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saúde
Toque terapêutico
Hospitais nos EUA passam a oferecer massagens para compleme ntar tratamento; no Brasil, alguns médicos indicam, mas afirmam que não substitui medicina tradicional
FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Q
ue uma boa massagem tem o poder de
relaxar e renovar as
energias é algo de
que pouca gente duvida. Quem
costuma freqüentar a maca de
um massoterapeuta certamente já experimentou a sensação
de "sair flutuando", "como novo", de uma sessão.
Pois essa prática milenar
chegou às receitas médicas.
Nos EUA, vários hospitais já
oferecem massagens terapêuticas para complementar o tratamento de doenças como enxaqueca, escoliose, má circulação,
fibromialgia e hipertensão.
Uma pesquisa divulgada em
julho do ano passado pela American Hospital Association
mostrou que, dos 1.394 hospitais ouvidos, 370 (26,5%) oferecem algum serviço de medicina
alternativa ou complementar
-mais da metade devido à percepção de sua eficácia no dia-a-dia da clínica. Em 1999, quando
o estudo começou a ser feito,
esse índice era de apenas 7,7%.
Entre os tratamentos incluídos, a massagem é o mais presente: é oferecida em 71% deles.
Hospitais ligados a universidades consagradas, como a Columbia e a de Stanford, são alguns dos que oferecem a "terapia do toque". No Stanford
Hospital & Clinics, os benefícios atribuídos à massagem pelo Centro de Medicina Integrativa incluem "reduzir a dor",
"aumentar o fluxo sangüíneo" e
"diminuir a tensão muscular".
O hospital oferece modalidades que vão da tradicional massagem sueca à chamada "deep
tissue" (pressões que ajudam a
reduzir a tensão muscular).
"Nos últimos sete anos, a demanda dos médicos pela massagem vem aumentando. Por
exemplo, uma equipe que faz
uma cirurgia neurológica chamada estimulação cerebral
profunda agora está pedindo
que um massoterapeuta trabalhe junto na sala de operação",
disse à Folha Teresa Reyna, diretora de programas e operações do hospital.
"Massagear os músculos e os
tecidos moles estimula os nervos, aumenta o fluxo sangüíneo
e alivia o estresse muscular",
anuncia o site do New York-Presbiterian Hospital, ligado à
Universidade Columbia. Lá,
pacientes que acabam de passar por uma cirurgia cardíaca,
por exemplo, têm direito a pelo
menos uma sessão de massagem. O hospital possui ainda
um centro para pesquisar a eficácia do método no tratamento
de doenças.
No Boone Memorial Hospital, em Madison, o serviço existe desde 1999 e foi criado "para
atender à demanda crescente
da comunidade". Outro exemplo é o California Pacific Medical Center, centro médico acadêmico no qual técnicas como
massagem sueca, acupressão
(massagem nos mesmos pontos que norteiam a acupuntura) e "deep tissue" estão à disposição das pacientes atendidas no setor de saúde feminina.
No Brasil
Por aqui, ainda é raro encontrar esse tipo de serviço. A Folha entrou em contato com diversos hospitais de São Paulo,
particulares ou ligados a universidades como a USP (Universidade de São Paulo) e a
Unifesp (Universidade Federal
de São Paulo), mas nenhum deles oferece massagem como
complemento a tratamentos.
O que acontece é que alguns
médicos, individualmente, recomendam que seus pacientes
procurem a técnica. Como a capacidade de aliviar tensões musculares é um dos efeitos da
massagem mais aceitos entre
os médicos, as indicações mais
freqüentes são de áreas como
medicina esportiva, ortopedia e
fisiatria.
"Indicamos bastante, principalmente para reduzir as dores
musculoesqueléticas. Complementa o tratamento e geralmente traz muito alívio. Só fica
difícil em casos crônicos", diz o
fisiatra Gilson Shinzato, do
HCor (Hospital do Coração) de
São Paulo.
