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Beleza venenosa
Cosméticos e itens de higiene escondem um lado nada limpo em suas fórmulas. A maioria usa vários desses produtos por dia, mas desconhece o que anda passando no corpo, no cabelo, no rosto. Melhor saber
IARA BIDERMAN
DE SÃO PAULO
Em uma típica rotina de higiene e beleza, você talvez
comece o dia esfregando lauril sufato de sódio em toda a
pele e no couro cabeludo.
Depois, pode espalhar diazolidinyl urea no rosto, parabeno no corpo e passar sal de
alumínio nas axilas. Certos
dias, talvez inclua camadas
de formaldeído nas unhas e
de peróxido de hidrogênio e
amônia nos cabelos.
Você pode não ter a menor
ideia do que sejam essas
substâncias, mas elas estão
na maior parte dos cosméticos -sabonete, xampu, hidratante, desodorante, esmalte e tintura para cabelos.
E daí? São substâncias
proibidas? Não, mas podem
significar riscos à saúde. Segundo associações de consumidores, fabricantes de cosméticos, mesmo sabendo
disso, continuam usando esses ingredientes e não divulgam os problemas relacionados a essas substâncias.
Terrorismo verde? Bem, o
vídeo "The Story of Cosmetics" (www.storyofcosmetics.org), que aponta os potenciais perigos de componentes encontrados na maioria dos cosméticos, pode deixar muita gente aterrorizada.
No vídeo, câncer, distúrbios neurológicos e infertilidade são associados a xampus, cremes, desodorantes e
até itens para bebê. O intuito
é alertar sobre o perigo oculto
nas fórmulas e pressionar as
autoridades para aumentar o
controle sobre os produtos
de beleza e higiene, proibindo os mais tóxicos.
Mas ninguém controla o
que vai no creminho que você passa ao redor dos olhos
ou no talquinho do bebê?
Mais ou menos, dizem os
militantes dos cosméticos
"limpos". Como boa parte
dos testes de segurança é fornecida pelos próprios fabricantes, resta uma enorme
margem de dúvida sobre os
resultados apresentados.
No Brasil, o terceiro maior
mercado de cosméticos do
mundo, é a Anvisa que regulamenta esses produtos.
QUESTÃO DE DOSE
A agência divide os cosméticos em dois grupos. O grau 1
inclui os considerados mais
simples na formulação e nos
efeitos prometidos, como
condicionadores, xampus,
sabonetes. Esses não são
submetidos à análise. Basta
uma notificação da empresa.
Os produtos grau 2 (alisantes, antitranspirantes, tintura de cabelo) precisam de registro e passam por análise
técnica. Os fabricantes têm
de apresentar documentos
para comprovar que as substâncias estão dentro dos limites considerados seguros.
Aí que a coisa pega entre
os militantes dos cosméticos
limpos e a indústria. Respaldados pela lei, fabricantes dizem que, embora alguns
itens sejam tóxicos, as doses
usadas não oferecem riscos.
Afinal, homeopatas (mais
afinados com o povo "limpo"
do que com a indústria química) são os primeiros a dizer
que a diferença entre veneno
e remédio está na dose.
O time que luta por cosméticos mais seguros admite
que a química de cada produto, individualmente, não faz
mal. Acontece que ninguém
usa um só. Calcula-se que,
por dia, mulheres usem dez e
homens, seis produtos.
Dia após dia, ano após
ano, pequenas quantidades
de produtos tóxicos vão se
acumulando no organismo.
"Em longo prazo, esses
cosméticos trazem problemas", diz Edilene Costa, da
Abrapan (Associação Brasileira de Produtos Artesanais,
Naturais e Bem-Estar) -criada para apoiar empresas de
"produtos naturais" (conceito vago e sem regulamentação clara) e conscientizar o
consumidor da importância
desses produtos para a saúde
e o ambiente.
No site da Abrapan
(www.abrapan.org.br) há
uma lista de substâncias inseguras encontradas em cosméticos. É um começo.
"O consumidor deve ler os
ingredientes que compõem o
produto e buscar informação", diz Costa.
Não é tão simples. As letras são minúsculas nas embalagens, e há siglas indecifráveis para quem não é formado em química.
Você pode fazer uma busca no banco de dados de cosméticos seguros do EWG
(grupo de trabalhos ambientais, na sigla em inglês). No
site www.cosmeticdatabase.com, você digita o nome
da substância para descobrir
os tipos de risco que oferece e
em que produtos aparece.
Superada a dificuldade de
decifrar a fórmula, vem outra
questão: encontrar alternativas seguras de produtos.
No Brasil, não há um regulamento oficial para cosméticos ecológicos, orgânicos ou
naturais. Uma saída é procurar produtos com selos de
certificadoras reconhecidas,
como a Ecocert, que tem origem francesa e ramos em vários países, incluindo o Brasil, e o IBD, que trabalha com
as certificadoras NSF (EUA) e
a Natrue (Europa).
A outra dificuldade é se
acostumar com produtos que
não usam as substâncias químicas habituais.
"Na percepção do consumidor, cosmético natural
não tem muita eficácia", crê
Christine Itagaki, gerente da
Weleda, marca suíça de cosméticos e medicamentos.
Para Clélia Angelon, presidente da Surya, marca brasileira de cosméticos orgânicos
certificados, o brasileiro ainda confunde aspectos sensorais do produto -fazer espuma, ter determinado aroma-
com eficiência.
"É preciso educar o consumidor. Já temos [no Brasil]
várias opções de cosméticos
sem substâncias tóxicas e de
excelente performance", diz.
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