São Paulo, quinta-feira, 21 de outubro de 2004
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outras idéias

wilson jacob filho

Envelhecer bem pode ser uma escolha

Nunca tivemos, em nenhum outro período da história do homem, tanta chance de envelhecer.
Em nenhum tempo passado houve igual possibilidade de nos tornarmos idosos. Paradoxalmente, porém, ainda é muito forte o sentimento de rejeição por esta que constitui a fase mais longa do desenvolvimento humano. Continua intensa a busca pela utópica "juventude eterna" ou pela ilusória "fonte da juventude".
Não é difícil, porém, compreender os caminhos que seduzem a esta incansável procura. A freqüente confusão entre os efeitos da senescência (decorrentes do processo natural de envelhecimento) e os da senilidade (conseqüentes ao acúmulo de doenças crônicas) favorecem o mal entendimento do processo e alimentam o estereótipo do idoso obrigatoriamente decrépito e limitado.
Há que se entender que ambos fenômenos ocorrem simultaneamente, mas são distintos. O primeiro, comum a praticamente todos os seres vivos, evolui de forma progressiva e raramente causa uma limitação importante para as atividade do cotidiano. O segundo, determinado por fatores genéticos e ambientais ou principalmente por hábitos e costumes, desenvolve-se imperceptivelmente por anos e, em algum momento, emerge para mostrar sua agressividade em causar danos e limitações.
A freqüente confusão no entendimento destes processos fomenta o temor pelo envelhecer a ponto de, erroneamente, um idoso saudável ser chamado de "jovem" e de um adulto debilitado ser chamado de "velho".
Ambos casos, ao meu ver, explicitam nítido preconceito.
Em qualquer idade podemos ter saúde ou apresentarmos limitações decorrentes, em essência, das doenças inadequadamente tratadas.
O que deve ser prevenido, detectado e combatido, portanto, não é o envelhecimento, mas sim o conjunto das enfermidades que pode vir a prejudicá-lo, atualmente denominado co-morbidades.
Raramente alguém costuma ser corretamente identificado como "vivendo a plenitude da sua senescência" ou de "estar sofrendo das mazelas da sua senilidade".
Criássemos nós este hábito, muito contribuiríamos para o melhor entendimento desta evolução e, certamente, reduziríamos de maneira substancial a ojeriza popular pelo envelhecimento. Em conseqüência, incentivaríamos duas atitudes de forte impacto social neste tema: assumir a responsabilidade de que cada uma das nossas ações em prol (ou em detrimento) da saúde atual será determinante do nosso estado funcional no futuro; e reconhecer que a nossa melhor opção será envelhecer, visto que só se priva desta experiência aqueles que morrem precocemente.
Podemos, porém, escolher sermos ativos ou passivos nesta evolução. Conhecimentos, já os temos. As formas de aplicá-los encontram-se cada vez mais aprimoradas. Cabe-nos, pois, exercer a nossa capacidade de ser partícipes eficientes na orientação desta trajetória.
Como veremos, em oportunidades próximas, foram as medidas simples, objetivas e práticas que mostraram ser as mais eficazes.
Quem aprender a dirigir bem seu veículo, não só fará uma longa viagem, mas terá melhores condições para desfrutar da paisagem.


Wilson Jacob Filho, 51, é professor da disciplina de geriatria da Faculdade de Medicina da USP e Diretor do Serviço de Geriatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. E-mail wiljac@usp.br


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