São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 2006 |
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Outras idéias Pense pequeno
É muito fácil achar
um assunto que
nos torna os reis
da festa, o centro
da conversa.
Fome, sede, calor e dor são desconfortos que acontecem, e temos que saná-los rapidamente, sem protelar. Mas não é com essas coisas importantes que preenchemos nossas horas de lazer com amigos. As queixas e reclamações a respeito dos nossos indiscutíveis direitos são de outra natureza. Falar mal do governo, da Telefônica, da Sabesp parece um vício que alimentamos por não termos coragem de formular a verdadeira queixa: todos nós gostaríamos que as instâncias e instituições tomassem conta da gente. O conluio da criança que existe em nós e o poder de se queixar são difíceis de romper. Sentimo-nos injustiçados quando quem cuida do nosso entorno é relaxado. Os adultos não podem fazer muxoxo feito criança pedindo que tudo esteja arrumadinho. Acontece que os responsáveis por cuidar do nosso entorno também se sentem malcuidados e revidam. Eis aí um círculo vicioso que só pode ser movido se assumirmos um pouco do malfeito. Se o barulho é grande e o Psiu não resolveu, sei que podemos tapar as orelhas. Como não é gostoso viver de orelha tapada, continue insistindo também pelas providências que nos são devidas. Os maus cheiros são mais difíceis de evitar, mas sempre podemos recorrer a incensos enquanto a emissão de fumaça da indústria próxima não é embargada. Tudo a favor de movimentos comunitários, mas é preciso também saber "pensar pequeno". É glorioso liderar um movimento para demitir o faxineiro relapso. Mas durante o aviso prévio, é melhor varrermos nós mesmos para não escorregarmos no encardido. Nada de dizer que se você fizer assim ninguém mais vai fazer nada. Ficando só na espera da ação de instância externa e superior, ficaremos muito mais tempo irritadinhos. Pensar pequeno não é desistir, pode até representar um passo na direção de uma cooperação. Quem sabe um pequeno gesto dê início a um ciclo de reciprocidades e cooperação. Tudo a favor de mandar cartas, de votar certo, de participar de movimentos comunitários, mas, se o barulho é grande, tape os ouvidos, pois é o que dá pra fazer. ANNA VERONICA MAUTNER, psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é autora de "Cotidiano nas Entrelinhas" (ed. Ágora) @ - amautner@uol.com.br Próximo Texto: Pergunte aqui Índice |
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