebi uma correspondência muito instigante de uma leitora de 16 anos que nos
ajuda a refletir bastante sobre a educação que
temos praticado, principalmente com adolescentes, no espaço escolar. Ela conta que as regras da escola que frequenta -e ela reconhece que toda escola precisa ter suas regras- estão mudando muito rapidamente e sem que
os alunos opinem a respeito do assunto. A
questão em jogo é o namoro na escola. A
história é boa porque reflete o que ocorre
em boa parte das escolas.
Primeiro ato: a aluna namora um garoto
do mesmo colégio. Nos intervalos, ficam
juntos -como outros casais-, abraçam-se
e beijam-se na frente dos demais, inclusive
dos mais novos. Não há regra para isso.
Segundo ato: depois de um tempo em que
isso acontece regularmente, o diretor aparece no intervalo e avisa que, daquele dia em
diante, está proibido o namoro na escola.
Os casais entendem que isso significa não
poder mais beijar em público e deixam de
fazê-lo, mas continuam juntos aos pares e
abraçados.
Terceiro ato: a escola comunica que é
proibido o contato físico nos intervalos por
causa das crianças menores. Final da peça:
os alunos se revoltam e comentam que já viram o diretor beijando a namorada e que é injusto que ele proíba os alunos de fazerem o
mesmo que ele faz. Quantos equívocos da parte dos que deveriam educar, não? E o pior de
tudo isso é que quem arca com o resultado
desses deslizes são os que deveriam receber a
educação.
O primeiro equívoco -e não em ordem de
importância: a escola não considerar que, havendo alunos adolescentes, as manifestações
da sexualidade surgem e são legítimas. Uma
escola de ensino médio, principalmente, que
não planeja suas ações educativas ante essas
questões não exerce sua competência nem sua
responsabilidade.
O segundo equívoco: deixar de ensinar aos
alunos o âmbito do público e do privado. Proibir, pura e simplesmente, o namoro na escola
é tratar os adolescentes como crianças incapazes de aprender a se responsabilizar por suas
ações no espaço que é de todos, de distinguir o
que faz parte da vida privada e do que é parte
do convívio social e também de compreender
que, quando se está em grupo, as liberdades
individuais ficam, naturalmente, cerceadas.
Além disso, proibir o namoro é mais ou menos o mesmo que esperar que o aluno seja responsável com seus estudos. Esses são conceitos abstratos que precisam ser clareados para
que possam ser assumidos.
O terceiro é consequência do anterior: se os
alunos não discutem as questões, não participam da elaboração das regras, não vão obedecer a elas. E, quando não há fundamentação
legítima para as regras impostas, reagem na
mesma altura. Acham-se no direito de julgar o
comportamento da vida privada do diretor
porque, da mesma forma, são julgados. Isso é
fruto da ordem igualitária que se instalou na
escola: os educadores tentam convencer os
alunos à obediência usando argumentos
-em geral moralizantes- que visam controlar seu comportamento.
Para propor regras para o relacionamento
amoroso na escola, é preciso ter em mente o
objetivo da presença dos alunos na escola e o
limite do tolerável e do intolerável na convivência no espaço público. E isso requer o estabelecimento de limites claros e de princípios
que devem ser respeitados por todos. Viver
em grupo exige disciplina, e isso se aprende na
prática, principalmente na escola.
Nossa leitora precisa aprender que nem
sempre é possível chegar a um consenso a respeito das regras de convivência, mas, mesmo
assim, elas precisam ser respeitadas em nome
do coletivo. Só que, para chegar a essa compreensão, ela precisa de educadores que ensinem as diferenças entre os interesses individuais e os coletivos. As escolas estão cientes
dessa questão? Infelizmente, pela reação dos
alunos, parece que não. E é aí que entra o papel
importante dos pais: cobrar da escola essa
atuação, que, apesar de ser uma árdua tarefa, é
fundamental para a formação de seus alunos.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha); e-mail:
roselys@uol.com.br
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