O médico costuma receitar a
massagem para dores e espasmos musculares, principalmente como uma preparação
para os alongamentos. "O
shiatsu e a acupressão, por
exemplo, podem ajudar a preparar os pacientes para fazer
esses exercícios sem dor."
Segundo Shinzato, a massagem também pode ser útil para
quem passou por uma cirurgia
cardíaca. "Alguns pacientes
sentem uma dor torácica que
lembra um infarto. Isso assusta
muito. Uma terapia manual
bem feita pode fazer a dor desaparecer e aliviar a angústia. O
aspecto psicológico, de conforto ao paciente, aliás, é sempre
muito importante na massagem", lembra.
Ele alerta, no entanto, para as
contra-indicações: "Quem tem
infecção, trombose, problema
de coagulação ou osteoporose
muito grave não deve fazer".
Com diversas hérnias de disco, a terapeuta floral Vera Lúcia
Seixas Lopes, 60, passou por
vários médicos, ficou dois meses de cama e cogitou a possibilidade de uma cirurgia -até
que foi a um ortopedista que indicou a massagem. "Cheguei a
tomar morfina, mas nada resolvia. Encontrei um médico que
disse que eu não podia ficar tomando antiinflamatórios a vida
toda e me encaminhou para a
massagem. A dor diminuiu
muito", conta.
O massoterapeuta de Lúcia,
Mário Rocha, diz que já atendeu pessoas com problemas como enxaqueca decorrente de
contraturas na região cervical
ou seqüelas motoras de acidente vascular encefálico. Ele trabalha com diversas técnicas
orientais (como tuiná e shiatsu) e ocidentais (como drenagem linfática) e diz que poucos
médicos conhecem modalidades como a reflexologia. "Eles
costumam indicar massagens
mais tradicionais, geralmente
para problemas musculares."
Para o reumatologista Ari
Stiel Radu-Halpern, presidente
da Sociedade Paulista de Reumatologia e chefe do grupo de
coluna do serviço de reumatologia do Hospital das Clínicas
de São Paulo, as massagens acabam sendo aplicadas rotineiramente nos hospitais brasileiros
pelas mãos dos fisioterapeutas.
"Não é verdade que não se usa.
Quando um médico pede fisioterapia, isso pode incluir tratamento manual. A massagem é
um dos instrumentos do fisioterapeuta", diz.
Ele indica o método para alguns pacientes e o considera
eficaz para diminuir a dor.
"Tem eficácia analgésica, sim.
Ao atuar sobre a musculatura,
provoca alívio nas contrações
musculares, que podem ser a
própria causa da dor. Mas a
maior ou menor eficácia depende da situação. Como o efeito é de curta duração, é melhor
para dores agudas."
Em sua opinião, não dá para
dizer que a massagem é uma
panacéia nem que seja sem utilidade. "O grande erro é procurar a massagem para algum
problema de saúde sem antes ir
a um médico. Quem fizer isso
pode deixar de ter um diagnóstico e uma indicação de tratamento corretos. É um tratamento adjuvante, e não de base", alerta.
A cinesiologista Mariana Esposel Meyer, que trabalha na
clínica de Radu-Halpern, afirma que a massagem vai muito
além do relaxamento e da estética. Segundo ela, dois efeitos
imediatos da técnica são a melhora na circulação e no humor.
"Há liberação de endorfina, da
mesma forma que ocorre após
um exercício físico. Também
acontece uma melhora na retenção de líquidos."
Entre os benefícios mais duradouros, ela cita a regularização das funções hormonais. "A
massagem tem um ritmo, uma
ordem a ser seguida. Isso estimula as glândulas que secretam hormônios", explica.
