São Paulo, terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
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NEURO

SUZANA HERCULANO-HOUZEL - suzanahh@gmail.com

Que hora é hora de dormir?

Engana-se quem acha que pode mudar o horário de sono o tempo todo impunemente

VOCÊ JÁ DEVE TER NOTADO que costuma sentir sono mais ou menos no mesmo horário todas as noites. Uma questão de hábito, talvez?
Em parte, sim: adormecer tem um componente de condicionamento, uma associação entre estímulos específicos e sempre um mesmo resultado, o sono. Por isso as recomendações de pediatras e neurologistas quanto a bons hábitos de sono fazem sentido: ter uma rotina (aquele banho mais longo à noite, seguido pela roupa especial de dormir e pelo apagar das luzes), dormir bem alimentado (para não acordar com fome no meio da noite), só deitar na cama na hora de dormir, não ficar brincando de joguinhos eletrônicos excitantes na cama.
Sexo, claro, "pode": embora seja estimulante, a tendência para homens e mulheres é relaxar física e mentalmente a seguir, e adormecer logo.
Engana-se, contudo, quem acredita que pode mudar impunemente o horário de sono o tempo todo. Trocar o dia pela noite constantemente é péssimo para o cérebro.
Não só se perdem várias horas de sono no processo, que cobram a conta depois (com aquela sensação de cansaço e falta de atenção), como os ritmos internos do corpo, temperatura, metabolismo e produção de hormônios ficam desencontrados com o sono.
Para crianças, sobretudo, vale o que as avós diziam: é durante o sono que se cresce.
O pico de produção de hormônio do crescimento acontece no início da noite; se não se está dormindo nessa hora, perde-se a dose do dia.
Além disso, há um horário interno mais propício ao sono de cada um. Assim como variações genéticas determinam se você é louro ou moreno, claro ou escuro, outras variações conhecidas podem fazer com que você naturalmente tenda a adormecer cedo e acordar de madrugada (esses são os matutinos), ou, ao contrário, a adormecer especialmente tarde e só acordar lá pelas dez da manhã (os vespertinos).
Para essas pessoas, acordar fora do horário "normal"" (no sentido estatístico) é quase doloroso. A diferença está nos genes que regulam a hora do dia em que nosso relógio autônomo interno troca o modo "dormir" pelo modo "acordar". Funciona até na mosquinha da banana: basta uma variação genética para transformá-las em madrugadeiras ou notívagas.
Se você é um desses casos fora da norma, portanto, respeite-se. Mais difícil, contudo, é conseguir o respeito dos outros...


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com


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