Meyer utiliza o método principalmente para gerenciar a
dor de pacientes em reabilitação, mas diz que é possível usá-lo para outros propósitos. "Dá,
por exemplo, para regularizar o
intestino de quem tem prisão
de ventre com massagem, apalpando o bolo alimentar e movendo-o manualmente no sentido do funcionamento desse
órgão. É delicado e um pouco
dolorido, por isso tem que ser
realizado por um profissional
que saiba o que está fazendo,
mas é eficaz", afirma, ressaltando que tudo isso tem que ser
feito aliado a uma alimentação
adequada.
"A massagem sozinha vai até
um certo ponto. Se você recebe
uma massagem e em seguida
pega um trânsito de uma hora e
meia, o efeito não dura muito."
A prisão de ventre é um dos
vários problemas de saúde que
o massoterapeuta Kiyoshi Nagaoka afirma aliviar. Segundo
ele, que trabalha há quase 40
anos na área, a massagem pode
ajudar, por exemplo, contra enxaqueca, problemas nos rins ou
na tireóide. "O grande detalhe é
regularizar a circulação sangüínea, o que costuma gerar melhora no processo que a pessoa
apresenta", diz.
Segundo Nagaoka, poucos
médicos acreditam nesse tipo
de trabalho. Mas alguns de seus
pacientes garantem que conseguiram melhorar muito com a
técnica do massoterapeuta.
A assistente de consultório
dentário Marisa Carvalho Gomes, 52, diz que a massagem a
ajudou a superar diversos problemas, de inflamação no cotovelo a questões ginecológicas.
"Tinha cisto de mama e vivia
fazendo punções. Também estava com corrimento vaginal.
Meu ginecologista ficou bobo
quando viu que meus exames
normalizaram", conta.
O administrador de empresas Fernando Lopes Nunes, 82,
conta que a massagem ajudou a
regularizar o funcionamento
de seus rins. "Melhorou bastante. Quando não vou às sessões, sinto falta."
Pesquisas
A massagem também vem
sendo alvo do estudo de cientistas, que querem desvendar o
que acontece no organismo de
quem recebe esse tipo de toque
-e pesquisam se isso pode ajudar a tratar certas doenças.
Mas esses estudos ainda são
escassos e muitos apresentam
resultados contraditórios.
Além disso, quase tudo o que
existe na área é realizado em
outros países -no Brasil, há
pouquíssimos dados.
Nos Estados Unidos, um centro de pesquisas ligado à Universidade de Miami dedica-se
exclusivamente ao estudo dos
efeitos do toque sobre o organismo humano. O Touch Research Institute tem pesquisadores de universidades renomadas, como Harvard, Duke e
Maryland, e acaba de completar 15 anos de existência.
Entre os efeitos positivos da
massagem encontrados nos estudos, a diretora do instituto,
Tiffany Field, destaca o aumento de peso em bebês prematuros, a melhoria da atenção, o
alívio de sintomas depressivos,
a redução da dor e dos hormônios estressores e a melhoria da
função imune.
Ela disse à Folha que a indicação da massagem pelos médicos vem crescendo aos poucos por lá. "As seguradoras já
começam a cobrir os custos."
Segundo Ari Radu-Halpern,
na maioria dos casos não dá para dizer que a massagem seja
consensualmente eficaz. "Exceto em algumas situações, como no alívio temporário de
certas formas de dor crônica,
ao fazermos um levantamento
científico amplo vemos que
não existem evidências de melhora de doenças", diz.
Ele ressalta que isso não significa que a técnica não funcione, mas que os estudos são escassos ou contraditórios e por
isso não dá para afirmar categoricamente, pelo menos por
enquanto, que ela ajude nessa
ou naquela doença.
Ele também comenta a falta
de estudos científicos que comparem os diversos tipos de
massagem. "Não dá para dizer,
com base científica, que um tipo seja superior ao outro."
Para a neurologista Dalva
Poyares, do Instituto do Sono
da Unifesp, esse é, de fato, um
problema. "Há uma grande variedade de tipos de massagens
e de tempo de massagem entre
os estudos. Fica difícil avaliá-los e compará-los."
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